Acórdão nº 0220317 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Abril de 2002 (caso NULL)

Data23 Abril 2002
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na Relação do Porto Manuel....., residente em....., propôs acção com processo comum e forma ordinária contra António....., residente no....., ....., dizendo em suma que - é morador na Rua de....., onde possui uma vivenda unifamiliar com dois pisos (r/c e andar), na qual habita com o seu agregado familiar; - a zona onde se insere a vivenda do autor é caracterizada por moradias familiares com dois pisos; - o réu exerce a actividade de construtor civil e, nas traseiras da habitação do autor, na Rua do Sobreiral, está a construir um edifício destinado a habitação colectiva, edifício esse que se encontra implantado numa parcela de terreno, pertencente ao réu, destinada a construção, originalmente com a área de 3117 metros quadrados; - por deliberação camarária de 18.6.1998 o município de..... deliberou alterar o número de fogos e unidades de ocupação comercial dos lotes 3 e 4 da Rua do....., nos seguintes termos: lote 3 com a área de 880 metros quadrados, destina-se à construção de edifício com a cércea de cinco pisos acima da cota da soleira e duas caves, servindo de implantação a quatro unidades de ocupação comercial e vinte e quatro fogos; - na sequência dessa alteração o réu apresentou em 6.10.99 um aditamento ao projecto de obras, no qual se declarou que o coeficiente volumétrico de ocupação do solo seria de 2,05 m3/m2 e o número de pisos seria de 6, sendo 4 dos quais acima da cota da soleira e 2 abaixo da cota da soleira.

Como consta da licença de obras, o coeficiente de ocupação do solo do imóvel a construir era, inicialmente, de 2,19 m3/m2, mantendo-se, após o aditamento, em 2,05 m3/m2, preparando-se o requerido para edificar 5 pisos (Rc+4), tudo contra o disposto no PDM de..... que prevê para a zona um coeficiente de ocupação do solo nunca superior a 2,0 m3/m2 e não mais de 4 pisos (Rc+3), estando ferido de nulidade o acto de licenciamento, nos termos do art. 52º, nº 1, b), do Dec-Lei nº 445/91, de 20 de Novembro, e 3º do Dec-lei nº 448/91, de 29 de Novembro.

Da violação das regras relativas à ocupação do solo e cércea permitida resultará uma excessiva ocupação do solo pela intensa edificação, com a consequente afectação da qualidade de vida, em violação do disposto no art. 3º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, dos art. 65º e 66º da Constituição, 2º, nº 1, 13º, nº 5, e 40º, nº 4, da Lei nº 11/87, de 7 de Abril (Lei de Bases do Ambiente), 70º do CC, 1º e 2º , nº 1, da Lei nº 83/95, de 31 de Agosto (Lei da Acção Popular) Conclui, pedindo que o réu seja condenado a abster-se de, prosseguindo a obra que vem executando, edificar cércea superior a rés-do-chão mais 3 andares e/ou com coeficiente de ocupação do solo superior a 2,0 m3/m2, ou 0,66m2/m2, em violação das normas do PDM para a zona e em pre-juízo dos direitos do requerente e demais vizinhos.

Contestou o réu dizendo - em suma: A Câmara Municipal concedeu o alvará de licença de construção para 3 fases da construção do edifício, o que o autor soube e jamais impugnou contenciosamente ou reclamou.

Efectivamente o coeficiente de ocupação do solo (COS) era, no projecto primitivo, de 2,19 m3/m2. Mas em 7 de Agosto de 1998 o R. comprou ao Município de..... uma parcela de 293,32 m2 que, anexados ao lote primitivo em 14 de Maio de 1999 (fs. 57) e de acordo com nova folha de estatística apresentada na Câmara, fez baixar a volumetria de construção projectada para 2,05 m3/m2; depois, a redução em 40 cms da largura dos alçados laterais determina ainda mais a redução do COS que nunca excederá o máximo permitido de 5 m 3/m2, como previsto no art. 7º, nº 1, do PDM.

Quanto à cércea do edifício, não é ela desrespeitada, pois o edifício tem, como previsto no PDM, rés-do-chão e três andares e dois pisos abaixo da cota da soleira, destinados a estacionamento, sendo que o aproveitamento do subsolo para caves não releva para determinação da cércea do edifício.

Nunca a diferença de COS, a verificar-se, determinaria um maior número de residentes na zona nem afecta qualquer direito do A.

Em reconvenção, diz que o autor propôs a presente acção com o objectivo de desinteressar os potenciais compradores de apartamentos desse edifício, chegando a embargar a obra extra-judicialmente; - devido a esse embargo e à presente acção o réu ainda não celebrou qualquer contrato promessa relativamente a qualquer fracção desse imóvel, pois qualquer potencial comprador, quando toma conhecimento desta acção, desinteressa-se da compra; - um dos blocos está em fase de acabamentos; - na cidade de...... os construtores civis asseguram 70% das vendas das fracções antes do fim das obras, recebendo em média 30 a 40% dos preços finais aquando da celebração dos contratos promessa; - a zona do edifício do réu tem uma grande procura de apartamentos; se não fosse a pendência da presente acção o réu já teria vendido 40% dos apartamentos; - o valor de venda da totalidade dessas fracções será de esc. 400.000.000$00; - o réu tem vivido num estado de desespero e tem vindo a ser acompanhado medicamente.

