Acórdão nº 03A3433 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Janeiro de 2004 (caso None)

Magistrado ResponsávelSILVA SALAZAR
Data da Resolução13 de Janeiro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Invocando factos tendentes a levar à conclusão de que dois caminhos e um terreno que identificam têm natureza pública a que os réus opõem activa recusa, vieram em 17/9/97 A, B, C, D, E, F e G, instaurar contra H e I e mulher, J, acção popular nos termos do art.º 52º da Constituição da República Portuguesa e do Dec. - Lei n.º 83/95, de 31/8, com processo ordinário, pedindo sejam declarados públicos os aludidos caminhos e terreno, condenando-se os réus a assim o reconhecerem, a desobstruírem tais caminhos e terreno públicos, daí retirando os materiais colocados e abstendo-se, no futuro, da prática de quaisquer actos que de alguma forma possam turbar, limitar ou impedir a utilização dos mesmos em toda a respectiva plenitude, e serem considerados nulos os actos de registo praticados pelos réus e seus antepossuidores, ordenando-se a rectificação das descrições prediais que referem (fls. 152)

Apenas a primeira ré contestou, deduzindo as excepções de incompetência do Tribunal em razão da matéria, de ineptidão da petição inicial, e de ilegitimidade passiva, impugnando por, segundo sustenta em síntese, os aludidos caminhos públicos não existirem e o terreno não revestir natureza pública, pedindo, em reconvenção, a condenação dos autores a indemnizá-la dos prejuízos que a presente acção lhe acarrete, em montante a liquidar em execução de sentença, e pedindo ainda a condenação dos autores a indemnizá-la como litigantes de má fé

Em réplica, os autores rebateram a matéria de excepção e de reconvenção

Depois disso os autores juntaram uma certidão comprovativa de os réus I e mulher terem procedido, por escritura pública outorgada com os respectivos transmitentes, à rectificação da área do seu prédio nos termos indicados pelos autores na petição inicial. Proferido despacho que não admitiu a reconvenção, foi elaborado despacho saneador que julgou improcedentes as excepções deduzidas de incompetência material e de ilegitimidade mas procedente a de ineptidão da petição inicial quanto ao pedido de declaração de nulidade dos actos de registo praticados pelos réus e seus antepossuidores e de rectificação das descrições prediais, absolvendo os réus da instância nessa parte, por falta de identificação precisa dos actos de registo a declarar nulos; decidiu ainda esse despacho inexistirem outras excepções, ou nulidades secundárias, ao que se seguiu a enumeração dos fatos desde logo considerados assentes e a elaboração da base instrutória, de que reclamaram autores e ré, tendo sido deferida em parte a reclamação daqueles e totalmente indeferida a desta

Entretanto os autores requereram que fosse admitida ampliação do seu pedido, por forma a abranger o de declaração de nulidade e cancelamento das respectivas inscrições dos actos de registo praticados pelos réus e antepossuidores, designadamente a alteração à descrição n.º 23.805, a fls. 135 do Livro B-58, Av. 1/Ap. 09, efectuada em 4/8/89, posteriormente extractada para a ficha n.º 00362/040889, rectificando-se a descrição n.º 362-São João, por forma a que nela conste as áreas e confrontações do art.º 92º da petição inicial, isto é, "prédio rústico, sito em Casal de S. Miguel ou Covas de S. Miguel, com a área de 880 m2, a confrontar de Norte com L, de Sul com M, Nascente com Bairro Social da Câmara Municipal de Porto de Mós, e Poente com caminho público junto à extrema Nascente da Capela de S. Miguel", e o de declaração de nulidade e cancelamento das respectivas inscrições dos actos de registo praticados pelos réus e antepossuidores, designadamente a alteração à descrição n.º 16.961 de fls. 84 verso do Livro B-41, apresentação n.º 14, efectuada em 4/3/94, posteriormente extractada para a ficha n.º 00784/940304, e ainda as apresentações 18 e 19, efectuadas em 14/8/96, rectificando-se a descrição n.º 00784/940304 - São João, por forma a que nela conste as áreas e confrontações do art.º 126º da petição inicial, isto é, "moinho, sito em Costa de S. Miguel, com a área de 154 m2, a confrontar de Norte com terreno público, de Sul e Poente com estrada, actualmente designada por Rua de S. Miguel, e do Nascente com caminho público". E essa ampliação foi admitida. Oportunamente teve lugar audiência de discussão e julgamento, tendo sido decidida a matéria de facto sujeita a instrução, e, produzidas alegações escritas pela ré contestante, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo os réus do pedido no respeitante à dominialidade pública dos caminhos e terreno aludidos mas considerando prejudicado o (conhecimento do) demais peticionado pelos autores

Apelaram os autores, tendo a Relação negado provimento à apelação e confirmado a sentença ali recorrida, por acórdão de que vem interposta a presente revista, de novo pelos autores, que, em alegações, formularam as seguintes conclusões: 1ª - Os caminhos, bem como a parcela de terreno, que estão perfeitamente marcados, visíveis e determinados, apresentando este a área total de 2.951 m2, são públicos; 2ª - E isto porque, desde tempos imemoriais, estão no uso directo e imediato do público (cfr. Assento de 19/4/89 do S.T.J., in B.M.J. 386-121) e satisfazem interesses colectivos relevantes; 3ª - Acresce que sobre os mesmos caminhos e terreno foram praticados actos de apropriação e conservação por parte das respectivas entidades públicas (cfr. declaração da Câmara Municipal de Porto de Mós a fls. 139); 4ª - Não existe qualquer atravessadouro, uma vez que não se demonstrou que os caminhos e terreno onerem qualquer prédio privado; 5ª - Os festejos populares (quermesses, convívios, bailes e outras actividades recreativas, lúdicas e de lazer realizadas anualmente em honra de S. Miguel e ainda para o estacionamento de veículos, aquando da celebração de casamentos e baptizados, na Capela de S. Miguel, bem como realizar convívios, piqueniques, jogos populares, e, há alguns anos atrás, também tiro aos pratos, durante todo o resto do ano), que se realizam neste local, têm relevância bastante, para se poder considerar estarmos perante uma causa de utilidade pública, cuja salvaguarda permita fundamentar a aquisição da dominialidade pública; 6ª - Mesmo que se defenda a aplicação da doutrina restritiva da interpretação feita ao Assento de 18/4/89, seguida no acórdão do S.T.J. de 15/6/00, e se considere necessário que os caminhos e o Largo sejam afectos a um interesse público, à satisfação de interesses colectivos relevantes, estes existem; 7ª - A utilidade pública consiste na aptidão das coisas para satisfazer necessidades colectivas; 8ª - Estão demonstrados os requisitos necessários à caracterização da dominialidade pública: o uso directo e imediato pelo público desde tempos que excedem a memória dos homens, e a satisfação de interesses colectivos de certo grau ou relevância; 9ª - O acórdão recorrido está ferido de nulidade por falta de fundamentação e omissão de pronúncia quanto aos pedidos formulados pelos autores de rectificação das descrições prediais dos prédios dos réus; 10ª - De facto, estando o prédio da ré H delimitado a Poente por um muro, revelando de modo inequívoco que a parcela de terreno situada a Poente não lhe pertence e é pública, 11ª - A área do prédio desta ré é de apenas 880 m2, devendo ordenar-se a respectiva descrição predial na Conservatória do Registo Predial de Porto de Mós do art.º 362-São João, por forma a constar...

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