Acórdão nº 02S1197 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Setembro de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelMÁRIO TORRES
Data da Resolução25 de Setembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório 1.1. A intentou, em 24 de Junho de 1999, no Tribunal do Trabalho de Loures, acção declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, com a forma ordinária, contra B, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe: (i) a quantia de 4645074 escudos, correspondente a componente salarial vencida; (ii) a quantia de 221194 escudos por cada mês desde Junho de 1999 até integral cumprimento (componente salarial vincenda); e (iii) juros legais de 7%, sobre o total da dívida, desde a data da citação até ao cumprimento integral da obrigação. Aduziu, para tanto, em suma, o seguinte: (i) exerce a profissão de jornalista para a ré, desde 10 de Novembro de 1980; (ii) em Setembro de 1988 foi-lhe proposto um contrato de exclusividade, como redactora, auferindo mais 100% do ordenado; (iii) em Outubro do mesmo ano, passou à categoria de coordenadora, função que exercia no turno da noite, pelo que passou também a auferir o subsídio de função e um outro de horário nocturno; (iv) essas condições mantiveram-se até 1995, assinando a autora os contratos, sem que previamente lhe fosse facultada cópia para consulta ao seu advogado; (v) em 1995, a administração da B acabou com o regime de exclusividade, passando a vigorar o regime de "comissão de serviço", passando a função da autora a designar-se por "editora adjunta", embora se mantivessem as funções que antes exercia como coordenadora; (vi) porém, em 27 de Outubro de 1997, a autora recebeu da entidade patronal uma carta, através da qual a administração da ré a informava que dava por finda a sua "comissão de serviço"; (vii) em consequência, a sua remuneração foi diminuída de 578334 escudos ilíquidos para 338000 escudos, valor com base no qual também foi calculado o subsídio de Natal; (viii) essas diferenças salariais mantêm-se até à proposição da acção. Como fundamentos de direito, invoca a autora os artigos 21.º e 82.º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de Novembro de 1969 (doravante designado por LCT), e o Decreto-Lei n.º 404/91, de 16 de Outubro, para concluir que não é admissível a diminuição da retribuição e que às suas funções não é aplicável o regime jurídico próprio da figura "comissão de serviço", uma vez que esta pressupõe uma especial relação de confiança, a qual nunca existiu nas funções desempenhadas, não sendo válida a qualificação dada pela ré e os efeitos que daí retirou, em prejuízo da autora

A ré contestou (fls. 26 a 32), sustentando, em síntese, que: (i) o contrato de exclusividade foi validamente denunciado em 18 de Agosto de 1995, data a partir do qual cessou; (ii) neste englobava-se o subsídio por trabalho nocturno; (iii) substancialmente diferente é o exercício de chefia, apelidada de coordenadora, desde 1 Outubro de 1989, que pressupunha a responsabilização pelo desempenho de 10 a 15 profissionais, dependendo a autora directamente da administração, o que implicava uma especial relação de confiança e justificava a atribuição de um subsídio de função, distinto do subsídio de exclusividade; (iv) posteriormente, em 1 de Janeiro de 1996, celebraram um acordo, denominado "acordo relativo ao exercício de cargo em regime de comissão de serviço", referente ao cargo de chefia de "editor adjunto", que a autora passou a exercer, auferindo um subsídio de função, no montante de 221194 escudos; (v) este acordo assentava no pressuposto da confiança, lealdade, dedicação e competência da autora; (vi) as funções exercidas eram de conteúdo substancialmente diferente das anteriores; (vii) porém, tal acordo foi feito cessar pela ré, por forma válida e eficaz, a partir do final do mês de Novembro de 1997; (viii) a partir dessa data a autora retomou as funções de jornalista. Conclui defendendo que nem o subsídio de exclusividade nem qualquer dos subsídios de função que a autora recebeu integram o conceito de retribuição

Foi proferido despacho saneador e procedeu-se à organização de especificação e questionário (fls. 56 a 58), que não suscitaram reclamações

1.2. Realizada audiência de julgamento, foram dadas aos quesitos as respostas constantes de fls. 72 e 73, relativamente às quais também não foi apresentada qualquer reclamação, após o que, em 5 de Julho de 2000, foi proferida a sentença de fls. 140 a 148, que julgou a acção procedente e condenou a ré a pagar à autora: (i) a quantia de 4645074 escudos, relativa à componente salarial devida até à proposição da acção; (ii) a quantia de 221194 escudos, por cada retribuição devida, incluindo remuneração por férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, desde a proposição da acção até integral cumprimento da decisão proferida; e (iii) a pagar juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral cumprimento

1.2.1. Nessa sentença começou por dar-se por apurada a seguinte matéria de facto: 1) A autora exerce a profissão de jornalista na Agência B (actual propriedade da ré NLP, SA), desde 10 de Novembro de 1980

