Acórdão nº 0151224 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Janeiro de 2003 (caso NULL)

Data20 Janeiro 2003
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto I - RELATÓRIO No Tribunal de Circulo de .......... Companhia de Seguros ........., instaurou a presente acção declarativa comum, com processo ordinário contra a Companhia de Seguros A........., pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe: a verba global de 8.438.787$00, referente aos dispêndios já efectuados com os dois trabalhadores feridos, acrescida dos juros de mora à taxa legal de 7%, até efectivo recobro desta importância; as pensões infortunísticas que a Autora continuar a pagar ao sinistrado David ............., conforme obrigação consignada pelo Tribunal do Trabalho de .............; ou, em alternativa ao predito pedido formulado; a verba de Esc. 8.206.803$00 referente às provisões matemáticas neste momento constituídas para garantia das pensões futuras que está obrigada a pagar ao mencionado David ...........

Alega com utilidade que pagou a mencionada quantia de 8.438.787$00 a dois trabalhadores da firma M............ Lda. com quem celebrara um contrato de seguro de acidentes de trabalho, com cobertura dos sinistros "in itinere" os quais tiveram um acidente de viação, quando se dirigiam das instalações da firma M............. Lda às respectivas residências, fazendo-se transportar como passageiros, na viatura ligeira de passageiros de matrícula OC-..-.., propriedade e conduzida por António N.............., com culpa exclusiva deste último que havia transferido para a Ré a responsabilidade civil por acidentes de viação desse seu veículo.

Conclui, pela procedência da presente demanda.

Contestou a Ré aceitando os valores pagos pela Autora e reclamados na acção.

Impugnou, porém, a versão descrita do acidente que reputa ter ocorrido por motivo de força maior estranha ao normal funcionamento do veículo já que o mesmo se ficou a dever à circunstância de existir areia na via.

Conclui, pela improcedência da acção.

Na réplica a Autora reafirma a sua versão, impugnou a matéria articulada pela Ré e conclui que os factos alegados pela Ré não desculpabilizam o seu segurado, pela eclosão do sinistro.

Foi proferido despacho saneador, com a elaboração de base instrutória.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com a observância das formalidades legais aplicáveis, tendo sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, decidindo condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de Esc. 8.000.000$00 acrescida de juros de mora à taxa 7% desde a citação e até integral pagamento e absolver a Ré dos restantes pedidos.

  1. Mas não lhe poderá igualmente ser imputada pelo risco, como sentença recorrida.

  2. A areia que se encontrava no pavimento e que provocou o despiste dos autos foi derramada, isto é, caiu de um transporte em movimento.

  3. O acidente dos autos ficou, pois, a dever-se a culpa de terceiro, e que neste caso concreto era a entidade que procedia ao transporte.

  4. Se assim não se entender, sempre se dirá que a areia derramada constitui motivo de força maior, isto é, exterior ao funcionamento do veículo.

  5. Ao contrário do óleo, que é um utensílio indispensável à circulação de qualquer veículo com motor, e da água proveniente das chuvas, que não é minimamente controlável.

  6. Onde circula um veículo a motor há sempre a possibilidade de derramamento de óleo, e como os veículos circulam em espaço aberto, sujeitam-se às intempéries.

  7. Tal não acontece com a areia.

  8. Aquela, paradoxalmente ao óleo e à água, é um elemento completamente estranho ao funcionamento do veículo, pelo que é subsumível na previsão do artº 505° do C. Civil.

  9. A douta sentença recorrida violou, assim, os artºs 503° n° 3 e 505° ambos do C. Civil.

    NESTES TERMOS, deve o presente recurso ser julgado procedente e a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que, julgando a acção totalmente improcedente, absolva a R., ora recorrente, no pedido.

    B - Da Autora/Companhia de Seguros ............., 1- A existência de areias no local, com a consequente passagem de camiões e inevitável derramamento de areias, na via, imporiam que o condutor do OC circulasse a velocidade moderada.

    2- Seguindo a cerca de 60/70 Km/hora, não foi capaz de dominar a marcha do veiculo em função da presença de areia na via, com a consequente saída de estrada. Por isso, 3- o condutor do OC violou o disposto nos arts. 24 e 25 do Código da Estrada, com a redacção em vigor à data do sinistro.

    4- Não o tendo reconhecido, o Tribunal "a quo" não aplicou, e violou, o disposto nestes normativos e o vertido no artº 483 do Código Civil, 5- Por não ter reconhecido que a responsabilidade de tal condutor se baseava na culpa.

