Acórdão nº 0316410 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Fevereiro de 2005 (caso NULL)
Data | 16 Fevereiro 2005 |
Órgão | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção Criminal (1ª) do Tribunal da Relação do Porto: No Processo n.º ../02 do -º Juízo do Tribunal Judicial da....., o ofendido/lesado Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, por não se conformar com o despacho de 01-10-2003 (cfr. fls. 11 e 12), de indeferimento da sua constituição como assistente, dele interpôs o presente recurso.
A respectiva motivação é rematada com as seguintes, e únicas, conclusões (cfr. fls. 2 a 8) que se transcrevem: «1.
As cotizações dos beneficiários são receitas próprias do sistema da Segurança Social e fonte de financiamento do mesmo (artigo 84, a), D.L. 17/2000, de 8 de Agosto - Lei de Bases do Sistema de Solidariedade e Segurança Social).
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A arrecadação e cobrança das cotizações referidas na conclusão precedente compete, exclusiva e autonomamente, ao Instituto de Gestão Financeira de acordo com o preceituado no artigo 3°, n.° 2 alínea b), do D.L. 260/99, de 7 de Julho (Estatuto do I.G.F.S.S.).
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O I.G.F.S.S. é um Instituto Público dotado de autonomia administrativa e financeira, personalidade jurídica e património próprio - artigo 1° do citado estatuto, tendo, deste modo, um interesse próprio, directo e individualizado no ressarcimento dos prejuízos efectivamente por ele sofridos aquando da não entrega pelos contribuintes das aludidas cotizações nos prazos e termos legais (vide artigo 3º, n.º 2, alínea b), do invocado estatuto), ao contrário do que acontece com a administração fiscal que mais não é do que um serviço simples do Ministério das Finanças, sem personalidade jurídica distinta do Estado, consubstanciada na estrutura da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, sendo esta sim representada pelo Ministério Público a quem cabe defender a legalidade e promoção do interesse público, sendo por aquela via titular do interesse que a lei especialmente quis proteger com a incriminação.
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À data dos factos em causa no processo pendente, o diploma legal que estava em vigor era o RJ.I.F.N.A. (D.L. 20-A/90, de 15 de Janeiro), o qual, no seu artigo 46º, n.º l, previa expressamente a possibilidade de a Administração Fiscal se constituir, querendo, Assistente no processo crime em que fosse ofendido/lesado.
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Na esteira desta orientação legislativa, surgiu o R.G.I.T. (Lei n.º 15/01, de 5 de Junho), o qual, no seu artigo 50°, prevê expressamente a assistência técnica (sem definir os limites da mesma) do Ministério Público pela Segurança Social em todas as fases do processo, inclusive na sua fase Judicial (dizemos nós).
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A referida assistência técnica a prestar pela Segurança Social ao Ministério Público não coarcta a possibilidade de se poder exprimir, também, na sua intervenção como Assistente, nos termos da alínea a), do n º l, do artigo 68º, do C.P.P., aplicável ex vi do artigo 3° do R.G.I.T..
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Não há qualquer incompatibilidade entre estas duas disposições normativas.
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Nesta conformidade, mesmo que academicamente se admitisse que o artigo 50º do R.G.I.T. veio proibir a prerrogativa processual do artigo 46º do R.J.I.N.F.A., o que não se concede, sempre o I.G.F.S.S. teria a possibilidade processual de se constituir Assistente no processo crime em que fosse ofendido/lesado (tal e qual como o caso sub judice) nos termos do artigo 68º, n.º l, alínea a) do C.P.P., porque, em virtude de ser directo e imediatamente ofendido/lesado com a prática deste crime, tem um interesse próprio, imediato e individualizado que o legitima, à face da lei processual em vigor, a usar de tal prerrogativa - O interesse que a lei especialmente quis proteger com a incriminação prevista no artigo 107º, do R.G.I.T. - O bem jurídico protegido é o erário da Segurança Social, independentemente de nestes crimes existir um interesse mediato, ou "de dever" que assume natureza pública.
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Atente-se, ainda, que a norma do artigo 50° do R.G.I.T., ao contrário do que é dito no despacho recorrido, não reveste natureza adjectiva, mas antes substantiva e, por isso, de aplicação que não tem que ser imediata - artigo 5º, n.º do C.P.P. "a contrario senso".
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O Venerando Tribunal ad quem já se pronunciou sobre esta questão no âmbito do recurso nº 2227/03/1ª de 13/05/2003, onde se lê: "...o que a lei nº 15/2001 fez, foi uma coisa muito singela: tirou do seu articulado o que não devia lá estar, pois era óbvio que a Segurança Social, sendo ofendida, quando se trata de crimes contra o seu património (maxime contribuições de trabalhadores), não é preciso preceito nenhum especial para lhe permitir ser assistente no processo: basta o artigo 68º, CPP." IV Nestes Termos e nos melhores de Direito deve o despacho recorrido ser revogado e, em consequência, ser substituído por outro que admita o I.G.F.S.S. a constituir-se Assistente e intervir nos autos nessa qualidade, fazendo-se deste modo inteira JUSTIÇA!» Admitido o recurso a subir em separado e com efeito meramente devolutivo (cfr. fls. 13) e efectuadas as necessárias notificações, apresentou resposta apenas o Mº Pº, na qual conclui (cfr. fls. 14 a 17), conforme se transcreve: «Termos em que, V. Ex., Senhores Desembargadores, revogando o despacho recorrido, farão JUSTIÇA».
Remetidos os autos a esta Relação, nesta instância o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, detalhado (cfr. fls. 175 a 182), defendendo que o recurso merece provimento.
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