Acórdão nº 0420989 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Março de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | FERNANDO SAMÕES |
Data da Resolução | 19 de Março de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório N....., SA, com sede na Rua....., ..... instaurou nos Juízos Cíveis da Comarca do....., onde foi distribuída ao -º Juízo, -ª Secção, acção declarativa com processo sumário, contra X....., comerciante, com domicílio profissional na Rua....., ....., pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 10.094,59, acrescida de juros de mora vencidos no montante de € 2.621,82 e dos vincendos até integral pagamento.
Para tanto, alegou, em resumo, que celebrou dois contratos com a ré e que esta deixou de cumpri-los, pelo que os resolveu por carta de 6/11/2000, exigindo o pagamento da cláusula penal acordada e do valor do equipamento colocado à sua disposição, bem como a restituição da correspondente comparticipação publicitária que lhe havia sido entregue.
Regularmente citada, a ré não contestou.
Por sentença de 23/5/2003, a acção foi julgada parcialmente procedente condenando a ré a pagar à autora a quantia de € 3.417,59, acrescida de juros de mora, à taxa de 12%, desde a data da interpelação até efectivo pagamento.
Inconformada com o assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação para este Tribunal e apresentou, oportunamente, a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. Para que o tribunal possa ajuizar sobre o excesso da cláusula penal é necessário que o devedor solicite a sua redução.
-
A razão de ser da redução da cláusula penal consiste em evitar abusos do credor, surpreendendo-se aqui a mesma lógica e os mesmos pressupostos que determinam a anulabilidade dos negócios usurários - cfr. art.º 282º do CC.
-
A recorrida não solicitou a redução da cláusula penal, pelo que não podia o Sr. Juiz "a quo" levá-la a efeito oficiosamente, ao abrigo do art.º 812º do CC.
-
Mesmo que assim não fosse, para a intervenção do tribunal é necessária a presença de uma cláusula penal manifestamente excessiva, não bastando um simples excesso, sendo sobre o devedor que pretende a redução que recai o ónus da alegação e prova do excesso manifesto.
-
Ora, a recorrida foi citada e não contestou, inexistindo elementos factuais reveladores de qualquer desproporção entre o dano da recorrente e a pena estipulada.
-
Sendo certo que, para que se possa aferir do excesso manifesto da cláusula penal, é antes de mais indispensável conhecer o dano efectivo do lesado.
-
No caso dos autos, desconhece-se o valor dos danos da recorrente, o que impossibilita a tarefa concretizadora de apreciação da cláusula penal.
-
A redução da cláusula penal operada pode conduzir à fixação de uma indemnização de montante inferior ao dos prejuízos efectivos da recorrente, contrariamente ao que resulta dos mais elementares princípios da responsabilidade civil.
-
O Tribunal "a quo" socorreu-se indevidamente de factos estranhos aos autos que não foram alegados, nem resultaram provados - preço do quilo do café, valor económico do acordo, concordância da recorrente com o incumprimento da recorrida, conhecimento de que seriam necessários 25 anos para atingir o consumo contratado - para lançar o juízo de excessividade sobre a cláusula penal em questão.
-
Mesmo que assim não fosse, tal factualidade, introduzida nos autos pelo Sr. Juiz "a quo", não seria por si só suficiente para concluir pela excessividade da cláusula penal, face à total ausência de factos que permitam aferir do prejuízo efectivo da recorrente.
-
Não se verifica, pois, nenhum dos pressupostos de que o art.º 812º do CC faz depender a redução equitativa da cláusula penal.
-
Assim como, da matéria provada não resulta ser aplicável o DL 446/85, nem tão pouco ficou provado que a cláusula penal em análise passasse despercebida ou pudesse constituir uma surpresa.
-
A douta sentença proferida violou os art.ºs 4º, 405º, 810º e 812º do Código Civil e art.º 659º, n.º3 do CPC.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Sabido que o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da recorrente (cfr. art.ºs 684º, n.º 3 e 690º, n.º 1, ambos do CPC), a única questão a decidir consiste em saber se o Tribunal recorrido podia ou não proceder à redução da cláusula penal.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
-
Fundamentação 1. De facto.
Na sentença recorrida foram dados como provados, por...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO