Acórdão nº 0250598 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Maio de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução13 de Maio de 2002
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto Dinis .......... e mulher Idalina .........., e; - Diamantino .......... e mulher Isaura .........., propuseram, em 15.11.2000, nas Varas Cíveis da Comarca do ........ - acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra: "A......, SA".

Alegando, em resumo, que celebraram com a ré um contrato promessa de compra e venda da fracção autónoma designada pelas letras "AS", destinada ao comércio, no 1° andar do prédio urbano designado por Antigos Paços do Concelho, pelo preço de 19.500.00$00, tendo posteriormente acordado permutar essa fracção pela fracção "AG", no r/c do mesmo prédio, sendo o preço desta de 20.300.000$00, montante que foi integralmente pago pelos autores.

Todo o negócio foi feito à vista da plantas, sem confirmação no local, sucedendo que, à data daquele estava o edifício em fase construtiva, sem estar constituída a propriedade horizontal ou emitida a licença de utilização, não constando do projecto licenciado pela Câmara Municipal de ......... a existência, dentro da fracção "AG", de uma caixa de acesso à descarga de fundo e "trop-lein" da cisterna do edifício.

Acontece que a ré, alterando o projecto construtivo sem informar os AA e a Câmara, colocou, no interior da citada fracção autónoma, essa caixa de acesso a partes comuns do edifício, do que os AA. apenas tomaram conhecimento, por volta de 1998, quando, após o edifício estar vistoriado, tentaram revender a indicada fracção.

Essa caixa está afecta ao uso de todos os condóminos do prédio e, para eventual reparação e para obras de conservação, não se pode impedir o acesso a essas instalações de descarga de fundo e "trop-lein" da cisterna do edifício à administração do condomínio e a técnicos, e, para esses fins, as portas dessa fracção autónoma têm de estar sempre franqueadas.

Por outro lado, tendo a fracção a área de 54 m2, está descrita na Conservatória do Registo Predial com a área de 109,26 m2, o que face à permilagem resultante, determina o pagamento de comparticipação e fruição das partes comuns de cerca do dobro da que resultaria da permilagem real.

O preço da fracção "AG" foi fixado teve em conta a área da fracção que resultava da planta e que a mesma não estava onerada ou limitada no seu uso, nomeadamente com a citada caixa, não tendo os AA. interesse na aquisição da fracção se nela continuar a existir essa caixa de acesso a partes comuns do edifício.

Por essa razão, os AA., por carta de 30 de Maio de 2000, interpelaram a ré para, no prazo de trinta dias, alterarem para a área real da fracção a descrição da mesma na Conservatória e para retirar do seu interior a citada caixa de acesso à descarga de fundo e "trop-lein", e que, decorridos trinta dias, sobre o termo daquele prazo, não tendo a ré feito as alterações, perdiam o interesse na celebração da escritura de compra e venda.

Com a referida caixa de acesso no interior da fracção "AO", os AA. não obtêm comprador da mesma por preço correspondente ao que entregaram à ré e, não fora essa limitação, tê-la-iam facilmente revendido por preço superior ao despendido e à aludida desvalorização.

Com essa citada caixa no seu interior, nunca os AA teriam prometido comprar a fracção "AO" à ré, bem sabendo esta que os AA., nessas circunstâncias, não teriam feito essa promessa.

A ré manteve sempre os AA. enganados quanto às efectivas características do objecto do negócio, no que respeita à situação da referida caixa de acesso, que nunca foi suposto estar colocada no interior da referida fracção designada por "AO".

Concluem pedindo que se declare ter a ré incumprido absoluta e definitivamente o contrato promessa relativo à fracção "AO" e condenada a para aos AA., em comum e partes iguais, a quantia de 40.600.000$00 ou, a não se entender assim, de declare anulado o contrato e se condene a ré a restituir aos AA. a quantia de 22.300.000$00, actualizada à data da sentença definitiva, com referência a 1995.

A ré contestou.

Além de afirmar que o preço que foi acordado pela fracção "AO" foi apenas de 19.500.000$00, diz que os AA. conheciam perfeitamente o edifício e não deixaram de visitar essa fracção previamente à promessa de aquisição, pelo que verificaram quer a área da fracção quer a existência da caixa de descarga de águas pluviais no seu interior, e que o projecto licenciado pela C.M. ........ prevê, desde o início, a existência da alegada caixa de visita no local onde se encontra (interior da fracção "AG").

Por outro lado, a permilagem da fracção é a que resulta da soma da área privativas da mesma, superior à alegada pelos AA., e a resultante do rateio das áreas comuns.

Até Abril de 1993, os AA. pagaram o preço da fracção "AG" (nos limites do pela ré alegado), tendo a mesma, a pedido dos AA., passado procuração irrevogável a favor daqueles, que lhes permitia a celebração do negócio, inclusive com consigo mesmo, tendo esses poderes até Novembro de 1996.