2) No âmbito do seu contrato de trabalho, foi-lhe proposto um contrato de exclusividade, como "redactora", auferindo mais 100% do seu ordenado, tendo a autora e a ré assinado o contrato junto a fls. 7 a 12 (original e cópia), que aqui se dá por integralmente reproduzido, no mesmo constando a data de 1 de Agosto de 1989

3) Em Outubro de 1989, através da Ordem de Serviço n.º 95/89, passou à categoria de "coordenadora", como responsável pela escolha, elaboração e edição de notícias para os jornais, função que exercia no turno da noite (20h-02h)

4) Pelo trabalho de coordenadora passou a auferir também um "subsídio de função"

5) Em 1995, a administração da B acabou com o regime de exclusividade, passando a vigorar o regime de "comissão de serviço", passando a função da autora a designar-se por "editora adjunta", a partir de 1 de Janeiro de 1996, tendo autora e ré subscrito o documento a fls. 37, que aqui se dá por reproduzido, com o título "Acordo relativo ao exercício de cargo em regime de comissão de serviço"

6) A autora nunca exerceu qualquer cargo de administração ou de direcção directamente dependente da Administração

7) Em 27 de Outubro de 1997, a autora recebeu da entidade patronal uma carta, comunicando-lhe que "nos termos do n.º 2 da cláusula 5.ª do Acordo Relativo ao Exercício do Cargo de Editora Adjunta, em Regime de Comissão de Serviço, celebrado em 1 de Janeiro de 1996, a Empresa dá por finda a referida Comissão de Serviço"

8) Em resultado de ter posto fim à "comissão de serviço", a ré deixou de lhe pagar a remuneração ilíquida de 578334 escudos e, em 1 de Dezembro de 1997, passou a pagar-lhe 338000 escudos por mês, ilíquidos

9) Dos menos 240334 escudos que passou a receber por mês, 221194 escudos respeitavam ao "subsídio de comissão de serviço"

10) O subsídio de Natal de 1997 da autora foi calculado com base na nova remuneração, no valor de 338000 escudos

11) A ré, a partir daquela data - 1 de Dezembro de 1997 - jamais pagou à autora o valor de 221194 escudos, que era pago sob a designação "subsídio de comissão de serviço"

12) O contrato de exclusividade celebrado em 1 de Agosto de 1989 foi proposto à autora em data anterior ao da sua formalização

13) A autora, pelo trabalho de "coordenadora", prestado entre as 20h e as 02h, passou a receber também um subsídio de horário nocturno

14) Quando a sua função passou a ser designada como "editora adjunta", a autora continuou a desempenhar as mesmas tarefas que já desempenhava anteriormente como "coordenadora"

15) Nos recibos de ordenado de 1995 havia em separado um "subsídio de função", que não era uma contrapartida da exclusividade, surgindo a contrapartida desta mencionada sob o título de "subsídio de exclusividade"

16) O conteúdo funcional da função que a autora exercia, quer como "coordenadora" quer como "editora adjunta", implicava a responsabilidade pelo desempenho de 6 a 8 jornalistas do sector internacional, nomeadamente de distribuição, controlo do serviço e das notícias a emitir

17) Estas funções dependiam, em primeiro lugar, do editor do sector internacional, implicando uma relação de confiança no sentido de reconhecimento da competência técnica e capacidade de execução

18) O "subsídio de função" apenas era atribuído aos cargos de chefia, incluindo os de coordenador

19) A partir do mês de Novembro de 1997, a Administração, mediante proposta do Director de Informação, retirou a autora do cargo de "editora adjunta", passando esta a exercer apenas funções de "jornalista"

1.2.2. Face à matéria de facto acabada de transcrever, a sentença da 1.ª instância alcançou a decisão condenatória atrás referenciada através da seguinte fundamentação jurídica: "A questão fulcral a decidir consiste em saber se a quantia de 221194 escudos, deduzida ao vencimento da autora após a ré lhe ter cessado a «comissão de serviço», integra o conceito de retribuição, para todos os efeitos, nos termos do artigo 82.º da LCT, ou se pelo contrário é um complemento da retribuição devido exclusivamente em função de uma verdadeira «comissão de serviço», que deixa de ser devido quando cessa o exercício do cargo naquelas condições específicas

No percurso laboral da autora ao serviço da ré, no que ao caso importa, surgem três momentos distintos, em termos de qualificação das suas funções e consequente contrapartida do respectivo exercício

A primeira delas refere-se ao regime de exclusividade, abrangendo o período de 1 de Agosto de 1989 a 31 de Dezembro de 1995. Neste período a autora auferia 100% sobre a remuneração base e exercia funções de coordenadora, como responsável pela escolha, elaboração e edição de notícias para os jornais. Pelo exercício dessas funções auferia também um subsídio de função

Aparentemente, o pagamento dos 100% sobre o vencimento prendia-se efectivamente com o exercício da função em regime de exclusividade. Se o exercício em regime de exclusividade era ou não um requisito para o exercício das funções de coordenadora...

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