    SEM PRESCINDIR, 6- os arts. 1º nºs 1 e 2 da Directiva 84/5/CEE, vertida para o direito nacional através do DL 522/85, de 31 Dezembro e Lei 3/96, de 25 Janeiro, obstam à existência de uma legislação nacional que prevê montantes máximos de indemnização inferiores aos montantes mínimos de garantia fixados por esses artigos quando, não havendo culpa do condutor do veiculo que provocou o acidente, só haja lugar a responsabilidade civil pelo risco.

    7- Tendo sido celebrado, no caso em apreço, uma contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel que obedece necessariamente à legislação referida no artigo anterior, 8- o Tribunal "a quo" aplicou indevidamente à situação SUB-JUDICE, os limites máximos que o artº 508 do Código Civil estabelece 9- assim violando o disposto no artº 1º nºs 1 e 2 da supra-citada Directiva Comunitária que obstam a tal aplicação e legislação que a recebeu 10- e ainda o principio do primado do Direito Comunitário.

    NESTES TERMOS, PROCEDE O PRESENTE RECURSO E, CONSEQUENTEMENTE, DEVE SER REVOGADA A DOUTA SENTENÇA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA, A SUBSTITUIR POR DECISÃO QUE CONDENE A RÉ A PAGAR A AUTORA A TOTALIDADE DAS DESPESAS QUE ESTA COMPROVADAMENTE FECTUOU, SEM CONSIDERAÇÃO PELOS LIMITES MÁXIMOS ESTABELECIDOS PELO ARTº 508 DO CÓDIGO CIVIL, CONCOMITANTEMENTE, DEVENDO SER NEGADO PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE CONTRÁRIA COM O QUE SE CUMPRIRÁ A LEI E SE FARÁ INTEIRA E SÃ JUSTIÇA.

    Houve contra-alegações.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    1. FUNDAMENTAÇÃO II. 1. As questões a resolver consistem em saber se: (1) o acidente ajuizado teve causa exclusiva na sua eclosão, e, nesta medida, a quem atribuir a culpa na sua ocorrência; (2) ) inexiste culpa do condutor do veiculo interveniente no acidente, e nesta medida a responsabilidade é objectiva; (3) a responsabilidade pelo risco deixou de verificar-se porquanto o acidente ajuizado ficou a dever-se a causa de força maior; (4) a responsabilidade pelo risco deixou de verificar-se porquanto o acidente ajuizado ficou a dever-se a culpa de terceiro; (5) os arts. 1º nºs 1 e 2 da Directiva 84/5/CEE, obsta à existência de uma legislação nacional que prevê montantes máximos de indemnização inferiores aos montantes mínimos de garantia fixados por esses artigos quando, não havendo culpa do condutor do veiculo que provocou o acidente, só haja lugar a responsabilidade civil pelo risco.

    2. 2. 1. Em 1ª instância foi fixada a seguinte matéria de facto: 1. A Autora celebrou com a firma M........... Lda. um contrato de seguro de acidentes de trabalho, com cobertura dos sinistros "in itinere", titulado pela apólice nº 2-1-19/116763/08 (alínea a) da especificação).

  10. No dia 23 de Setembro de 1996, António ............ trabalhava sob as ordens e direcção da firma M............. Lda., com a categoria de pedreiro e o vencimento anual de esc. 85.000$00x14 (alínea b) da especificação).

  11. No dia 23 de Setembro de 1996, David ............ trabalhava sob as ordens e direcção da firma M............. Lda. com a categoria de servente e o vencimento anual de esc. 61.600$00 x 14 ( alínea c) da especificação).

  12. Nesse dia, pelas 17,20 horas, após completarem o seu dia de trabalho, dirigiram-se das instalações da firma M........... Lda às respectivas residências, fazendo-se transportar como passageiros, na viatura ligeira de passageiros de matrícula OC-..-.., propriedade e conduzida por António N............ (alínea d) da especificação).

  13. E quando o António N.............. conduzia a viatura OC na Estrada .............., no sentido sul-norte, sofreu um acidente, tendo o António ............. e o David .............. ficado feridos, com politraumatismos (alínea e) da especificação).

  14. Por causa dos ferimentos sofridos, o António ............... ficou afectado de incapacidade absoluta apara o trabalho desde a data do acidente até 7-10-1996 e desde 13-11-1996 até 8-1-1997 e de incapacidade temporária parcial de 15% entre 9-1-1997 a 9-5-1997 (alínea t) da especificação).

  15. Recebeu ainda assistência hospitalar, médica e medicamentosas (alínea g) da especificação).

  16. A Autora pagou-lhe a quantia de esc. 132.509$00 de indemnização por IT A e a quantia de esc. 34.606$00 por ITP .

  17. A Autora despendeu esc. 690.328$00 com hospitais, médicos e medicamentos prodigalizados a este sinistrado...

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