Acórdão nº 162/08.9TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Outubro de 2010
Magistrado Responsável | ANA CRISTINA DUARTE |
Data da Resolução | 26 de Outubro de 2010 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO A intentou contra B acção com processo ordinário em que pede que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 36.245,44, acrescida de juros vencidos no montante de € 15.233,53 e vincendos, até efectivo e integral pagamento, sustentando que prestou serviços á ré, devidamente facturados, para o pagamento dos quais a ré alegou ter emitido e enviado ao autor um cheque no valor de € 33.491,46 (deduzindo a retenção na fonte), cheque esse que o autor nunca recebeu, tendo já sido efectuada peritagem à assinatura constante do verso do cheque, onde se concluiu que a mesma não foi feita pelo seu punho.
Contestou a ré, aceitando a prestação dos serviços mas alegando ter pago os mesmos através de cheque cruzado à ordem do autor que, depois de endossado, foi depositado à ordem de conta aberta na CCAM de Guimarães e, na sequência, pago à CCAM de Guimarães pelo Banco Santander, que debitou o seu valor à ré.
Deduziu a ré incidente de intervenção provocada da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Guimarães que terá pago o cheque a quem não devia, pois tratando-se de cheque cruzado emitido à ordem do autor, só podia ser pago ao mesmo autor, constituindo-se responsável pelo mau pagamento do dito cheque. Assim, caso a ré venha a ser condenada a repetir o dito pagamento, sempre terá direito de regresso contra a CCAM de Guimarães, a fim de ser indemnizada pelos prejuízos sofridos.
Replicou o autor para manter o já alegado na petição inicial quanto ao não recebimento do valor titulado pelo cheque e para reduzir o pedido para as quantias de € 33.491,46, a título de capital, e € 14.007,72, a título de juros vencidos, face à aceitação da matéria alegada pela ré quanto à retenção na fonte. Termina dizendo que não efectuou qualquer pedido de indemnização civil no processo-crime, por não ter resultado do inquérito que o cheque lhe tenha sido subtraído.
A ré apresentou tréplica.
Admitida a intervenção acessória provocada da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Guimarães, veio esta contestar alegando que o cheque foi apresentado na CCAM por C que o depositou na sua conta para cobrança, tendo sido posteriormente pago pelo banco sacado, no caso, o Banco Santander, tendo actuado a contestante como mero intermediário, perante um portador legítimo e seu cliente, cabendo ao banco sacado apurar se o saque e o endosso são ou não regulares.
Replicou a ré para manter que a CCAM não podia ter pago o cheque ao seu cliente, por não ser a pessoa à ordem de quem tinha sido emitido.
Na sequência da contestação da CCAM, deduziu a ré incidente de intervenção provocada de C – que terá recebido e feito seu o valor do cheque, enriquecendo-se sem causa à custa da ré – e de Banco Santander – que terá pago o cheque sem que tivesse verificado a regularidade do endosso.
Admitida a intervenção acessória provocada de C e Banco Santander Totta, SA, vieram ambos contestar, nos seguintes termos: O Banco Santander alegando que se limitou a pagar o cheque que lhe foi apresentado a pagamento pelo banco tomador, tendo verificado que o mesmo estava regularmente preenchido e assinado pelo titular da conta sacada e que se encontrava regularmente endossado pelo beneficiário do cheque, não sendo detectável qualquer vício ou irregularidade, pelo que não pode ser responsabilizado pelo não pagamento do cheque, até porque, o cheque, apesar de cruzado é transmissível por endosso; C alegando que vendeu a Manuel Oliveira da Silva mercadoria, titulada pela factura n.º 9, no valor de € 33.492,53 e que, para pagamento dessa factura, recebeu de Manuel O... o cheque em causa, por este endossado, tendo-o depositado na sua conta e sido o mesmo compensado no dia 6 de Abril de 2004. Mais esclarece que não foi pronunciado no processo-crime a que se faz referência nos autos.
Replicou o autor para reafirmar que nunca esteve na posse do cheque em causa nos autos e que nunca comprou ao chamado C a mercadoria a que este se refere.
Foi proferido despacho saneador e definida a matéria de facto assente e a base instrutória, que se fixaram após reclamações do Banco Santander, da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Guimarães e da ré, todas desatendidas.
Realizado o julgamento e fixada a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção procedente, condenando a ré a pagar ao autor a quantia de € 33.491,46, relativa à remuneração dos serviços prestados, a quantia de € 14.007,72, a título de juros vencidos até à propositura da acção e juros à taxa legal que resultar da aplicação da Portaria n.º 597/2005 desde a propositura da acção até integral e efectivo cumprimento.
Discordando da decisão, dela interpôs recurso a ré, tendo formulado as seguintes Conclusões: 1ª- Após ter sido elaborado o despacho saneador, fixada a matéria assente e a base instrutória, a R., Apelante, apresentou, contra a matéria assente e a base instrutória, a reclamação de fls., a qual, porém, não obteve acolhimento.
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- Acontece, todavia, que, no entendimento da R., ora Apelante, a reclamação por si apresentada tinha, e tem, interesse para o que se discute nos autos.
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- Na al. P) da Matéria Assente, deu-se como assente que “O cheque referido em O) foi pago à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Fafe em 30 de Março de 2004”.
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- Acontece, porém, que, como resulta dos autos, o cheque referido na al. O) dos Factos Assentes foi endossado e, após esse endosso, foi apresentado a pagamento por C e depositado na conta nº 40... aberta em seu nome na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Guimarães.
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- Assim sendo, outra deveria ter sido a redacção dada à al. P) dos Factos Assentes, tendo-se, na dita reclamação, sugerindo a seguinte redacção: “O cheque referido em O) foi depositado e pago na conta bancária nº 40... aberta na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Guimarães em nome de C”.
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- E isto pela simples razão de que o cheque emitido pela R., ora Apelante, e que se destinava a pagamento ao A., foi, de facto, depositado por C na sua conta bancária nº 40..., aberta em seu nome na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Guimarães, 7ª- tendo este justificado a posse do cheque destinado ao A. com o endosso feito pelo A. Como pagamento de mercadorias àquele vendidas.
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- Até porque, como o mesmo C assumiu na sua contestação, na sua contestação, “nunca manteve relações comerciais com a ré” – cfr. artº 6º da sua contestação -, 9ª- tendo antes, “no âmbito das suas relações comerciais, vendeu a Manuel Oliveira da Silva, mercadoria, concretamente tecido em algodão, que deu origem à factura nº 9, de valor 33492.53” e que “para pagamento da referida factura recebeu de Manuel Oliveira da Silva, o cheque nº 9000000... do Banco Santander, por aquele endossado”.
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- Donde não restam, pois, dúvidas de que quem recebeu o valor do cheque foi o Chamado C.
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- Assim, sendo, se o Chamado C não manteve relações comerciais com a R., Apelante, nenhuma razão tinha para receber qualquer valor desta.
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- A não ser que o mesmo, como alega, tivesse tido, de facto, alguma relação comercial com o A.; o justificaria ter recebido aquele cheque, por endosso, do R., Apelado.
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- Assim, e porque foi o Chamado C quem, na verdade, quem recebeu o valor do cheque, era isso que deveria ter ficado a constar da referida alínea da Matéria Assente.
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- E isto pelas razões que aduziremos mais adiante.
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- Existindo uma relação comercial entre o A., Apelado, e o Chamado C, que justificou o endosso, esta relação comercial deveria ter sido discutida nos autos, por forma a averiguar se houve ou não endosso do cheque por parte do A. Apelante, como forma de pagamento da venda que aquele diz ter efectuado a este.
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- É que se aconteceu assim, não tem a A., Apelante, que repetir o pagamento, pois, já fez o pagamento.
Daí o interesse do Chamamento, nos autos, do Chamado C.
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