Acórdão nº 99A1096 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Fevereiro de 2000

Magistrado ResponsávelGARCIA MARQUES
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2000
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Nos presentes autos de ratificação de embargo de obra nova que A e B moveram em 19 de Fevereiro de 1992, no Tribunal Judicial da Comarca de Almada, contra o Estado Português, foi, por acórdão da 2. Secção deste STJ, de 13 de Março de 1997, no provimento de agravo interposto pelos Requerentes, deferido o aludido requerimento de ratificação de embargo de obra nova - cfr. fls. 290 a 304. Na sequência de tal decisão foi ordenada a elaboração de auto de acordo com o disposto no artigo 418 do CPC, o que foi feito em 27 de Maio de 1997 - fls. 309 e 310. Em 4 de Junho de 1997, vieram os Requerentes pedir que, após vistoria da obra embargada, fosse ordenado: a) O despejo da obra nova, ficando completamente livre e desocupada dos bens e das pessoas que abusivamente a ocupam; b) A reposição das obras no estado anterior, que era o descrito no auto de embargo de 17 de Fevereiro de 1992, fls. ..., sem prejuízo da responsabilidade criminal respectiva do Eng. António Cosme, então Presidente da Comissão Instaladora da Paisagem da Arriba Fóssil da Costa da Caparica (...), procedimento a que deve dar o necessário seguimento o Ministério Público (artigo 388 do CP e artigo 420/2, do CPC) - fls. 324 a 326. Realizada peritagem, a fim de averiguar se houve continuação abusiva da obra entre o embargo extrajudicial e o auto de ratificação, foi, pela 1. instância proferida decisão, em 29 de Outubro de 1998, a indeferir o requerido, com os fundamentos que, no essencial, se passam a enunciar: (1.) Quanto ao peticionado em a), trata-se de decisão que não pode ser tomada no âmbito desta providência ; (2.) Quanto ao pedido em b), "neste momento, é impossível «o Juiz fazer repor a obra no estado anterior», pois desconhece-se aquilo que efectivamente foi demolido após o embargo extrajudicial, bem como as características, dimensões, etc, das construções em causa". Conclui-se, pois, que, por impossibilidade física e material, não há hipótese de dar cumprimento ao disposto no artigo 420, n. 2, do CPC "que aliás está redigido e pensado fundamentalmente na perspectiva da demolição de obra abusivamente construída e não na construção de obra abusivamente demolida" cfr. fls. 349. Inconformados, agravaram os Requerentes, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 17 de Junho de 1999, julgado procedente o agravo, confirmando a decisão recorrida - fls. 381 a 386. Continuando inconformados, trazem os Requerentes o presente Agravo, oferecendo, ao alegar, as seguintes conclusões: 1. A deliberação em crise consubstancia o exemplo perfeito de que em Portugal existe o Direito, mas não se faz Justiça: o sistema está embaciado, opaco, com decisões não equitativas, que não tutelam efectivamente contra as violações dos direitos dos cidadãos (artigo 20 n. 4 e n. 5 da Constituição). 2. A deliberação impugnada mantém a paralisação do processo e revela carácter religioso e caritativo relativamente ao Estado destruidor (artigos 933 e segs. do CPC). 3. O Tribunal de 2. instância está a vedar aos exequentes a via da execução para prestação de facto, dando uma interpretação inconstitucional ao artigo 420 do CPC, que fere a norma do artigo 18 da Lei Fundamental. 4. Veja-se que o credor de uma prestação de facto não satisfeita dispõe, por força dos artigos 828 e 804 do CC e 933 n. 1 do CPC, de uma alternativa: a) requerer a prestação por outrem, se o facto for fungível; ou b) pedir indemnização pelo dano sofrido (artigos 931 e 934 do CPC). 5. A reposição das obras embargadas pressupõe o despejo requerido pelos exequentes. 6. No caso dos autos, há inequívoca possibilidade legal, física e material de dar cumprimento ao disposto no artigo 420/2 do CPC - construindo a obra abusivamente demolida - pelo que a deliberação recorrida enferma de erro dos pressupostos factuais e legais/erro de julgamento. 7. A deliberação recorrida, quanto à matéria da responsabilidade criminal assacada ao Eng. António Cosme, devia dar o necessário seguimento do caso para o MP, e não o tendo feito enferma de erro de julgamento (artigos 241 e 242 n. 1 b do CPC). Pedem, por isso, os Recorrentes a revogação / anulação da deliberação impugnada, "porque ilegal e bloqueadora dos direitos fundamentais dos exequentes consignados nos artigos 18 e 20 n. 4 n. 5 da Constituição. Contra-alegando, o Ministério Público pugna pela confirmação do acórdão recorrido. Corridos os vistos legais, cumpre decidir. II 1- No âmbito do acórdão recorrido, foi apreciado o agravo interposto da decisão da 1. instância, integrando as três seguintes questões: a) Da possibilidade de decretação do despejo neste autos de embargo de obra nova; b) Da possibilidade, neste mesmo processo, de ordenar a construção de uma obra que foi demolida; c) Da nulidade do despacho impugnado. Depois de ter considerado improcedentes todas as conclusões respeitantes às aludidas questões, o Tribunal a quo negou provimento ao agravo. 2- Antes de nos debruçarmos sobre o objecto do recurso, impõe-se que dediquemos atenção ao próprio acórdão impugnado, na sua própria materialidade, ou seja, na sua estrutura e conteúdo. O artigo 749 do CPC, diploma a que pertencerão os normativos que se indiquem sem menção da origem, manda aplicar ao julgamento do agravo na Relação, tanto quanto for possível, as disposições que regulam o julgamento da apelação. Ora, o n. 2 do artigo 713 estabelece o seguinte: O acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, exporá de seguida os fundamentos e concluirá pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 659 e 665. Por sua vez, o n. 2 do artigo 659 prescreve: Seguem-se os fundamentos, devendo o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT