Acórdão nº 98A1195 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Fevereiro de 1999 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelGARCIA MARQUES
Data da Resolução03 de Fevereiro de 1999
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I Em acção declarativa de condenação, com processo ordinário, A, viúva de B, e os filhos deste, C, D, E, F e G, demandaram H, I, J, L e M, pedindo: - que fosse "reconhecido que os RR., com os escritos de que assumiram a responsabilidade e autoria, ofenderam gravemente a honra, consideração e dignidade pessoal e profissional do Professor B, com isso tendo causado elevados danos morais aos ora AA."; -que os RR. fossem "solidariamente condenados a pagar aos AA., a título de reparação dos danos não patrimoniais, uma indemnização que se computa em, no mínimo, 5000000 escudos, reafirmando os AA. o seu público compromisso de fazer reverter tal indemnização para as instituições referidas no artº 163º desta petição". A acção foi contestada, tendo sido absolvidos da instância, por terem sido consideradas partes ilegítimas, os RR. I, J, L e M. Foi julgada improcedente a excepção de caso julgado, deduzida pelo primeiro Réu. Houve despacho saneador, especificação e questionário, tendo, em audiência de julgamento, sido respondido aos quesitos pela forma constante de fls. 438-439. Com data de 27 de Dezembro de 1994, foi proferida a sentença de fls. 446 a 453, a julgar a acção improcedente, com absolvição do (único) R. (H) do pedido. Inconformados, os AA. interpuseram recurso, recebido como apelação. Em 18-08-95 ocorreu o óbito da A. A, sendo seus herdeiros os restantes AA. Em 15-01-96 ocorreu o óbito do R. Professor H, sendo seus herdeiros os seus filhos N, O e P. Por acórdão de 04-06-98, o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso, confirmando a decisão da 1ª instância. Inconformado com o decidido, o A. D interpôs o presente recurso de revista, oferecendo, ao alegar, as seguintes conclusões: 1. O Acórdão recorrido negou provimento ao recurso interposto pela simples razão de entender que em causa estavam apenas duas versões sobre os acontecimentos ocorridos em 1968 com a doença e falecimento de Salazar, mais tendo entendido que o recorrente e demais autores não lograram provar o animus difamandi, sendo indiferente provar-se, ou não, a versão dos factos; 2. A própria sentença recorrida reconheceu que a causa em discussão é uma questão complexa e muito delicada que só a avalanche de processos que vai submergindo os Tribunais não permitiu o estudo da questão com maior profundidade; 3. Neste recurso, este Venerando Supremo Tribunal de Justiça tem uma última oportunidade de julgar a complexidade de toda esta questão em que um artigo subscrito pelo Dr. H consumou um ataque feroz, público e violento, com difamações contra o bom nome e memória do saudoso e querido Professor B; 4. O Tribunal Colectivo, ao ter decidido remeter para o artigo susbcrito pelo Dr. H a resposta a dar aos quesitos 13 e 14, reconheceu que a ofensa à honra e memória dependia da análise objectiva desse mesmo artigo, conjugado com as respostas aos restantes quesitos e com todos os documentos juntos aos autos; 5. A intenção de difamar resulta de um juízo normativo a realizar, na falta de outro critério geral, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso concreto (artigo 487º do Código Civil). Tal animus difamandi e injuriandi deve ser determinado e julgado de acordo com a conduta normal do cidadão comum in abstracto, e não segundo a diligência do autor do escrito in concreto; 6. O referido escrito do Dr. H, com a sua versão dos factos, deveria ter respeitado o bom nome, honra e memória do Professor B, o que manifestamente não fez; 7. Desse escrito só se pode extrair a conclusão que o Dr.H insinuou que o Professor B era um mentiroso. Desse mesmo escrito também se conclui que o Dr. H insinuou que o Professor B era um incompetente; 8. Desse escrito resulta ainda que o Dr. H insinuou ser o Professor B venal e desonesto; 9. Ainda desse escrito se tem de retirar a conclusão de que o Dr. H insinuou ser o Professor B um médico negligente; 10. Por fim também se terá de concluir que o Dr. H, com o seu escrito, insinuou tratar-se o Professor B de um homem belicoso e rixão; 11. Estas conclusões tiram-se da análise objectiva do aludido escrito, quando o recorrente e demais autores conseguiram provar que, em diversas passagens, o Dr. H mentiu de forma consciente e deliberada. Com essas mentiras conseguiu dar uma imagem deplorável ou, como o Dr.... reconhece, "um retrato repugnante do Professor B, desde a incompetência profissional à mentira, passando pelo arrangismo político"; 12. O próprio Conselho Disciplinar do Sul da Ordem dos Médicos, a fls. 31 dos autos, reconhece que o escrito do Dr. H contém numerosas alusões depreciativas ao falecido Professor B, sendo ofensivas à memória deste, sendo maldosas as insinuações feitas pelo Dr. H., que não teve um comportamento adequado à dignidade da sua profissão, violando um dever de solidariedade médica e lealdade para com um Colega; 13. Os próprios recorridos que uma versão dos mesmos factos relatada por um determinado jornalista logrou ofender o bom nome, honra e consideração do Dr. H (sic, no texto), pelo que reconhecem que a circunstância de se tratar de uma narração de factos com uma opinião pessoal dos mesmos não pode afastar, só por si, a censura e punibilidade desse mesmo escrito, como sucede com o artigo do Dr. H em que este sob a capa de uma pretensa narração desferiu um inacreditável (sic, no texto) ao bom nome e memória do saudoso Professor B; 14. Assim, o escrito do Dr.H constituiu uma ofensa à memória e ao bom nome do Professor B, enquadrando uma violação dos direitos consagrados nos artigos 70º a 73º do Código Civil e artigos 24º a 27º e 34º da Constituição da República, devendo os recorridos ser condenados a indemnizar o recorrente conforme pedido formulado na petição inicial. O recorrente terminou, pedindo a revogação do acórdão recorrido, "(...) reconhecendo-se que o Dr.H, com o seu escrito de fls. 17 e 18, ofendeu gravemente a honra, consideração e dignidade pessoal e profissional do Professor B, devendo os recorridos ser condenados a pagar um montante não inferior a cinco milhões de escudos, que reverterá para as Bibliotecas B". Os recorridos contra-alegaram, pugnando pela confirmação do decidido pelo Tribunal a quo. II Foi a seguinte a matéria de facto que as instâncias deram como provada: - O semanário "O Jornal" publicou na sua edição de ..de ... de 1988 um dossier com o título "Mistérios da Queda de Salazar" em que cita escritos deixados pelo Professor A - alínea A) da Especificação. - Nesses escritos o Professor B afirma que "o Dr. H foi chamado por mim por eu ter feito o diagnóstico de hematoma intracraneano, subdural e entender que era urgentíssima a intervenção cirúrgica. Fui eu que tive de assumir a responsabilidade do dignóstico e da intervenção cirúrgica, por os neurocirurgiões presentes não concordarem com o diagnóstico e fi-lo sempre na qualidade de médico assistente" - alínea B) da Especificação. - O Professor ... foi durante mais de 20 anos, e até à sua morte, médico assistente de Salazar, e faleceu há mais de 15 anos - alínea C) da Especificação. - A é viúva do Professor B e C, D, E, F e G são filhos do Professor B - alínea D) da Especificação. - - O Professor H foi neurocirurgião e, nessa qualidade, presidiu à equipa médica que, em Setembro de 1968, efectuou a intervenção cirúrgica ao hematoma intracraneano subdural de que sofria Salazar - alínea E) da Especificação. - O Professor H, na edição de.... ..de 1988 de "O Jornal", respondeu aos escritos do Professor B, dizendo, entre outras coisas: - "O depoimento do Professor B, falseia toda a verdade"; - "Em 5 de Setembro disse-me que não se tratava de qualquer urgência, era um doente que estava até muito bem"; - "A 6 de Setembro, à tarde, disse-me que o Dr. Salazar estava perfeitamente bem, tinha dado uma queda mas que tudo se resolvera"; - "A partir desse momento só havia uma pessoa responsável - eu. Não tenho culpa que o Sr. Professor B tenha chegado à idade a que chegou sem compreender que o único responsável dum acto cirúrgico é o cirurgião. Não entra na cabeça dum cirurgião digno desse nome ir operar um paciente à responsabilidade de um médico assistente"; - "A partir daí começaram a surgir dificuldades por parte do Professor B que entendia que o doente devia voltar para casa apesar de poderem surgir complicações. Eu não tomava a responsabilidade de lhe dar alta antes de, pelo menos, duas semanas"; - "Sobre a sua isenção devo lembrar que uma tarde disparou-me "(...) assim que o Senhor Presidente do Conselho voltar para São Bento vai mandar fazer um Instituto de Cardiologia para mim (...)"; - Decorridos oito dias (...), Salazar sentiu-se muito mal após o almoço (...) estava em situação desesperada podendo morrer a qualquer momento. Dizem-me que o Professor B descreveu a Salazar a operação feita, seguramente com a perfeição que seria de esperar na descrição duma intervenção neurocirúrgica feita por um especialista em cardiologia"; - "Se tenho aceite a sugestão do Professor B de ele ir para São Bento ao 4º dia de operado tinha morrido"; - "As relações com o Professor B complicaram-se ainda mais. Certa vez tive que me meter entre o Professor X e ele para evitar uma cena de pugilato"; - "A ... de Dezembro, numa entreveita ao "Primeiro de Janeiro", o Professor B diz que os neurocirurgiões e os neurologistas não eram precisos para nada. Ao ler o jornal na frente do Presidente da República disse não ter dado qualquer entrevista e que eram intrujices habituais dos jornalistas"; - "Posto perante a evidência (do registo magnético) B confirmou que fez declarações e que se tinha esquecido da conversa telefónica tida com o jornal" - alínea F) da Especificação. - O Professor B é autor dos trabalhos científicos referidos de fls. 29 a 48 dos autos e o Professor H possui o "curriculum vitae" que se mostra fotocopiado de fls. 207 a 216 - alíneas G) e H) da Especificação. - Com base nestes mesmos factos os Autores apresentaram queixa crime contra o Professor...

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