Acórdão nº 0230031 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Março de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelGONÇALO SILVANO
Data da Resolução14 de Março de 2002
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I- Relatório José ........... intentou contra Fundo de Garantia Automóvel, Domingos .......... e ............ - Companhia de Seguros, acção declarativa sob a forma de processo sumário, na qual pede a condenação dos RR. a pagarem-lhe a quantia de Esc. 15.272.500$00, acrescida de juros a contar da citação, bem como no que se vier a liquidar em execução de sentença.

Alegou, em síntese: - ter sido vítima de um acidente de viação enquanto transportado gratuitamente no veículo seguro na R. .............., Companhia de Seguros e que foi causado pelo referido veículo e pelo que era conduzido pelo R. Domingos ........, o qual não tinha seguro válido e eficaz, à data do acidente.

- ter sofrido danos consistentes em lesões físicas e suas sequelas, nomeadamente ao nível de diminuição da capacidade para o trabalho - e sofrimento sentido em virtude das mesmas e das várias intervenções cirúrgicas a que foi e será sujeito.

- ter estado sem trabalhar durante um período de tempo em que deixou de auferir a correspondente retribuição, bem com ter danificado diverso vestuário no acidente, danos cujo ressarcimento reclama.

Em contestação, os réus impugnaram os fundamentos da acção.

A acção veio a ser julgada parcialmente procedente e, em consequência condenou-se: a) os RR. Fundo de Garantia Automóvel e Domingos ............ a pagarem, solidariamente, ao A. José .......... a quantia de Esc. 8.171.025$00, acrescida de juros vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento, sobre o capital em dívida de Esc. 8.171.025$00, à taxa de 10% até 16.04.99 e de 7% de 17.04.99 em diante, bem como as demais que futuramente vigorem; b) os RR. Fundo de Garantia Automóvel e Domingos ........... a pagarem, solidariamente, ao A. José ............. a indemnização que se vier a liquidar em execução de sentença relativa ao agravamento da incapacidade referido no ponto 29 da matéria de facto provada e ao custo da intervenção cirúrgica referida no ponto 37 da matéria de facto provada; e c) Absolveu-se a R. ........... - Companhia de Seguros, S.A., dos pedidos contra si formulados.

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b)- Apreciação da matéria de facto, o direito e o recurso de apelação.

Sendo que é pelas conclusões que se determina o objecto do recurso (arts.684º, nº 3 e 690º, nº1 do CPC), vejamos pois do seu mérito: 1-As questões em apreciação: Não resultou demonstrada a culpa do acidente por parte de qualquer dos condutores, pelo que foi fixada a responsabilidade solidária pelo risco, dos RR., Fundo de Garantia Automóvel e condutor do veículo ......., Domingos ............

Na sentença, sem que a questão tenha sido suscitada no processo, expressamente, considerou-se derrogado o artº 508º do CC por força directa da Directiva nº 84/5/CEE transposta pelo DL nº 3/96 de 25/1 que fixou em 120.000.000$00, por sinistro, o capital obrigatoriamente seguro e condenaram-se os RR. Fundo de Garantia Automóvel e Domingos ........... a pagarem, solidariamente, ao autor, a quantia de Esc. 8.171.025$00, acrescida de juros vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento, sobre o capital em dívida de Esc. 8.171.025$00, â taxa de 10% até 16.04.99 e de 7% de 17.04.99 em diante, e ainda, a indemnização que se vier a liquidar em execução de sentença relativa ao agravamento da incapacidade referido no ponto 29 da matéria de facto provada e ao custo da intervenção cirúrgica referida no ponto 37 da matéria de facto provada.

O recorrente Fundo de Garantia Automóvel entende que a responsabilidade deve ser repartida em termos iguais, entre ambos os veículos, e sendo assim, a indemnização global deveria respeitar os limites previstos no nº 1 do artº 508º do Código Civil (4.000.000$00),que assim entende estar em vigor.

Não está, pois, em causa nem a culpa no acidente, nem o apuramento do montante dos danos. Tão só o recorrente entende que não foi derrogado o disposto no artº 508º do CC, o que implica, nessa perspectiva a redução da indemnização aos limites fixados naquela disposição legal.

