Acórdão nº 0336461 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Janeiro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução08 de Janeiro de 2004
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na Secção Cível do tribunal da Relação do Porto 1.

RELATÓRIO: Vasco .............. e Clementina ................, vieram requerer a presente providência cautelar não especificada contra Jerónimo ..............

Pedem: Que o requerido se abstenha de praticar quaisquer actos (em especial de venda de bens) abrangidos pela procuração que a seu favor os requerentes outorgaram e posteriormente revogaram.

Alegam, em síntese que: O requerido se recusa a prestar contas dos negócios que tem celebrado ao abrigo da procuração, sem motivo ou justificação válida, mantendo, assim, os requerentes na ignorância quanto a tais negócios, criando justo receio de dissipação dos bens de que são proprietários, continuando a alienar fracções após a revogação da procuração por parte dos requerentes através de notificação judicial avulsa, continuando após tal facto a não prestar contas.

Foi ouvido o requerido, que apresentou oposição, na qual, em síntese, alegou que: - o pai do requerente e do requerido, Salvador ............, dedicava-se, como empresário em nome individual, à construção de prédios para venda, com contabilidade organizada.

- Aquando do seu falecimento tinha em curso a construção de, pelo menos, um prédio, bem como tinha para venda algumas fracções de outro prédio já construído.

- E, em consequência, passou a competir à cabeça-de-casal, Deolinda .............., mãe do requerente e do requerido, prosseguir a referida actividade, para concluir e vender os imóveis afectos à mesma.

- De forma a acautelar o cumprimento das obrigações resultantes dessa construção, foi acordado, entre todos, que o requerido assumiria o encargo de levar a bom termo as construções e vendas desses imóveis, dadas a idade, a saúde e as inerentes dificuldades da mãe.

- E para tal constituíram-no procurador, nos termos da procuração acima referida.

- Tendo sido ponderado por todos a necessidade de conferir poderes irrevogáveis de modo a evitar que por iniciativa de qualquer um se colocasse em causa as responsabilidades que viessem a ser assumidas pelo requerido no desenvolvimento da actividade.

- Com efeito, era necessário assumir dívidas e encargos com a obra, sujeitos a prazos de cumprimento, bem como realizar dinheiro com a venda dos imóveis, destinado a pagar aqueles compromissos.

- Sendo o requerido a dar a cara por essas obrigações não podia ficar dependente de qualquer revogação da procuração, o que traria inegáveis prejuízos para a sua imagem e para a herança, pelos incumprimentos que poderia gerar.

- Faz parte da herança os imóveis, e a actividade industrial de construção de prédios para venda, da qual os imóveis são também mercadoria, sujeita a contabilidade própria.

- E a declaração fiscal anual relativa ao seu exercício, apresentada pela cabeça-de-casal, é do conhecimento de todos.

- Ficou ainda acordado entre todos os herdeiros que o saldo dessa actividade reverteria para a herança.

- o requerido sempre manteve informada a mãe, como cabeça-de-casal da herança, de que faz parte a actividade de construção de prédios para venda, na qual se inserem os referidos imóveis.

- E os demais interessados, nomeadamente os requerentes, sempre tiveram acesso a toda a informação sobre essa actividade, junto do requerido, quer junto dos responsáveis pela escrita, pela consulta das declarações fiscais anuais.

- No entanto, não está ainda o requerido, nem a cabeça-de-casal, em condições de prestar contas finais, pois um dos prédios está inacabado, faltando remates finais, e há ainda diversas fracções por vender.

- Há também diversas dívidas e responsabilidades por liquidar.

- a revogação da procuração traria prejuízos graves e irreparáveis não só ao requerido, mas sobretudo a todos os herdeiros, já que significaria a suspensão e paralisação da actividade e, em consequência, o incumprimento das obrigações em curso.

- As Contas relativas à actividade industrial de construção de prédios para venda só podem ser concluídas aquando do pagamento de todas as dívidas emergentes dessa actividade e venda de todos os imóveis afectos à mesma.

- Aliás, a prestação de contas parciais relativas às fracções vendidas, seria impossível, já que os custos do imóvel, para além de não estarem ainda determinados, não são por fracção vendida mas sim pela generalidade dos empreendimentos.

- A única coisa possível de se determinar neste momento é o resultado da actividade anual de construtor de prédios para venda, espelhada nas declarações anuais apresentadas fiscalmente.

- Os requerentes podem saber o valor de venda das fracções, já que nunca lhes foi recusado o acesso aos documentos, nomeadamente junto dos responsáveis pela contabilidade.

- Assim como podem saber os custos já suportados na generalidade, mediante a consulta dos respectivos documentos, que nunca lhes foi recusada.

Foi realizada a audiência final, onde foram inquiridas testemunhas tal como consta da acta de fls. 233, vindo a final a ser proferida decisão julgando improcedente a presente providência cautelar.

Inconformados com tal decisão, os requerentes dela interpuseram recurso, recebido como de agravo, tendo, nas suas alegações, formulado as seguintes "CONCLUSÕES: 1. Os Recorrentes não se podem conformar com a douta decisão do Tribunal a quo que julgou improcedente a providência cautelar por si interposta e não ordenou que o Recorrida se abstivesse de praticar quaisquer actos (em especial venda de bens) abrangidos pela procuração a que os Recorrentes outorgaram e, posteriormente, revogaram.

  1. Resultou provado que o Recorrente, através da carta constante de fls. 12, solicitou ao Recorrido "informações sobre a venda dos imóveis constantes da procuração", indicando concreta e especificadamente os elementos que pretendia.

  2. O Recorrido referiu na carta resposta que "ainda faltavam vender 15 fracções e que tinha ficado combinado entre todos que a mãe prestará contas de todas as vendas e dos respectivos custos de construção logo que as fracções estejam todas vendidas", dizendo apenas, quanto ao pedido do Recorrente que "já se efectuaram vendas de algumas fracções" pelo que não forneceu qualquer das informações concretizadas na carta de fls. 12.

  3. A procuração outorgada é a forma de concretizar o exercício do mandato e nos termos do artº 1161 al. d) do CC o mandante é obrigado a prestar contas, findo o mandato ou quando o mandante lhe exigir e, nos termos da ai. b) do mesmo artigo é obrigado a prestar as informações que o mandante lhe peça, relativas ao estado da gestão.

  4. Segundo ensina o Prof. Antunes Varela, o mandante tem de fornecer todas as informações que lhe forem pedidas, além de ter de prestar aquelas cuja necessidade resulta da ai. c) do mesmo artigo e das que lhe são impostas pelo dever geral de diligência a que está sujeito, coisa que o Recorrido não fez.

  5. Na mesma carta o Recorrido acrescenta que as contas de uma procuração a si outorgada serão prestadas por outrem, numa clara e inequívoca demonstração da sua vontade de não fornecer os elementos pedidos! 6. Não tem acolhimento a tese de que pelo facto de se ter considerado provado que os Recorrentes têm acesso aos elementos da contabilidade ou documentos, têm acesso a todos os elementos requeridos, quando é certo e sabido que os elementos da contabilidade por si só não são esclarecedores e desta não constam todos os elementos necessários ao solicitado pelo Recorrente.

  6. Desta carta, só de pode tirar a ilação de que o Recorrido não pretende prestar informações sob o estado da gestão, tanto mais que durante toda a pendência destes autos, nomeadamente na resposta, não apresentou qualquer dos elementos pedidos.

  7. Por tudo isto os Recorrentes tinham e têm justa causa para revogar a procuração outorgada, dado que o Recorrido os mantêm na mais completa ignorância de todos os actos de gestão praticados.

  8. Como escreve Baptista Machado in "Pressupostos da resolução por incumprimento" deve entender-se por justa causa qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual, e segundo a boa fé, não seja exigível a urna das partes a continuação da relação.

  9. A lei não estabelece nenhuma medida especial quanto à forma de revogação, pelo que o mandato pode ser revogado por qualquer das formas de declaração negocial admitidas, podendo ser efectuada por notificação judicial avulsa, conforme o foi no...

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