Acórdão nº 0414174 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Janeiro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelBORGES MARTINS
Data da Resolução19 de Janeiro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal da Relação: Nos Autos de Instrução n.º 35/01.6 da Comarca de Castelo de Paiva foram proferidos vários despachos dos quais foram interpostos recursos , que se passam a analisar.

I - Recurso do Arguido B.....: competência territorial.

Este arguido recorreu do despacho do JIC (fls. 20 257-20 270) , que julgou competente o Tribunal Judicial da Comarca de Castelo de Paiva para conhecer das infracções pelas quais os arguidos vêm acusados, em detrimento do Tribunal Judicial de Almada.

Foi admitido tal recurso a subir com o que viesse a ser interposto da decisão que pusesse termo à causa- art.º 407.º, n.º 3 do CPP - fls. 20 600.

Nos termos do disposto no art.º 412.º, n.º 5 do CPP, "havendo recursos retidos, o recorrente especifica obrigatoriamente, nas conclusões, quais os que mantêm interesse".

Na sua resposta à motivação, o recorrente não manifestou qualquer interesse na apreciação deste recurso, apenas reiterando a sua concordância com o despacho de arquivamento dos autos.

Foi alertado para o não cumprimento do ónus de especificação obrigatório no parecer emitido Pelo Exmo PGA ao abrigo do disposto no art. 417.º, n.º 1 do CPP.

Teve oportunidade de tomar posição quanto a esta questão, pois foi notificado ao abrigo do disposto no art.º 417.º, n.º 2 do CPP para responder a tal parecer.

Nada veio dizer.

Assim, face ao disposto na invocada norma legal, julga-se procedente a pretensão enunciada pelo Exmo PGA no sentido de reconhecer desistência implícita deste recurso, não se conhecendo do mesmo.

II - Recurso do arguido B.....: inquirição de testemunhas sem a presença dos sujeitos processuais.

Recorreu também este arguido do despacho do JIC que determinou que a inquirição das testemunhas passaria a fazer-se sem que fosse permitida a presença do M.º P.º, dos mandatários dos arguidos e dos assistentes (fls. 20 601).

A este recurso é aplicável o enunciado inserido a propósito do anterior, não se conhecendo também do mesmo e julgando-se prejudicado o conhecimento da sua tempestividade.

III - Recurso do arguido C.....: inquirição de testemunhas sem a presença dos sujeitos processuais.

  1. a tempestividade.

    Entende o Exmo PGA junto deste Tribunal da Relação que este recurso não é de conhecer, por extemporâneo, pois, tendo sido o recorrente notificado do despacho de fls. 20 601, proferido em 12.5.03, nesta mesma data- por via telefónica, só veio a interpor recurso em 3.6.03, para além dos 15 dias previstos no art.º 411.º, n.º 1 do CPP, acrescidos dos 3 dias úteis a que se reporta o art.º 145.º, ns. 5 e 6 do CPC.

    Notificado nos termos do disposto no art.º 417.º, n.º 2 do CPP, veio este arguido dizer que a interposição do recurso foi tempestiva, pois o contacto telefónico não obedeceu a todos os requisitos legais previstos no art.º 113.º do CPP.

    Assim, desde já não se pode agora considerar consistente a posição daquele parecer no sentido de também considerar ocorrer desistência quanto a este recurso, já que ao tomar posição em favor do mesmo o recorrente implicitamente manifesta interesse no mesmo.

    E na verdade afigura-se-nos que tem razão, pois que a cota de fls. 20 603 apenas regista que foi dado conhecimento do despacho que antecede aos mandatários das partes, tendo em vista deslocações desnecessárias ao Tribunal.

    Ora o art.º 113.º, n.º 7, al. b), refere que valem como notificações, as comunicações por via telefónica se no telefonema se avisar o notificando de que a comunicação vale como notificação e ao telefonema se seguir confirmação telegráfica, por telex ou telecópia.

    Dos autos não se retira que estas formalidades tenham sido cumpridas, pelo que terá de se considerar relevante apenas a notificação ao mandatário do recorrente, através de carta expedida em 14.5.03 e constante de fls. 20 615.

    E sendo assim manifestamente é tempestivo o requerimento de interposição datado de 3.6.03.

  2. o mérito do despacho.

    Entende também o recorrente que o despacho recorrido tem por base uma interpretação do disposto nas alíneas a) e f) do artigo 61.º, n.º 1 e dos artigos 289.º e 290.º, ambos do CPP, que viola o direito de defesa do arguido consignado no n.º 1 do artigo 32.º da CRP.

    Respondeu o M.º P.º junto da 1.ª instância, considerando que o despacho recorrido deverá ser mantido e, em síntese, que: - tendo a instrução sido requerida também pelo assistente, o processo continua em segredo de justiça; - na instrução apenas o debate instrutório e as declarações para memória futura estão sujeitos ao contraditório; - como os actos de inquirição de testemunhas não estão sujeitos ao princípio do contraditório, os arguidos ou os seus defensores não têm o direito de estar presentes à inquirição de testemunhas por si indicadas; - tal interpretação não viola os direitos de defesa dos arguidos, designadamente o disposto no art. 61.º, n.º 1, als. a) e f) do CPP, nem contraria o art.º 32.º da CRP.

