Acórdão nº 0437299 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Janeiro de 2005

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução27 de Janeiro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto 1. RELATÓRIO: B......... e C..........

deduziram embargos à execução para pagamento de quantia certa, com processo ordinário, que o Banco X.........., S A lhes instaurou, sob o nº ...../03, a correr termos pelo .. Juízo, .. Secção do Tribunal Judicial da Comarca do .......... .

A execução teve por base uma livrança que os embargantes/executados haviam entregue em branco ao Banco/exequente, subscrita por aqueles, e que servia de garantia do cumprimento de um contrato de empréstimo no montante de 2.099.780$00, celebrado entre executados e exequente em 24.10.1998, conforme documento junto a fls. 7 e verso [O aludido pedido de empréstimo foi aprovado de acordo com as Condições Particulares referidas a fls. 7-aceites pelos embargentes--, constando de entre elas, a seguinte: "Garantia: para garantia e segurança do cumprimento das responsabilidades ora assumidas o(s) beneficiário(s)- e cônjuges e avalistas- subscrevem uma livrança em branco, declarando desde já, e por esta via, autorizar o seu preenchimento pelo Banco se e quando este considerar oportuno, pelo montante que compreenderá o saldo da dívida, comissões, juros remuneratórios e de mora.

Todos os intervenientes dão o seu assentimento à entrega desta livrança, nos termos e condições em que a mesma é feita, elo que assinam, conjuntamente com o(s) Beneficiário(s), esta autorização"]-conferindo, por esta via, os embargantes ao embargado poderes para o preenchimento da livrança, na eventualidade de incumprimento do referido contrato de empréstimo.

Dada a falta de pagamento das obrigações emergentes do aludido contrato, o Banco/embargado solicitou aos embargantes o pagamento da totalidade do valor do contrato, de acordo com as respectivas cláusulas contratuais, tendo, ao abrigo do clausulado contratual, efectuado o Preenchimento da Livrança de Caução referida supra, dada à execução, com o montante de 12.318.63 Euros, valor este que se refere ao capital em dívida e juros vencidos (doc. de fls. 8).

Alegam os embargantes, em síntese: que o título executivo é nulo por ausência de fixação do respectivo objecto (o objecto é indeterminado); que o Banco/embargado preencheu a livrança de forma abusiva, carecendo de legitimidade para o efeito; que a atitude do Banco/embargado traduz "um abuso de direito e um atropelo à boa fé dos subscritores do título que o fizeram depositário da sua confiança".

Concluem pedindo a procedência dos embargos, com a sua absolvição do pedido executivo.

Conclusos os autos, foram logo rejeitados os embargos, com fundamento, por um lado, no facto de na petição de embargos não terem sido invocados factos concretos susceptíveis de modificar, impedir ou extinguir o direito do embargado, e, por outro lado, no facto de resultar dos autos que a livrança foi preenchido em conformidade com o contrato de preenchimento, pelo que não existe qualquer preenchimento abusivo (cfr. despacho de fls. 16).

Inconformados com este despacho, vieram os embargantes interpor recurso (de agravo), apresentando as pertinentes alegações que rematam com as seguintes "CONCLUSÕES: 1-No momento de constituição da obrigação cambiária, não é possível determinar o seu objecto, uma vez que este terá que decorrer da aplicação directa de parâmetros claramente estipulados entre as partes, à semelhança do que se exige para as obrigações genéricas em geral (Cód. Civil, art. 539.º e segs.).

2- Primam, pela ausência, quaisquer resquícios de indicações aptas a permitir, aquando da celebração do pactuado, a quem quer que seja, apurar o conteúdo do negócio, em franca violação do artigo 280.º do Código Civil, considerando-se o mesmo nulo.

3- O Banco recorrido/ embargado carecia em absoluto de legitimidade para o preenchimento da livrança que tinha na sua posse da forma autónoma e arbitrária como o fez.

4- O Banco recorrido/embargado preencheu o título dado à execução sem consentimento dos subscritores, apondo-lhe unilateralmente um montante, sem para tanto os ouvir e fixou-lhe despoticamente uma data, sem os consultar.

5- Esta atitude do embargado consubstancia um caso de abuso de direito boa fé dos subscritores do título que o fizeram depositário da sua confiança.

6- O princípio da literalidade deste título acaba por ceder diante da absoluta falta de vontade dos embargantes.

Nestes termos, e nos demais de direito, que V. Exa doutamente suprirá, deverás o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, serem os embargantes absolvidos do pedido executivo." Não foram apresentadas contra-alegações.

Foram colhidos os vistos.

Cumpre decidir.

  1. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. AS QUESTÕES: Tendo presente que: --O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil); -- Nos recursos se apreciam questões e não razões; -- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões suscitadas no agravo são as seguintes: - Nulidade do título executivo (livrança), por indeterminabilidade do seu objecto; - Falta de legitimidade do Banco/embargado para preencher a livrança; Preenchimento abusivo da livrança e abuso de direito por banda do Banco/embargado.

  2. 2. A materialidade a ter em conta para conhecimento do recurso consta (no essencial) já do relatório supra, pelo que nos dispensamos de a repetir.

  3. O DIREITO Vejamos, então, do mérito do recurso.

* Primeira questão: Da "nulidade do título" executivo (livrança), por indeterminabilidade do seu objecto: Como ressalta dos factos provados, o título dado à execução foi uma livrança que-- entregue pelos embargantes ao embargado em branco como garantia do cumprimento do contrato de empréstimo entre ambos celebrado-o Banco/embargado preenchera em conformidade com o clausulado nas "Condições Particulares" a que ficou sujeita a concessão desse empréstimo (cfr. fls. 7).

Relativamente à livrança em branco-figura perturbadora, é certo, mas cuja possibilidade de emissão resulta do disposto nos arts. 77º, II e 10º da LULL (Lei Uniforme sobre Letras e Livranças) --, dir-se-á o seguinte: Trata-se de título que só fica completado nos seu elementos constitutivos de livrança, apta a desempenhar a função que a lei lhe confere, após nela serem inscritos todos os elementos essenciais enumerados no artº 1º LULL sobre o instrumentum que lhes serve de suporte mecânico.

O que acontece-e aconteceu no caso presente- é os sujeitos (originários) da livrança-no caso, os embargantes e o Banco embargado-não quererem estabelecer de imediato uma obrigação cambiária, antes apenas criarem os elementos indispensáveis à emissão futura da uma...

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