Acórdão nº 087727 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Fevereiro de 1996 (caso NULL)
Magistrado Responsável | FERNANDO FABIÃO |
Data da Resolução | 06 de Fevereiro de 1996 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Na Comarca de Lisboa, A propôs contra Laboratório de Análises Clínicas de ..., Limitada e Dr. C a presente acção com processo ordinário na qual pediu que estes réus fossem solidariamente condenados a: a) reconhecer os autores como legítimos donos da fracção individualizada pela letra B, identificada na petição, sendo a posse dos réus insubsistente por falta de qualquer título que a legitime, b) desocupar essa fracção, restituindo-a devoluta aos seus proprietários, c) indemnizar o autor pelos prejuízos decorrentes do não recebimento de qualquer rendimento dessa fracção, consoante o discriminado no artigo 30 da petição, os quais até Agosto de 1992 inclusivé perfazem o montante de 5742912 escudos, bem como os que incorrerem até efectiva entrega da fracção em causa, calculados segundo o artigo 31 da mesma petição, e ainda os juros legais de mora, d) pagar as custas, procuradoria e as demais despesas que o autor faça, designadamente com advogado e solicitador, na medida em que ultrapassem as custas da parte e procuradoria que venham a ser atribuídas, a liquidar em execução de sentença. Para tanto alegou a aquisição derivada e originária da fracção, a constituição entre ele e o réu Dr. C da Sociedade ré, o funcionamento desta naquela fracção, o acordo verbal entre os mesmos de que a sociedade deliberaria pagar ao autor a quantia de 50000 escudos mensais, anualmente actualizável de harmonia com os índices oficiais fixados para os arrendamentos comerciais, deliberação que, porém, nunca veio a ser tomada nem qualquer renda paga, o que levou o autor a afastar-se da sociedade e, em 1988, a ceder a sua quota ao réu Dr. C e à mulher deste por escritura pública, após o que entregou ao mesmo réu uma minuta do contrato de arrendamento da fracção. Na sua contestação, os réus, depois de confessarem alguns factos e negarem outros e de afirmarem que o autor nunca se dispôs a formalizar a celebração do arrendamento comercial por escritura pública, o que os levou a não pagar as rendas, terminaram pedindo a sua absolvição do pedido. No saneador-sentença, o réu Dr. C foi absolvido dos pedidos e a ré Laboratório de Análises Clínicas de ... Limitada foi apenas condenada a reconhecer o autor como legítimo dono da fracção referida e foi absolvida dos restantes pedidos, para além de que foi fixado à acção o valor de 6142912 escudos. Desta decisão apelou o autor, mas a Relação negou provimento ao recurso. Do acórdão da Relação interpôs o autor este recurso de revista, tendo, na sua alegação, concluído assim: I - vistos os factos provados e sua evolução, resulta claro que, em 1988, quando o réu C redige a minuta do contrato de arrendamento por escrito particular naqueles precisos termos, mais não se está que a concluir as grandes bases dos negócios que projectaram; II - nessas precisas circunstâncias em que duas pessoas resolvem avançar com a confiança inerente e assentam nas grandes bases dos negócios ou contratos, tal não dispensa que esses contratos atinjam a sua perfeição com a manifestação e encontro das vontades livremente manifestadas e sem vícios que as afectem e em toda a extensão relativamente a cada contrato; III - o contrato de sociedade atingiu a sua perfeição com a outorga da respectiva escritura mas o mesmo não se poderá dizer do contrato de arrendamento, não obstante a ocupação permitida e a determinação do montante da renda, aquando da definição das grandes bases, dado se não ter ultrapassado o impedimento do destino habitação do local; IV - competia aos recorridos na acção de reivindicação, quando excepcionassem a existência do arrendamento, provar que esse contrato existia como perfeito, quanto mais não fosse pela exibição de um qualquer pagamento de renda (artigo 342 n. 2 e 1088 do Código Civil). V - aquando da fixação das grandes bases do negócio, a sociedade, antes da sua constituição, não tinha personalidade jurídica pela mágica disposição do revogado artigo 107 do Código Comercial e nem se poderá dizer que adquiriu direitos após a sua constituição, visto esses direitos não passarem dessas grandes bases ou preliminares do conjunto que projectaram; e mesmo que algo se queira salvar através da responsabilidade do representante, a verdade é que a sociedade não pode ser, neste caso, considerada como terceiro e gozar da protecção da boa fé de terceiros; VI - os recorridos, ao valerem-se de que não pagam renda porque não dispõem de escritura pública e ao contestarem a regularidade da acção de reivindicação, porque a acção de despejo era a adequada e onde não será sua intenção valerem-se da falta de título, evidenciam uma postura inconsequente; VII - mesmo admitindo, o que só por hipótese se concede, que existe arrendamento, contra o princípio da certeza a aplicação do disposto na revogada e fufaz norma do n. 3 do artigo 1029 do Código Civil, porque inconstitucional, não é de aceitar, devendo os tribunais recusar-lhe acolhimento; VIII - nada justificava, mesmo ignorando a nossa tradição jurídica e de harmonia com os limites traçados pelo artigo 18 n. 2 da C.R.P., o normativo constante do dito n. 3 do artigo 1029, visto as restrições então existentes a favor dos inquilinos já salvaguardarem esses interesses constitucionalmente protegidos, não havendo justificação moral, social ou económica para dar ao locatário a escolha entre invocar a nulidade por falta de forma e optar pela validade do contrato com violação do princípio da igualdade jurídica das partes; IX - ao acolher-se a sobredita disposição, fere-se o disposto no artigo 205 da C.R.P. que comete não deverem os tribunais acolher leis ordinárias que estejam em desacordo com os princípios fundamentais consagrados na Constituição e esses são os consignados nos artigos 13, 20 n. 2, 12 n. 1 e 62 da C.R.P.; X - deve conceder-se a revista, com a condenação dos recorridos no pedido. Na sua contra-alegação, os recorridos concluíram deste modo: I' - existe e já está em vigor um arrendamento de natureza comercial entre a recorrente e a recorrida, o qual não está regularmente perfeito por falta de escritura pública, mas nada impede, como não impediu, a sua existência desde o início até à presente data; II' - os recorridos continuaram desde o seu início a exercer normalmente a sua actividade nas instalações do arrendado; III' - nem a decisão da 1. instância nem a da Relação violaram a lei, pelo contrário, limitaram-se a confirmar jurisprudência anterior; IV' - nunca foi posta em causa a constitucionalidade ou quaisquer outros princípios constantes dos normativos aplicados ao caso vertente, pelo que à data dos factos a lei era a invocada pelos recorridos, tendo as instâncias aplicado correctamente as normas em que basearam as decisões; V' - deve manter-se na integra o acórdão recorrido. Colhidos os vistos legais, cabe decidir. A Relação deu como provados os factos seguintes: 1 - o autor tem inscrita a seu favor a propriedade da fracção individualizada pela letra B, que constitui o rés do chão do prédio urbano sito na Rua ..., freguesia de Odivelas, Concelho de Loures, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loures sob o n. 16329 a folhas 144/v do Livro B-46; 2 - Esta fracção foi adquirida pelo autor por escritura de 28 de Maio de 1982, no 23. Cartório Notarial de Lisboa (Doc. n. 2) e, após esta aquisição, o autor, no interesse do seu casal, vem administrando tal fracção, pagando as inerentes despesas, taxas camarárias, contribuições e impostos, despesas de água e electricidade...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO