Acórdão nº 0430093 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Abril de 2004 (caso NULL)
Data | 22 Abril 2004 |
Órgão | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.
A.......... e marido B........... vieram intentar a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, contra C............. & ......., S.A..
Pediram que a Ré seja condenada a pagar-lhes a quantia de €38.716,09, acrescida de juros de mora, bem como as quantias que se vierem a liquidar em execução de sentença em relação a custos de financiamento, danos patrimoniais e não patrimoniais.
Como fundamento, alegaram, em síntese, que a Ré lhes vendeu duas fracções autónomas (habitação e garagem) do prédio urbano identificado nos autos, sem os informar que sobre esse prédio incidia uma servidão administrativa a favor do Município do Porto, numa área de 1.200 m2, para construção, no prazo de 10 anos, de um viaduto sobre-elevado, não se tendo apercebido da cláusula a este respeito inserida na escritura pública através da qual adquiriram, sendo certo que tal servidão e viaduto lhes causam imensos incómodos e danos, que elencam; tal atitude da Ré foi intencional e reveladora de má-fé. Terminam, optando pela redução de preço do negócio, na medida da desvalorização imposta pela servidão, pretendendo a restituição da respectiva quantia.
A Ré contestou afirmando que a servidão em causa foi do conhecimento dos autores, constando até expressamente da escritura pública que formalizou o negócio, e, antes desta, do respectivo registo predial, impugnando os factos alegados para a aludida má-fé, entendendo não ser aceitável que os autores digam que não perceberam o teor da cláusula a esse respeito inserida na escritura, atendendo às respectivas formações e habilitações, bem como aos valores envolvidos, que demandariam especiais cuidados e precauções.
Concluiu pela improcedência da acção.
Os autores replicaram.
No saneador, por entender que o estado dos autos o permitia, o Sr. Juiz passou a conhecer de mérito, vindo a julgar a acção improcedente.
Discordando desta decisão, dela interpuseram recurso os Autores, de apelação, tendo apresentado as seguintes Conclusões: 1. Para elaborar a douta sentença ora recorrida, o Senhor Juiz seleccionou a esmo factos da petição, sem atender a grande parte dos que ali alegados são importantes para a boa decisão, nomeadamente toda a matéria de facto que foi alegada quanto ao que no decurso das negociações conduziu a um contrato promessa, como se este não tivesse existido e que nele não havia referência a nada da servidão; 2. E nada ali se refere também no que tange à alegação pelos autores de que a outra parte, a promitente vendedora, depois vendedora, e ora apelada, escondeu dolosamente dos apelados durante esse processo negocial toda e qualquer informação sobre a futura existência do ónus que desde sempre soube que a Câmara Municipal impunha como condição para licenciar a obra do empreendimento em que se inserem as fracções objecto desses contratos adquiridas pelos apelantes; 3. O negócio jurídico em questão nos autos - e toda a problemática inerente à sua formação e conclusão - não começou nem acabou, como se vê de toda a matéria de facto referida, na celebração da escritura de compra e venda, contrariamente ao que na sentença se afirma e pretende redutoramente.
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A formação da vontade dos ora apelantes, a eclosão do erro em que clamam ter sido induzidos e o papel da apelada nessa indução, bem como o apuramento da vontade realmente formada pelos apelantes são elementos de facto essenciais para a boa decisão da presente acção; 5. Na douta sentença recorrida afirma-se claramente que a matéria considerada provada se baseou apenas na escritura de compra e venda de fls. 60 e ss., ignorando-se em absoluto o contrato de promessa de compra e venda de fls. 40 e ss., integrado pelos seus anexos, e o contrato de cessão de posição contratual de fls. 54/55, àquele respeitante, dois elementos probatórios fundamentais juntos pelos apelantes e aceites pela apelada - que não os pôs em causa, violando-se assim o disposto no art. 659º nº 3 CPC; 6. Se não se tivesse postergado toda a matéria de facto alegada pelos ora apelantes que vem de invocar-se, nomeadamente o contrato promessa de compra e venda (e o da sua sequente cessão posicional), ter-se-ia de apurar que bem foi prometido comprar e vender, quais as suas características, quais os seus ónus, e isso não se fez na sentença; 7. Quando a lei fala, e também o Senhor Juiz ao invocá-la, em ónus ou limitações anormais, tem de atender-se a que aquilo que os apelantes contrataram e prometeram comprar, e a apelada com eles contratou e lhes prometeu vender, foi um bem sem quaisquer ónus ou encargos, nomeadamente a dita servidão administrativa; 8. E no caso, o direito a esse bem, objecto do negócio, não se encontrava, quando negociado entre as partes, onerado com qualquer ónus ou limitação - fosse normal ou anormal; 9. A apelada prometeu vender ao promitente comprador, que posteriormente cedeu essa sua posição contratual de promitente adquirente aos apelados, as duas fracções a constituir em regime de propriedade horizontal, situadas e integrantes do prédio descrito no art. 1º da p.i., sem nele se referir que tal prédio estava, ou sequer viria a estar, onerado por algum tipo de ónus, nomeadamente aquele que a apelada sobre ele veio a constituir em favor da Câmara Municipal do Porto posteriormente a esse contrato; 10. Essa servidão constituída a favor de terceiro, não sendo uma servidão legal, é pois um ónus, uma limitação que excede os limites normais inerentes ao direito transmitido ou qualquer outro de tipo semelhante - um direito sem quaisquer ónus, um direito pleno e absoluto - livre de quaisquer ónus, ainda que anormais, como se prevê expressamente no invocado art. 905º do CC; 11. E os apelantes alegaram abundantemente que a apelada...
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