Acórdão nº 0436435 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Janeiro de 2005 (caso NULL)

Data06 Janeiro 2005
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. B..... e C..... instauraram acção declarativa com processo sumário contra os réus D..... e mulher E..... alegando que, em Abril de 2001, contrataram com o R. marido a reconstrução de um muro, em pedra, para suporte de terras, no logradouro do seu prédio urbano, do lado que confronta com o caminho público, comprometendo-se o R. a reconstruir o muro, com o comprimento de 13/14 metros, fornecendo toda a pedra e materiais necessários para a construção do mesmo, bem como a mão-de-obra, sendo ajustado, como contrapartida, o preço de 800 000$00/ € 3.990,38.

Afirma que o muro construído pelo R. começou a ceder, apresentando uma "barriga" e ameaçando ruir, tendo o A. marido recebido uma missiva da Junta de Freguesia de..... (.....) para arranjar o muro que ameaçava desabar.

Os AA notificaram o R. para proceder à reparação do muro, em 10 dias, ou informar a data em daria início à reparação sob pena de indemnizar os AA, tendo este assumido a responsabilidade pela reparação e que, até meados de Agosto de 2002, o muro estaria devidamente reparado, o que jamais sucedeu e mais afirmando mesmo o R. que o conserto do muro ficava muito caro e não tinha possibilidades para o fazer.

Como o muro ameaçava ruir com perigo para as pessoas que passassem pelo caminho público e dada a recusa do R. na reparação do muro, tiveram os AA de contratar um industrial de pedreiro para proceder à reconstrução e reparação do muro, ao qual tiveram de pagar € 4 500,00.

O R. exerce a actividade industrial de pedreiro e é com os proventos dessa actividade que o casal dos RR faz face às despesas com vestuário, alimentação, lazer e outras.

Em conclusão, pedem a condenação dos RR a pagarem-lhe a quantia de € 4.500,00, acrescidos de juros de mora, à taxa de 4%, contados desde a citação.

Em contestação, os RR. afirmam que advertiram os AA para a necessidade de desviar as águas, uma vez que se trata de muro de suporte de terras, para que as mesmas não provocassem pressão e encharcassem contra o muro, e estes nada fizeram, pelo que os defeitos que existam não são imputáveis ao R. que construiu o muro de acordo com todas a normas de segurança.

Os AA aceitaram a obra sem reservas ou reclamação e nunca o muro ameaçou desmoronar-se ou apresentava perigo para as pessoas que por ali passavam, nenhuma urgência havendo na realização das obras, pelo que não tinham os AA direito a eliminar os defeitos à custa do empreiteiro.

Concluem pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

Os AA replicaram, concluindo como na inicial II. Elaborada a base instrutória, não reclamada, procedeu-se à realização da audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, julgando a acção totalmente procedente e condenando os RR a pagarem aos AA a quantia de 4.500,00 euros, acrescida de juros à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

  1. Inconformados com esta decisão, dela interpuseram recurso os RR, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: "I) A) Por força dos artigos 712º nº 1 a) e 690-A do CPC, deve o presente recurso ser aceite e julgado procedente.

    1. Atenta a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento deverá a decisão do tribunal "a quo", sobre a matéria de facto ser alterada e considerar-se que não ficou provado que: 1) O muro estava a ceder e ameaçava ruir (artigo 4º da base instrutória) 2) Pondo, em perigo a vida das pessoas que passavam no caminho público referido (artigo 5º da base instrutória) 3) O que tudo era provocado por deficiências na dita reconstrução (artigo 6º da base instrutória).

      4) O réu após haver recebido a notificação aludida em D), disse aos AA., que repararia o muro até meados de Agosto de 2002 (artigo 8º da base instrutóri

      1. C) Não ficou provado que o muro estivesse em perigo ou ameaçasse ruir.

    2. Não ficou provado que as deficiências fossem provocadas por defeito de construção.

    3. Não ficou provado que alguma vez o réu tenha dito aos AA. que repararia o muro.

    4. Pelo que, não podiam os recorridos, sem prévia condenação judicial, exigir dos recorrentes a quantia que pagaram a um terceiro para reparar defeitos.

    5. Deve considerar-se que ficou provado: 1) Que o recorrente advertiu os AA. para a necessidade de desviarem as águas do muro (artigo 13º da base instrutória).

      2) O que os recorridos não fizeram (artigo 14º da base instrutória).

