Acórdão nº 97A669 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Março de 1998 (caso None)

Magistrado ResponsávelMACHADO SOARES
Data da Resolução17 de Março de 1998
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça A, Limitada veio propor a presente acção, com processo ordinário, contra "Fábrica de Confecções B" pedindo que seja declarada dona e legítima possuidora do prédio urbano, identificado na petição inicial, a troco do pagamento do seu chão e ruínas no valor de 55200000 escudos, por si já desembolsado a favor da Ré e que esta seja condenada a reconhecer tal pretensão e requerendo, ainda, o cancelamento de quaisquer inscrições nele recaídas, lavradas ulteriormente à da transmissão exarada com o n. ... do Livro ..., a folhas 76 verso, a favor da Autora. Subsidiariamente, e para o caso de tal demissibilidade lhe não ser reconhecida, peticionou que, pelo menos a Ré seja condenada a pagar-lhes a quantia de 160000000 escudos, correspondente ao valor das benfeitorias por ela realizadas no mesmo prédio e a reconhecer o seu direito de retenção nelas fundado, enquanto não for integralmente liquidado o seu valor. Alega, em síntese: Adquiriu o direito de propriedade sobre o prédio referido, antes pertencente à Ré por 55200000 escudos, em leilão judicial, realizado em 25 de Novembro de 1981, na sequência de sentença de declaração de falência da Ré, sentença esta que, todavia, veio a ser revogada, em recurso, pelas instâncias superiores. Depois do leilão e após ter pago a totalidade do preço, veio a ser-lhe entregue o prédio, com autorização do administrador, prédio no qual, por se encontrar em mau estado de conservação e pretender adoptá-lo ao seu comércio, realizou obras com o que dispendeu a importância global de 180200000 escudos. As obras realizadas foram incorporadas no prédio, não podendo dele ser separadas, e valorizaram-no em 180200000 escudos. A Autora pagou as contribuições e encargos legais decorrentes do direito de propriedade sobre o imóvel em causa, bem como os prémios de seguro de incêndio a ele referentes, tendo adquirido o direito de propriedade do prédio através da acessão imobiliária. Para o caso de assim se não entender, deverá, no mínimo, a Autora ser indemnizada do valor das obras levadas a cabo, por constituírem benfeitorias necessárias e úteis, assistindo-lhe o direito de retenção sobre o imóvel até que a indemnização lhe seja paga. A indemnização reclamada, há-de abranger, ainda, outras obras de melhoramento, conservação e remodelação que realizou entre 1987 e 1992, com o que despendeu o montante de 28112739 escudos, e que representam um valor incorporado de 41000000 escudos. Contestando, a Ré opôs, por um lado, que na altura do referido leilão judicial, a Autora fora advertida de que havia sido requerida a anulação do processo de falência e, por outro, que o prédio se encontrava em bom estado de conservação, sendo que as obras efectuadas não atingem a dimensão pretendida pela Autora. Alega, também, que a Autora, a despeito de ter sido notificada em Outubro de 1983 de que a venda fora anulada, continuou a ocupar indevidamente o prédio e, por isso, pede, em reconvenção, que ela seja condenada a pagar-lhe uma indemnização a fixar segundo critérios que indica, nomeadamente através do montante de rendas que receberia se o prédio estivesse arrendado, ou a liquidar em execução de sentença. A Autora replicou. Foi interposto recurso de agravo pela Autora do despacho que a condenou nas custas do incidente de apoio judiciário. Foi também interposto recurso de agravo pela mesma Autora do despacho que considerou admissível a reconvenção deduzida pela Ré. Posteriormente, a culminar o julgamento, foi proferida sentença onde se julgou procedente a acção e improcedente a reconvenção declarando-se a Autora titular do direito de propriedade sobre o prédio em causa, por o ter adquirido por acessão industrial imobiliária, e condenando-se a Ré a reconhecer tal direito, devendo, em contrapartida a Autora pagar àquela a quantia de 55200000 escudos, a actualizar desde 1982, segundo os índices de variação de preço ao consumidor, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística e excluindo a Autora do pedido reconvencional. A Relação do Porto, para onde recorreram ambas as partes, através do Acórdão de 4 de Março de 1997, constante de folhas 360 e seguintes, decidiu do seguinte modo: a) Julgar deserto , por falta de alegações o recurso de agravo interposto pela Autora do despacho que a condenou em custas do incidente de apoio judiciário; b) Negar provimento ao agravo interposto pela mesma Autora do despacho que julgou admissível a reconvenção; c) Julgar improcedentes os recursos de apelação interpostos por ambas as partes; d) E, em consequência confirmar as decisões recorridas. Inconformadas, ambas as partes interpuseram recurso de revista para este Supremo Tribunal. Eis as conclusões das alegações apresentadas pela Ré: A) A decisão recorrida contraria frontalmente toda a jurisprudência sobre o tema, nomeadamente a do S.T.J. reafirmadas em Acórdão bem recente, toda a doutrina nacional e o direito comparado e, ainda, as regras básicas da interpretação da lei. B) Na acessão imobiliária reporta-se a lei à construção de obra em terreno alheio, o que significa a existência de uma relação entre ela e o terreno, com exclusão da obra realizada apenas num edifício (como é o caso dos autos), sob pena de o pensamento legislativo não ter na lei um mínimo de correspondência verbal (Acórdão do S.T.J. de 4 de Abril de 1995). C) A fundamentação da posição (única) do Tribunal a quo em querer equiparar prédio (melhor, edifício) a terreno, no texto do artigo 1340 do Código Civil, é totalmente desmentida pelo elemento literal, histórico e sistemático que devem presidir à interpretação do preceito em questão. D) A acessão supõe uma inovação e não apenas uma melhoria da coisa existente, o que corresponde a uma benfeitoria. Com o Senhor Juiz-Desembargador vencido diremos que a ora recorrida "fez num prédio importantes obras de restauro de um prédio urbano preexistente, em alguma coisa inovadora, mas não suficientemente inovadora para se dizer que houve alteração de substância do prédio". E) Na acessão o interventor tem que ser um estranho em relação à coisa; releva aqui, como ensina a doutrina, o elemento subjectivo. F) No momento em que realizou as obras, a A, era legalmente proprietária do prédio em causa, muito embora tal título tenha, posteriormente, sido destruído. A A, actuou como proprietária putativa do prédio, com a consciência de o prédio ser seu, pelo que não está preenchido o requisito legal da obra em terreno alheio. G) Pelas razões expostas deverá ser revogada a sentença recorrida e apreciado o pedido reconvencional, o qual deverá ser julgado procedente, sendo a recorrida condenada a pagar à recorrente, uma indemnização pelo tempo de ocupação de má-fé do prédio, ou seja, desde Novembro de 1983. H) Tal indemnização deverá ser calculada tomando por base o valor da renda do prédio no mercado de arrendamento, tomando-se como referência o valor de tal renda em Maio de 1994, a qual era de 3000000 escudos por mês, como ficou dado por provado. I) O montante de tal indemnização vencerá juros, à taxa legal, desde a apresentação do pedido reconvencional. J) Sem prescindir, a ser confirmada a sentença recorrida no tocante à acessão, esta deve ser alterada no seguinte ponto: L) O montante nela fixado como indemnização à recorrente B - 55200000 escudos - deve ser actualizado desde 26 de Novembro de 1981 e não 26 de Novembro de 1982, como consta da sentença recorrida. M) Trata-se aqui de uma questão de direito - as regras legais de actualização de uma dívida de valor - que implicam necessariamente, para a suposição do valor real de um certo quantitativo monetário, que a actualização se faça desde a data em que tal...

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