Acórdão nº 02B4252 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Janeiro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA BARROS
Data da Resolução30 de Janeiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. O "A" - intentou em 13/1/95 contra o B, acção declarativa com processo comum na forma ordinária, que foi distribuída à 1ª Secção do 12º Juízo Cível da comarca de Lisboa. Invocou garantia bancária incondicional prestada a seu favor pelo Banco demandado, destinada a caucionar o bom pagamento de 10 prestações mensais relativas a parte do preço da venda do navio denominado Vimieiro que fez à C. Esta vendeu, por sua vez, esse navio, com nova denominação, à D, que assumiu as dívidas da vendedora para com o A. e a E - Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau, titular, esta, de hipoteca sobre o dito navio, constituída para garantir a fiança prestada por essa Comissão ao Banco demandado nestes autos, em contragarantia da garantia por ele prestada a favor do A. Incumprido pela D o plano de reembolso acordado com o A., vem por este pedida, nesta acção, a condenação do R. a pagar-lhe a quantia de 120.887.671$00, com juros, à taxa então legal, sobre 120.000.000$00 desde 16/1/95, até integral pagamento. 2. Contestando, o Banco demandado deduziu defesa por impugnação, opôs encontrar-se a sua responsabilidade limitada ao montante de 120.000.000$00, e chamou à demanda a D , e à autoria a E . Citadas, só esta última contestou, nomeadamente excepcionando, com referência aos arts.220º e 628º C.Civ., e 3º, 485º e 490º C.Com., a nulidade formal da garantia ajuizada, prestada em escrito particular com reconhecimento das assinaturas por semelhança, dado constituir, segundo diz, em indicados termos, fiança bancária, e não garantia bancária autónoma; nulidade essa determinante, conforme art.632º C. Civ., da nulidade da fiança prestada por esta chamada. Houve réplica. Bem assim interposto pelo A. recurso de agravo do despacho que admitiu o chamamento à autoria, foi recebido com subida diferida ( fls.148), mas acabou por subir e ser conhecido de imediato. A Relação de Lisboa negou-lhe provimento; e o mesmo fez este Tribunal em relação ao agravo que o A interpôs, ainda, dessa decisão. 3. Realizada audiência preparatória, foi em seguida lavrado saneador-sentença que condenou o R. B a pagar ao A. A a quantia de 120.000.000$00, acrescida de juros, à taxa de 15%, desde 29 /12/94, até integral pagamento. O Banco réu, assim condenado, apelou dessa decisão. O efeito suspensivo atribuído de imediato a esse recurso foi, a requerimento do A., alterado para devolutivo. O R. agravou dessa decisão. Conhecendo da apelação, a Relação de Lisboa declarou nulo o saneador-sentença impugnado por não ter-se pronunciado em relação à chamada à demanda; julgou prejudicado, por isso, o conhecimento do predito agravo; considerou extemporâneo o conhecimento do mérito no saneador; e ordenou, em consequência, a reforma da decisão anulada nos termos apontados ( essencialmente relativos ao controvertido incumprimento por parte da D do acordado com o A, aqui A., e à determinação da quantia em dívida ). 4. Foram, nessa conformidade, organizados especificação e questionário, vindo, em deferimento de reclamação do R., a ser proferido novo saneador, em que se julgou improcedente a excepção peremptória de nulidade da garantia accionada deduzida na contestação da chamada à autoria ( E ), sendo a seguir reeditada a condensação da causa. O Banco demandado recorreu daquele despacho (1), tendo esse recurso sido admitido com subida diferida. Após julgamento, foi proferida sentença que voltou a condenar o R. B a pagar ao A. A a quantia de 120.000.000$00, acrescida de juros, às taxas legais sucessivamente vigentes, desde 28/12/94, até integral pagamento, e, desta vez, também em 10 UC de multa por litigar de má fé. Não notificado o assim condenado para a audiência de discussão e julgamento, reclamou oportunamente a nulidade processual que essa omissão constitui. Deferida essa reclamação, com a consequente anulação do processado, em nova audiência de julgamento, os mandatários das partes acordaram na fixação da matéria de facto pela forma alcançada no julgamento anulado. Foi então, pela 3ª vez, proferida, em 22/2/2000, sentença, idêntica à anterior, com continuada omissão de pronúncia em relação à chamada à demanda (D ). 