      3) E provocou a saliência mencionada em C), (artigo 15º da base instrutória).

    6. Não podem os recorrentes ser condenados por defeito de construção quando os recorridos não realizaram tarefa essencial, para que o muro se mantivesse estável, ou seja, não desviaram as águas que enxurravam para o muro e que o iam minando.

      II) I) De acordo com a lei, doutrina e jurisprudência, o dono da obra não pode substituir-se, por si ou por intermédio de outrem, ao empreiteiro, sem percorrer o "iter procedimental" previsto nos artigos 1220º e 1221 do código civil.

    7. Mesmo que estivéssemos perante uma situação de urgência, o que só por mera hipótese se está a admitir, tal não era permitido, pois os artigos 1221º e seguintes do código civil, já prevêem essas situações.

    8. Por outro lado, existem mecanismos legais, que servem exactamente para fazer face a situações ditas urgentes, sendo as decisões proferidas de forma célere e eficaz e mesmo sem a realização do principio do contraditório.

    9. Deve ainda ser apreciada a deficiência da gravação da prova, uma vez que existem depoimentos com partes completamente inaudíveis, impossibilitando uma correcta avaliação dos mesmos.

      Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deve dar-se provimento ao presente recurso, ordenando-se a subida imediata dos autos ao Venerando Tribunal Da Relação do Porto." Os AA. contra-alegaram, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

      Colhidos os legais vistos, cumpre decidir.

  2. Tendo em consideração que o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações, não podendo o tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se trate de questões do conhecimento oficioso (arts. 684º, nº 3, e 690º, nºs 1 e 3, do C.P.C.) e que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu objecto delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, são as seguintes as questões a resolver: A) deficiência na gravação da prova.

    1. reapreciação da matéria de facto quanto às questões 4ª, 5ª, 6ª, 8ª , 13ª, 14ª e 15ª da base instrutória; C) se os AA podem exigir dos RR a quantia que pagaram a terceiro para reparar os defeitos da obra, mesmo que se estivesse numa situação de urgência.

  3. São os seguintes os factos que vêm considerados provados na sentença recorrida: a) O R exerce a actividade industrial de pedreiro, donde retira proventos com os quais o respectivo casal faz face às necessidades de alimentação, vestuário e lazer, não vigorando entre os cônjuges o regime de separação de bens.(E) b) Os AA. em Abril de 2001, acordaram verbalmente com o R. no sentido de este, pelo preço de € 3.990,38 - o qual englobava a pedra, os materiais necessários e a mão-de-obra -, proceder à reconstrução de um muro em pedra para suporte de terras no logradouro do seu prédio urbano, composto de casa de rés-do-chão e andar, com logradouro, do lado que confronta com o caminho público, prédio esse situado no lugar da....., freguesia de..... (.....), em....., descrito n Conservatória do Registo Predial sob o no 01163/020919 e inscrito na matriz artº 833º.(A) c) O R. procedeu à reconstrução a que se aludiu em b), havendo os AA entregue àquele a contrapartida ali indicada.(B) d) O muro que o R. se comprometeu a reconstruir tem um comprimento de doze metros, cinco metros e vinte e oito centímetros de altura na extremidade poente e quatro metros e vinte e cinco centímetros de altura na extremidade nascente.(1) e) A reconstrução a que se aludiu em b) foi efectuada pelo R. durante o mês de Junho de 2001.(2) f) O muro descrito em b) apresenta uma saliência (C).

    1. Após a reconstrução mencionada em b), o muro apresentava fendas e deslocação de pedras, pelo que estava a ceder e ameaçava ruir, pondo, por via disso, em perigo a vida das pessoas que passavam no caminho público referido em b), o que tudo era provocado por deficiências na dita reconstrução.(3,4,5,6) h) Na decorrência do descrito em g), F..... cunhado dos AA, recebeu uma carta enviada pela Junta de Freguesia de..... (.....) e endereçada ao A., no sentido de o muro ser reparado.(7) i) Os AA dirigiram aos RR. a notificação judicial avulsa cuja cópia consta de tis. 9 a 11 dos presentes autos.(D) j) O R. após haver recebido a notificação aludida em i), disse aos AA que repararia o muro até meados de Agosto de 2002, o que não chegou a suceder.(8,9) k) Atento o referido em J) os AA acordaram com um industrial de pedreiro no sentido de este proceder à eliminação das referidas deficiências...

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