Acórdão nº 0456575 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Dezembro de 2004
Magistrado Responsável | SOUSA LAMEIRA |
Data da Resolução | 20 de Dezembro de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto I - RELATÓRIO 1- No Tribunal Judicial da Comarca do .........., por apenso à execução com processo ordinário para pagamento de quantia certa que B.........., SA move a C.......... e D.......... veio esta deduzir os presentes embargos de executado alegando, resumidamente: A livrança dada à execução, por si subscrita, destinou-se a garantir o cumprimento de um contrato de financiamento celebrado com a Exequente, que teve por objecto a quantia de PTE: 950.000$00, tendo como propósito a aquisição a um terceiro de um veículo automóvel usado, tendo-se comprometido a restituir em prestações a referida quantia mutuada; a legalização do veículo ficou a cargo da Exequente, tendo sido também constituída reserva de propriedade a favor daquela; apesar das diversas insistências de ambos os executados, quer junto da empresa vendedora, quer junto da Exequente, nunca receberam o registo de propriedade, tendo vindo a apurar, através de contacto com a Exequente, que o veículo tinha sido objecto de apreensão judicial; após algumas averiguações, obteve informação de que o registo de propriedade entregue pela firma vendedora à Exequente era um documento falso, constando nele como proprietário quem efectivamente não assumia tal qualidade; no dia 21 de Fevereiro de 1998, pelas 23 horas, o veículo foi furtado por desconhecidos; os executados não foram indemnizados pela firma vendedora, apesar das insistências em tal sentido, pelo que deixaram de liquidar as prestações à Exequente a partir de 05 de Fevereiro de 1999; em face das referidas circunstâncias, o contrato de compra e venda do veículo é nulo, nos termos do art.º 892º e segs. do C. Civil, nulidade que se estende ao contrato de concessão de crédito celebrado com a Exequente, atenta a especial relação comercial daquela com a firma vendedora do veículo; em virtude de tal nulidade, deverá a Exequente restituir aos executados tudo quanto estes lhe pagaram no âmbito do contrato de financiamento, ou seja, PTE: 562.204$00.
Conclui pela procedência dos embargos.
2 - Devidamente citada a Exequente /embargada veio deduzir oposição alegando que o que está subjacente à livrança dada à execução é o contrato denominado de "Contrato de Financiamento Para Aquisição de Bens de Consumo Duradouros", com o n.º ....., celebrado entre si e os executados, que se destinou a permitir a aquisição do veículo automóvel identificado pela Embargante, nega que tivesse qualquer conhecimento, à data da celebração do contrato, que o título de registo de propriedade entregue pela firma vendedora era falso, razão por que não sabia nem podia saber que o vendedor estava a vender um carro que alegadamente não era seu; não se verificam no caso os pressupostos previstos no art.º 12º do Decreto-Lei n.º 359/91, que permitam afirmar a nulidade do contrato de crédito em causa, ou que permitam que ela própria, na qualidade de credora, possa ser demandada pelo incumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda.
Concluí, assim, pela improcedência dos embargos.
3 - O processo prosseguiu termos tendo sido proferido saneador e nos termos do artigo 787 n.º 2 do CPC dispensou-se a selecção da matéria de facto.
Procedeu-se a julgamento tendo a matéria de facto merecido as respostas que constam do despacho de fls. 97 a 101.
Posteriormente foi proferida sentença que julgou os embargos totalmente improcedentes.
4 - Apelou a Embargante, nos termos de fls. 124 a 129, formulando as seguintes conclusões: 1ª- A Douta sentença de fls. 105 e segs. decidindo, a fls. 112, que a "norma correspondente ao nº1 [do art. 12º do Dec. Lei n.º 359/91, de 21/09] se refere apenas a um sentido na repercussão dos efeitos da invalidade e ineficácia - do contrato de crédito para o contrato de compra e venda - (e não do contrato de compra e venda para o contrato de crédito) fez uma deficiente interpretação dessa mesma norma, com o devido respeito por opinião contrária.
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- A interpretação e aplicação destes normativos, o Meritíssimo Sr. Dr. Juiz a quo violou as normas previstas no art. 9º do C. Civil para a fixação do sentido e alcance da Lei.
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- Desde logo, não atendeu ao Preâmbulo desse Decreto-Lei que expressamente refere que a intenção é constituir um conjunto de garantias adicionais para o consumidor.
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- O que não se alcança se pugnada a interpretação perfilhada na Douta sentença, mas, outrossim, obter-se-ia uma drástica redução e limitação das garantias gerais.
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- O que é confirmado pelo pensamento legislativo inerente ao nº 2 do art. 6º - pois que aí expressamente consagra requisitos excepcionais para além dos requisitos gerais dos contratos.
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- Igualmente de acordo com a própria interpretação gramatical do nº 1 do art. 12º, chegamos à conclusão de que o legislador pretendeu criar uma norma excepcional, para além da regime geral que impera sobre estes contratos, pois que não derrogou o regime geral.
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- Tal como o nº 2 desse mesmo artigo não derrogou o regime geral de demanda.
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- Ora, o contrato de crédito ao consumo é para aquisição de um bem determinado e determinável, nos termos impostos por aquele Decreto-Lei, pelo que a aquisição do bem é uma parte imprescindível para a realização do contrato de crédito.
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- Assim, à luz da legislação, o contrato de compra e venda é o contrato principal e o contrato de crédito é o contrato acessório.
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- Pelo que, declarado nulo o contrato de compra e venda não subsiste o contrato de crédito subjacente.
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- Só assim se concilia a redacção do art. 12º do mencionado Decreto-Lei com o teor do art. 60º da C.R.P., de aplicação directa por força do seu art. 18º, inerente a tais princípios é que a legislação correlacionado com os consumidores deve defender os interesses económicos destes, partindo do pressuposto que é parte mais fraca das relações contratuais que se estabeleçam, e que este não deverá ser responsabilizado para além dos seus interesses, cujo resultado, a final e concretamente, não deve representar um injustificado sacrifício dos seus interesses económicos.
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- Pelo exposto, na decisão recorrida fez-se uma deficiente interpretação do artigo 12º do Decreto-Lei nº 359/1991, de 21 de Setembro Conclui pedindo a procedência do recurso e que se decida que a nulidade do contrato de compra e venda acarreta a nulidade do contrato de concessão de crédito ao consumo subjacente ao título executivo, e consequentemente a...
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