    O Exmo PGA perfilhou esta posição no seu parecer.

    Cumpre decidir.

    Foi o seguinte o teor do despacho recorrido: A fls. 20403 e ss foi proferido despacho no sentido de autorizar a presença dos advogados dos arguidos, assistentes e MP a certos actos de instrução, a saber inquirições de testemunhas, atendendo à complexidade dos autos e tendo em vista o conhecimento imediato por parte dos sujeitos processuais dos actos processuais realizados, procurando, assim, facilitar o exercício das suas funções e respectivo mandato.

    Constata-se, porém, que a presença dos mandatários das partes não se mostra viável ao bom andamento do processo, na medida em que a sua presença torna as diligências de instrução, designada mente inquirição das testemunhas, em diligências demasiado morosas, dadas as constantes interrupções dos advogados intervenientes, apesar de se lhes mostrar vedada tal intervenção, o que não se compadece com a complexidade dos autos que se invocou no nosso anterior despacho.

    Tal conclusão se retira da anterior inquirição de testemunhas ocorrida no passado dia 8 de Maio de 2003, na medida em que se pode constatar que, das seis testemunhas notificadas para comparecer neste tribunal para a respectiva inquirição, apenas foi possível inquirir duas delas.

    Assim sendo, decide-se, a partir desta data, não permitir a presença, quer dos mandatários das partes, quer do MP, às inquirições das testemunhas indicadas.

    Notifique, pela via mais expedita, tendo em vista evitar a sua deslocação desnecessária a este tribunal.

    Sobre esta questão pronunciaram-se os Acórdãos do Tribunal Constitucional (59/91 e 372/2000) que decidiram: "não julgar inconstitucional a norma constante do n.º 2 do art.º 289.º do CPP, na interpretação segundo a qual as diligências de instrução prévias ao debate instrutório, nomeadamente os depoimentos das testemunhas, são realizadas sem a notificação e presença do mandatário do assistente, do arguido ou do seu defensor".

    O art.º 289.º, n.º 1 do CPP impõe a obrigatoriedade de um debate instrutório, oral e contraditório, no qual podem participar o M.º P.º, o arguido, o defensor, o assistente e o seu advogado".

    O n.º 2 desta norma dispõe: Fora do caso previsto no n.º anterior, o M.º P.º, o arguido, o defensor, o assistente e o seu advogado apenas podem participar nos casos em que tenham o direito de intervir, nos termos expressamente previstos neste Código".

    Sobre esta solução pronunciou-se muito recentemente o Acórdão deste Tribunal da Relação e mesma Secção, proc. n.º4817/04 nestes termos: Assim, para que o defensor do arguido pudesse participar na inquirição das testemunhas por si arroladas, antes do debate instrutório, era necessário que tal decorresse expressamente da lei. Na verdade, e fora dos casos expressamente previstos na lei, a "instrução" é ainda uma fase secreta do processo (art. 86°, 1 do Cód. Proc. Penal). Ou seja, nesta fase do processo, o defensor só participa "os actos em que tenha o direito de intervir, nos termos expressamente previstos no Código": interrogatório do arguido (art. 61°, 1, al. e); debate instrutório (art. 298°, 300°, 301°, 3 e 302) e declarações para memória futura (art. 294°) - cfr. GERMANO MARQUES DA SlLVA, Curso de Processo Penal, lII, pág. 160.

    Não existindo qualquer disposição legal expressa, no sentido de conferir ao advogado do arguido o direito de participar/assistir à inquirição das testemunhas por si arroladas, em fase anterior ao debate instrutório, os despachos que designaram dia para essa inquirição, sem a presença do defensor do arguido, não violam o art. 289°, 2 do Cód. Proc. Penal.

    Este entendimento também não viola o disposto no art. 32° da Constituição, designadamente o princípio do contraditório, como de resto tem sido jurisprudência desta Relação e do Tribunal Constitucional - cfr. Acórdãos 59/2000, proc. 407/000, de 13 de Fevereiro. A questão foi devidamente ponderada no Acórdão desta Relação, de 28-11-2001, processo 0141048, em termos com os quais concordamos inteiramente e, por isso, transcrevemos: "(....) Acerca do conteúdo essencial do princípio do contraditório, escreveu- se logo no parecer da Comissão Constitucional n° 18/81 (Pareceres da Comissão Constitucional, 17° vol., pp. 14 e segs.) e, mais tarde, em vários acórdãos deste Tribunal (cfr.i, designadamente, os Acórdãos nos.../.. e .../..., in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 10.º vol., pp. 502 e 503, 22° vol., pp. 350 e 351, respectivamente) que ele está, "em que nenhuma prova deve ser aceite na audiência, nem nenhuma decisão (mesmo interlocutória) deve ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar". Já sobre a extensão processual do princípio do contraditório dispõe o nº 5 do artigo 32.º da Constituição que a ele está subordinada a audiência de julgamento, bem como os actos instrutórios que a lei determinar. A Constituição remete assim para a lei ordinária a tarefa de concretização dos actos instrutórios que hão-de ficar subordinados ao...

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