Conclui pela improcedência da acção, pela condenação da autor, como litigante de má-fé, em multa e indemnização não inferior a 2.000.000$00 e pela procedência da reconvenção, devendo o autor ser condenado a pagar-lhe, a título de indemnização por prejuízos causados, a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença.

Na réplica o autor impugna a matéria da reconvenção, reafirmando o confessado excesso de ocupação do solo, mesmo depois da apressada aquisição do terreno ao Município, bem como a construção de um piso a mais que o permitido, pois aquilo a que chama soleira encontra-se a mais de dois metros de altura da via pública.

O nível de qualidade de vida do A. e demais vizinhos sairá sempre afectado com construção do R. em excesso do coeficiente de ocupação do solo que já é, por si, uma concessão às exigências do aumento populacional.

Quanto à reconvenção, o A. apenas pede que o R. cumpra a lei, pelo que ela improcede de todo.

Foi proferido despacho saneador que afirmou a validade e regularidade da instância e admitiu a reconvenção, organizando-se do mesmo passo a condensação processual, sempre sem reparos das partes.

Realizadas as diligências de instrução oportunamente requeridas, designadamente perícia colegial e prestados esclarecimentos ao relatório apresentado, procedeu-se a audiência de discussão e julgamento com decisão da matéria de facto perguntada no questionário, sem reclamações.

Após o que o Ex.mo Juiz proferiu sentença a julgar improcedentes tanto a acção como a reconvenção, depois de considerar (quanto à acção, pois só a improcedência desta vem impugnada) que não ocorreu violação do PDM de..... por não estar em causa qualquer ultrapassagem do coeficiente de ocupação do solo, improvado que o edifício terá cinco pisos acima da soleira (resposta negativa ao quesito 1º) ou que o COS seja de 2,19 m3/m2 (resposta negativa ao quesito 2º e restritiva ao 3º); de resto - acrescenta-se - a eventual violação do PDM seria da competência de um Tribunal Administrativo. Por outro lado, não se provou qualquer ofensa à qualidade de vida (resposta negativa ao quesito 4º) ou violação do direito geral de personalidade do A.

Isto, depois de julgar assentes os seguintes Factos: 1 - O autor é morador na Rua de....., onde possui uma vivenda unifamiliar com dois pisos (r/c e andar), na qual habita com o seu agregado familiar - (A).

2 - A zona onde se insere a vivenda do autor é caracterizada por moradias familiares com dois pisos - (B).

3 - Essa zona situa-se na área periférica, denominada zona C em termos de plano director municipal - (C).

4 - O réu exerce a actividade de construtor civil - (D).

5 - Nas traseiras da habitação do autor, na Rua do....., o réu está a construir um edifício destinado a habitação colectiva - (E).

6 - Esse edifício encontra-se implantado numa parcela de terreno, pertencente ao réu, destinada a construção, originalmente com a área de 3117 metros quadrados - (F).

7 - Para o efeito, o réu requereu e o município de..... emitiu a licença de obras nº../.., na qual foi certificado que a cércea de construção autorizada é de rés-do-chão mais três andares e o coeficiente de ocupação do solo é de 2,19 metros cúbicos por metro quadrado - (documento de folhas 9 - (G).

8 - Por deliberação camarária de 18.6.1998 o município de..... deliberou alterar o número de fogos e unidades de ocupação comercial dos lotes 3 e 4 da Rua do....., nos seguintes termos: lote 3 com a área de 880 metros quadrados, destina-se à construção de edifício com a cércea de cinco pisos acima da cota da soleira e duas caves servindo de implantação a quatro unida-des de ocupação comercial e vinte e quatro fogos, tudo conforme documentos de folhas 15 a 23 - (H).

9 - Por escritura pública exarada em 7.8.98, no notário privativo do Município de....., o réu declarou comprar e este município declarou vender uma parcela de 293,32 metros quadrados, destinada à rectificação de estremas e aumento da área da parcela onde esse imóvel estava implantado - (I).

10 - Após esta aquisição referida em 9, a parcela de terreno encontra-se actualmente descrita na Conservatória do Registo Predial de..... sob o nº..../...., com a área de 3410,32 m2 confinando de norte com Isabel....., de sul com I....., S.A., de nascente com António B..... e outros, e de poente com Rua do..... - (J).

11 - Na sequência dessa alteração, o réu apresentou em 6.10.99 um aditamento ao projecto de obras, junto a folhas 53, no qual se declarou que o coeficiente volumétrico de ocupação do solo seria de 2, 05 m3/m2 e o número de pisos seria de seis, quatro dos quais acima da cota da soleira e dois abaixo da cota da soleira - (K).

12 - Esse edifício terá 30 fracções de habitação e 2 lojas - (3º).

13 - O edifício que o réu está a construir terá 4 pisos (r/c + 3) acima da soleira (5º) e dois pisos de caves (6º) situados abaixo da cota da soleira (7º), e destinados exclusivamente a estacionamento (8º).

14 - O edifício que o réu está a construir terá um...

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