5. O B apelou, uma vez mais, arguindo essa nulidade da decisão ( arts.332º, nº3º, e 668º, nº 1º, al. d), CPC, na versão anterior à reforma de 1995/96, aplicável neste ponto por força do disposto no art.16º do DL 329-A/95, de 12/12 ), e impugnando a sua condenação em juros de mora e por litigância de má fé. A sobredita nulidade veio, por iniciativa do relator, a ser suprida, em 12/10/2000, ao abrigo do art.668º, nº4º, CPC, tendo a chamada à demanda sido condenada solidariamente com o R. e modificada, nessa conformidade, a condenação ( acessória ) em custas. A Relação negou, por fim, provimento aos recursos que lhe vinham submetidos; com, no entanto, declaração de voto em que se considerou insuficientemente fundamentada a condenação por litigância de má fé. 6. É dessa decisão que vem pedida revista. Em remate da alegação respectiva, o Banco recorrente formula as conclusões que seguem: 1ª - A questão em discussão é a de saber se o documento assinado pelo recorrente é uma garantia autónoma ou, antes, uma fiança, e, consequentemente, se a garantia prestada é válida ou nula. 2ª - Como ensina o Prof. Ferrer Correia ( na RDE, ano VIII (1982 ), nº 2, 252), saber se existe uma garantia simples ( fiança ) ou uma garantia autónoma " é um problema a resolver em sede de interpretação da vontade das partes ", só deixando de haver dúvida " se o Banco se compromete a pagar à primeira interpelação ". 3ª - O recorrente não se comprometeu no documento a pagar à primeira solicitação, antes disse que se obrigava como " fiador e principal pagador ". 4ª - Esta expressão não é de uso comum nas garantias bancárias autónomas e não é credível que um Banco com vasta experiência neste tipo de contratos faça inserir no documento termos que não correspondam exactamente à obrigação que pretende assumir. 5ª - Acresce que a expressão usada no documento - " a qual se destina a caucionar o bom pagamento ( do devedor ) " traduz uma garantia acessória, afastando qualquer autonomia em relação à obrigação do devedor, característica que, no dizer do Prof. Ferrer Correia ( rev.cit., 250 ), constitui o traço específico da garantia autónoma. 6ª - Também a obrigação de o beneficiário ir informando o recorrente dos pagamentos feitos pelo devedor para redução da garantia só pode significar a acessoriedade da obrigação de pagamento por parte do recorrente. 7ª - Resulta, assim, quer da interpretação literal, quer da interpretação sistemática do documento, que o Banco se quis obrigar como " fiador e principal pagador ", constituindo uma obrigação de fiança e não qualquer garantia autónoma. 8ª - O beneficiário da garantia sempre assim interpretou, como resulta dos termos por ele expressos quer na notificação judicial avulsa para pagamento ( artigos 1º e 3º ), quer na acção que propôs ( artigo 5º da petição inicial ). 9ª - E a fiança é nula, como entende a E, por falta de forma legal. 10ª - Segundo a sentença recorrida, a dívida de juros é inquestionável, já que " não assistia ( ao ora recorrente ) o direito de discutir a bondade da solicitação para pagamento que lhe fora dirigida pelo A. ", o que significa que a tese do R., de que apenas se obrigara como fiador não podia sequer ser defendida, e, por isso, ao pretender não serem devidos juros sem que fosse definida a obrigação do devedor afiançado, estava a litigar de má fé. 11ª - Esta tese é um absurdo, na medida em que se traduz em considerar como litigante de má fé todo aquele que defender uma tese jurídica de que o Tribunal discorda. Ou seja, é uma condenação por " delito de opinião " completamente inaceitável. Não houve, desta vez, contra-alegação, e, corridos os vistos legais, cumpre decidir em vista da matéria de facto fixada pelas instâncias, para que se remete em obediência ao disposto no nº6º do art.713º, ora aplicável por força do disposto no art.726º, CPC. 7. Dos factos provados, importa...

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