Não existe qualquer erro dos AA. quanto ao objecto, que bem conheciam, do contrato celebrado com a ré, além de que o contrato não seria anulável por erro oito anos depois da sua celebração, como não ocorre incumprimento da promessa por parte da ré.

Conclui pela improcedência da acção e absolvição da ré do pedido.

Os AA responderam e concluíram como na petição.

***A final, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e provada e condenou a Ré a pagar aos 1ºs e 2ºs AA., em comum e partes iguais, a quantia de 40.600.000$00 ou o seu equivalente em euros.

***Inconformada recorreu a Ré que, alegando formulou as seguintes conclusões: A. Na audiência de discussão e julgamento e na prova documental junta aos autos, foram provados os factos descritos em 2., supra, cuja apreciação impunha diversa decisão sobre os pontos da matéria de factos impugnada, mas a que o Meritíssimo Juiz "a quo", não conferiu qualquer relevo.

  1. Em face de tais depoimentos e documentos, impunha-se que: - fosse dada uma resposta diferente aos quesitos 6º, 7º, 24º, 25º; - fosse ampliada a base instrutória com vista à: i) caracterização da existência da tampa da caixa de visita à cisterna do imóvel como um verdadeiro ónus, pois que, para que se possa qualificar juridicamente qualquer situação como um "ónus" é necessário que a mesma diminua, restrinja ou impeça, objectivamente, a plena fruição do bem; ii) qualificação do comportamento dos AA. desde a data em que celebraram a promessa até à respectiva resolução e, sobretudo desde a data em que fosse provado que tomaram conhecimento da localização da tampa da caixa no interior da fracção autónoma prometida comprar até à resolução, para aquilatar da perda de interesse, qualificando-a juridicamente, e da eventual existência de abuso de direito por parte dos AA., aquando da operada resolução do contrato.

  2. O contrato-promessa de compra e venda celebrado entre os Recorridos e a Recorrente deverá ser tido como cumprido pela Recorrente na data em que, uma vez pago, na íntegra, o respectivo preço, a Ré emitiu, a favor dos AA. a primeira procuração irrevogável, ou seja, 22 de Abril de 1993, pois foi a solicitação dos Recorridos, por destinarem a fracção a revenda, que a Recorrente não marcou a escritura pública de compra venda para a data contratualmente prevista para o efeito, antes emitindo a mencionada procuração.

    A não realização da escritura no momento contratualmente estabelecido, serviu exclusivamente o interesse destes.

  3. Acresce que os Recorridos estavam em condições de celebrar o negócio, incluindo consigo mesmos, desde a data em que lhes foi passada a primeira das três procurações emitidas a seu favor, data em que se verificou a efectiva tradição do bem da Recorrente para os Recorridos que sempre actuaram como seus únicos donos e legítimos possuidores.

  4. Da matéria provada não resultou a verificação dos requisitos de que dependeria a anulabilidade do negócio com base em erro quanto ao respectivo objecto.

  5. Na parte referente à apreciação da questão relativa ao erro com vista à fundamentação da eventual anulabilidade do negócio, a sentença é completamente omissa quanto à qualificação da caixa de visita como um ónus ou limitação que exceda os limites normais inerentes ao direito transmitido, susceptível de fundamentar a anulação do negócio nos termos do artigo 9050 do Código Civil.

  6. A Recorrente, ao contrário da apreciação efectuada pelo Meritíssimo Juiz "a quo" considera que estava impedida de fixar aos Recorridos um prazo para outorga da escritura, atentos os limites impostos pela boa fé.

  7. A Recorrente sabia que já tinha entregue o bem e recebido, na íntegra, o preço. Sabia que os Recorridos, aquando da celebração da promessa de venda o destinavam a revenda, procurando negociá-lo com terceiros, com plena autonomia e sem lhe prestar contas.

    Sabia que os Recorridos assumiam as despesas inerentes à respectiva propriedade.

    Sabia, finalmente, que os Recorridos actuavam de forma pública e pacífica, como os únicos proprietários da referida fracção autónoma, agindo como se ela fosse sua e sendo reconhecidos, pelos demais condóminos e pelo público em geral como os donos da mesma.

    I. Acresce que a Recorrente não tinha qualquer interesse na realização da escritura pública, porquanto não lhe advinha qualquer prejuízo, despesa ou encargo por a não outorgar nem colheria qualquer beneficio em compelir os Recorridos à realização de um negócio quando, bem sabia, que a vontade negocial destes era a de revender o bem objecto do mesmo e não a de o adquirir para si próprios.

  8. Deste modo, qualquer interpelação admonitória da Recorrente no sentido da realização da escritura violaria, no entendimento desta, os princípios da boa fé, sendo abusiva, ilegítima e manifestamente reprovável.

  9. Na douta sentença refere-se que existência da caixa no interior da fracção autónoma, constitui uma oneração que limita o seu gozo de modo exclusivo e pleno, "(...) quer a necessidade do condomínio de aceder à caixa de visita seja ou não frequente. A limitação existente excede os limites normais do...

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