Na sentença, para justificar os montante de indemnização atribuídos a título de responsabilidade pelo risco, disse-se , apenas o seguinte: "Importa não esquecer, igualmente, a evolução dos capitais mínimos do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel - cfr., por último, a Directiva nº 84/5/CEE,transposta pelo DL nº 3/3/96 de 25.01, que fixou em 120 000 contos por sinistro o capital obrigatoriamente seguro, como forma de ultrapassar algum miserabilismo que tantas críticas suscitou. Deve, por outro lado, considerar-se que a entrada em vigor de tal directiva, por incompatível com a limitação dos montantes indemnizatórios referidos no artº 508º do Código Civil, derrogou esta última disposição- a qual passará a ter o seu âmbito de aplicação restringido aos casos de responsabilidade pelo risco não derivados de acidente de viação".

2-O Conceito de Directiva Comunitária É sobre esta problemática que vamos centrar a nossa análise, tentando, dentro do que é exigível numa decisão judicial, explicitar, ainda que em síntese, alguns dos conceitos estruturantes, ao nível do Direito Comunitário, com particular incidência nas Directivas.

De facto, não se pode aceitar, simplificadamente, que o artº 508º do CC inserido no nosso Código Civil no âmbito da responsabilidade civil pelo risco, esteja revogado automaticamente por virtude da aplicação do artº 6º do DL nº 522/85 de 31/12 em função da sua última actualização introduzida pelo DL nº 3/3/96 de 25.01, que fixou em 120.000 contos por sinistro o capital obrigatoriamente seguro, diplomas estes que transpuseram as Directivas nº 84/5/CEE e 90/232/CEE).

Pensa-se que esta interpretação nasce na sequência de uma decisão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 14 de Setembro de 2000,do Processo C-348/98 (publicado no Boletim de Actividades do mesmo Tribunal nº 23/00) proferida em apreciação de uma questão de reenvio suscitada pelo Tribunal judicial de Setúbal ,interpretação que ,de resto, foi já também acolhida em recente acórdão deste Tribunal da Relação, na apelação nº..../.. desta mesma .. secção.

Com respeito por opinião contrária, há que introduzir aqui algumas notas de reflexão que passam pela análise das disposições de direito comunitário relacionados com as questões de seguro obrigatório, a que aludem as Directiva comunitárias 84/5/CEE e 90/232/CEE e com o regime de responsabilidade civil por factos ilícitos e por risco.

Na fundamentação do acórdão o TJCE (cuja decisão só vincula ,no caso concreto, o tribunal que suscitou a questão e as partes nele envolvidas - cfr. a anotação de Adriano Garção Soares ao Acórdão do TJCE acima referido, feita na Revista da Ordem dos Advogados do Conselho Distrital do Porto- ano 2001,nº 19,pág.60/61) não exclui a possibilidade de no actual estado do direito comunitário, os Estados membros continuarem livres de determinar o regime de responsabilidade aplicável aos sinistros resultantes da circulação dos veículos, garantindo embora que a responsabilidade civil aplicável segundo o seu direito nacional esteja coberta por um seguro conforme às disposições das aludidas Directivas comunitárias.

Nos termos do artº 249º do Tratado de Amestardão (anterior artigo 189º do Tratado CEE) dispõe-se que: "Para o desempenho das suas atribuições e nos termos do presente Tratado, o Parlamento Europeu, em conjunto com o Conselho, o Conselho e a Comissão adoptam regulamentos e directivas, tomam decisões e formulam recomendações ou pareceres.

O regulamento tem carácter geral. É obrigatório em todos os seus elementos e directamente aplicável em todos os Estados-membros.

A directiva vincula o Estado-membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios.

A decisão é obrigatória em todos os seus elementos para os destinatários que designar.

As recomendações e os pareceres não são vinculativos".

Sendo este o texto do Tratado e não estando em causa regulamento, decisão, recomendação ou parecer, mas tão só directiva, é sobre este acto comunitário que em seguida vamos centrar a nossa atenção.

Desde logo a directiva...

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