Acórdão nº 98B1124 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Fevereiro de 1999 (caso NULL)

Data24 Fevereiro 1999
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de justiça: 1. A e mulher B, residentes em Serradela - Pombeiro da Beira - Arganil, instauraram no Tribunal de Círculo de Coimbra acção ordinária contra a "CAIXA DE CRÉDITO AGRÍCOLA MÚTUO DA BACIA DO CEIRA, CAL", com sede em Góis e a "CAIXA DE CRÉDITO AGRÍCOLA MÚTUO DO CONCELHO DE ÓBIDOS, CAL", com sede em Óbidos, pedindo: - se declarasse que os AA., ao celebrarem com as RR dois contratos de mútuo com garantia hipotecária e pignoratícia nos montantes de 55000000 escudos e 17000000 escudos respectivamente, titulados por escritura de 15-9-93, se encontravam em situação de inferioridade perante as RR. ou de necessidade de anuírem às exigências por estas formuladas; - se declarasse que, ao celebrarem tal contrato, as RR. pretenderam explorar as referidas situações de inferioridade e necessidade, as quais, aliás, bem conheciam e precipitaram; - se declarasse que as RR., ao assim actuarem, foram preordenadamente determinadas pelo espírito de obterem dos AA. benefícios excessivos, desproporcionados e lesivos, como efectivamente obtiveram; - fossem as RR. condenadas a reconhecerem aqueles pedidos e, em conformidade, fosse declarado nulo o contrato celebrado entre AA. e RR. 2. Por sentença de 18-4-97, o Meritíssimo Juiz do 3º Juízo do Tribunal de Círculo de Coimbra, considerando provado que os AA agiram sob coacção moral na outorga daquele contrato, julgou a acção procedente e, em consequência, decretou a sua anulação sob invocação do disposto nos artºs 255º e 256º do Código Civil. *** 3. Inconformadas, interpuseram as RR. recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, o qual, por acórdão de 12-5-98, lhe concedeu provimento, revogando a sentença de 1ª instância e julgando, em conformidade, a acção improcedente. *** 4. Desta feita inconformados os AA. com tal aresto, dele vieram os mesmos interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal, em cuja alegação formularam as seguintes conclusões: 1. Face aos factos provados, encontram-se preenchidos todos os requisitos da coacção moral constantes do artº 255º do C. Civil. 2. Daí que a declaração negocial constante da escritura pública assinalada na alínea C) da Especificação seja anulável (conf. artº 256º do C. Civil). 3. Para além disso, os mesmos factos, designadamente os atinentes ao aludido alargamento, configuraram um abuso de direito. 4. Abuso de direito esse que determina a nulidade da citada escritura pública.... 5. Por outra via, a assunção da dívida de 67000 contos, em montante superior ao cheque dos autos - de 13380 contos - é nula por inexistência da causa-função (conf. Ac. do STJ de 27-4-89, in BMJ 386 -452). 6. Esta inexistência de causa-função traduz um negócio contrário à lei e, como tal, nulo (conf. artº 280º -1 do C. Civil). 7. No douto acórdão recorrido não se tomou conhecimento destas nulidades, derivadas do abuso de direito e da inexistência da causa-função, como devia ter ocorrido (conf. artº 286º do C. Civil e artº 265º e 660º nº 2 do CPC), pelo que é nulo (conf. artº 668º nº 1 alínea d) do CPC). 8. Está assente, por acordo entre as partes, que o cheque dos autos é anterior ao DL 454/91 de 28/12 e que a subscrição da escritura pública de empréstimo com hipoteca e penhores em análise determinou a desistência da queixa pela CCAM de Óbidos (conf. artº 38º da p.i e artº 15º da contestação e artº 490º nº 2 do CPC). 9. Deve esta matéria ser ampliada no Tribunal da Relação e a questão julgada de harmonia com a decisão de ter ocorrido coacção moral (conf. artºs 712º nº 1, 729º nº 3 e 730º do CPC). 10. No douto acórdão recorrido errou-se ao determinar a aplicação do artº 342º nº 1 do C. Civil, errou-se na interpretação dos artºs 255º e 256º do C. Civil e errou-se ao não aplicar o disposto nos artºs 280º, 286º e 334º do C. Civil, violando-se o consignado nos artºs 265º e 660º nº 2 do CPC ". 5. Contra-alegaram as RR. sustentando a correcção do julgado, para o que formularam, na respectiva alegação, as seguintes conclusões: " 1ª Nos termos expressos na petição inicial, a causa de pedir nos presentes autos circunscreve-se à pretensa ilicitude do seu objecto negocial por usura do contrato e não tem nada a ver com o medo causado por coacção moral como factor determinante da vontade negocial dos recorrentes; por isso, 2ª Deve ser declarada nula a sentença da 1ª instância nos termos da parte final da alínea d) do nº 1 do artº 668º do CPC por pronúncia indevida; de resto, 3ª Nas condições económicas em que se encontravam os AA, à data da celebração do contrato em causa, era direito das ora alegantes - e constituía exercício normal desse direito - a exigência acerca do pagamento do cheque sem cobertura pelo qual o A. marido se achava preso tinha de ser inserida na negociação global em curso sobre o saneamento financeiro do património dos AA. e das empresas que eles dominavam; para mais, 4ª A recusa das ora alegantes de não negociarem isoladamente o pagamento desse cheque para possibilitarem a soltura do A. marido, não constituía ameaça ilícita, uma vez que, por um lado, a liberdade do preso não estava na disponibilidade dos ora alegantes, nem, por outro lado, foram as ora alegantes quem o constituiu na situação de detido. 5ª E, nas circunstâncias dos autos, a recusa de contratar por parte das ora alegantes, insere-se no princípio da liberdade contratual quer de celebração, quer de estipulação, nada apontando para que essa recusa possa ser encarada como abusiva ou, a qualquer outro título, contrária à lei. 6ª O que, de resto, foi decidido do douto acórdão em recurso, com fundamento na prova dos autos, sem que os recorrentes invoquem erro na sua apreciação. 7ª Assim, é de julgar improcedente a revista e de manter a douta decisão recorrida no que respeita à natureza não usurária do contrato em apreço, por a actuação das ora alegantes se circunscrever no âmbito da sua liberdade contratual, sem exceder os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico que o determina, nem o objecto do contrato ser contrário à lei ". *** 6. Colhidos que foram os vistos dos Exmos Conselheiros Adjuntos, e nada obstando, cumpre apreciar e decidir. *** 7. Em sede factual vêm dados como assentes pelas instâncias os seguintes pontos: " 1. No Tribunal Judicial de Arganil a Ré CCAMBC requereu contra os AA duas execuções ordinárias com os nºs 177/92 e 178/92, através das quais pretendia obter o pagamento das quantias de...

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