Acórdão nº 06P1615 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2006 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SIMAS SANTOS |
Data da Resolução | 06 de Julho de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
1 Processo n.º 1615/06, 5.ª Secção Relator: Conselheiro Simas Santos 1.
O Tribunal Colectivo de Bragança (Proc. n.º 498/05.0TBBGC - 2º juízo) condenou, em processo de contra-ordenação, a arguida "XX - Hipermercados" ao pagamento de uma coima de 4.700 euros, pela prática da contra-ordenação dos art.ºs 2.º, 3.º, 4.º e 8.º do DL n.º 67/98 de 21 de Outubro, alterado pelo DL n.º 425/99 de 21 de Outubro.
Inconformada, recorreu a arguida para a Relação do Porto, invocando os seguintes factos que foram tidos em consideração na Relação: -- A sociedade recorrente XX Hipermercados, S.A." apresentou a presente impugnação judicial, insurgindo-se contra a decisão administrativa proferida em 12 de Maio de 2004, pela DGFQA - Direcção Geral de Fiscalização e Controlo de Qualidade Alimentar, que a condenou na coima de 4.700 euros, pela prática da contra-ordenação p. e p. pelo Art. 2º., 3º, 4º e 8º do Dec-Lei nº 67/98 de 21/10, alterado pelo Dec.-Lei nº 425/99 de 21/10.
-- da notificação feita pela autoridade administrativa à recorrente consta o seguinte: no dia 22 de Dezembro de 2003, pelas 12h, na secção de pastelaria da unidade de Bragança existiam e foram vistos detritos diversos nos equipamentos, tabuleiros, chão e câmara de bolos frescos e constatava-se o excessivo uso de papel vegetal que servia de base à cozedura dos bolos reis, o qual apresentava sujidades e detritos queimados; referencia à contra-ordenação que os mesmos integravam: artºs 2º, 3º e 4º do Dec.-Lei nº 425/99 de 21/10 e às coimas aplicáveis: 99.76 a 44.891,81 euros; aos prazos do exercício do direito de defesa e à possibilidade de ser requerido o pagamento voluntário da coima.
A Relação do Porto (proc. n.º 5855/05), por acórdão de 8.2.2006, negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida.
E fê-lo da seguinte forma: Pretende a recorrente que a comunicação que lhe foi feita, no âmbito do Art. 50º Regime Geral das Contra-Ordenações, é nula por da mesma não consta a imputação subjectiva da infracção e a indicação se a mesma foi cometida a título de dolo ou negligência.
Como se disse, a notificação, impugnada refere que o «no dia 22 de Dezembro de 2003, pelas 12h, na secção de pastelaria da unidade de Bragança existiam e foram vistos detritos diversos nos equipamentos, tabuleiros, chão e câmara de bolos frescos e constatava-se o excessivo uso do papel vegetal que servia de base à cozedura dos bolos reis, o qual apresentava sujidades e detritos queimados». Depois, na mesma faz-se a referência à infracção concreta imputada à arguida.
Desde logo, como se disse na decisão judicial agora em recurso, a omissão, na notificação administrativa, dos requisitos relativos ao elemento subjectivo (dolo ou negligencia) integrantes da contra-ordenação, não impediam a recorrente de se pronunciar sobre os factos imputados, que são bem objectivos, e sobre o dito elemento subjectivo da infracção (aliás pelo montante em que foi condenada a recorrente saberia que a autoridade administrativa lhe imputava a infracção a titulo de dolo) Aqui uma conclusão é inevitável: a recorrente, com a invocação daquela omissão da indicação do elemento subjectivo, manifesta uma reverência estranha às fórmulas sacramentais, pois que pelos factos e pela infracção concreta constantes da nota de ilicitude ela não podia deixar de saber que aqueles factos eram imputados a título de culpa e, portanto, podia de imediato alegar factos que excluíssem a culpa ou a ilicitude, em vez de se agarrar à falta de um formalismo que, dada a natureza do ilícito e a autoria do auto de noticia e da decisão (por entidade administrativa), não tem os mesmos contornos de exigência da acusação crime ou da peça da autoria de autoridades judiciais.
O direito de audiência prévia concretiza-se mediante a transmissão ao arguido, pela autoridade administrativa, dos factos imputados e a qualificação jurídica contra-ordenacional que deles é extraída, dando assim a possibilidade de sobre esses dados o arguido afirmara a sua posição, seja ela contrária ou simplesmente não coincidente com a versão dos factos apresentada pela autoridade administrativa, ou diversa quanto à respectiva moldura sancionatória, acompanhada da faculdade de efectivação da prova correspondente.
Invoca a arguida a doutrina fixada no Assento do STJ nº 1/2003, de 25/1, que reza assim: «quando, em cumprimento do disposto no artigo 50º do Regime Geral das Contra - Ordenações, o órgão instrutor optar pela audiência escrita do arguido, mas, na correspondente notificação, não lhe fornecer a totalidade dos aspectos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito, o processo ficará doravante afectado de nulidade, dependente de arguição, pelo interessado/notificado…» É desde logo evidente, pela letra e pelo contexto do assento, que a doutrina do assento só se aplica ao caso de o órgão instrutor optar pela audiência escrita do arguido.
E nem mesmo assim, como se disse, a não especificação do título de imputação subjectiva integra a nulidade da notificação se os factos permitirem concluir, como se verifica no caso em apreço, que a infracção que é imputada - e só assim pode ser imputada - terá sido cometida como dolo...
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