Acórdão nº 0513975 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Janeiro de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelJOAQUIM GOMES
Data da Resolução04 de Janeiro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação do Porto.

  1. RELATÓRIO 1.- No processo n.º ..../99.4TAVNG do ....º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal do Porto, em que são: Recorrente/Assistente: Instituto da Segurança Social.

Recorrido: Ministério Público Recorridos/Arguidos: B............

C........., SA.

Foi deduzida acusação pelo Ministério Público a fls. 450-453 (2002/Out./21), imputando aos arguidos a prática de dois crimes de abuso de confiança em relação à Segurança Social p. e p. pelos art. 24.º, n.º 1 e 27.º-B do Dec.-Lei n.º 20-A/90, de 15/Jan. (RJIFNA), na redacção em vigor à data dos factos, actualmente da previsão dos art. 105.º, n.º 1 e 107.º da Lei n.º 15/2001 (RGIT), na sequência da qual foi requerida a fls. 509-517 (2003/Mai./09), pelo arguido B......, a abertura da instrução, em virtude de não se conformar com o teor da mesma, requerendo a sua despronúncia.

Procederam-se às diligências tidas por adequadas e ao necessário debate instrutório, tendo-se proferido a fls. 678/682 (2005/Mar./03), despacho de não pronúncia dos arguidos.

  1. - O assistente ISS, não se conformando com esta decisão, interpôs a fls. 695 (2005/03/24) recurso da mesma, em virtude de, no seu entender, existirem, nos autos, elementos de prova suficientes para fundamentarem a responsabilidade do arguido, enquanto administrador da sociedade arguida, bem como desta, apresentando as conclusões que se passam a transcrever: O Art. 27.º-B do RJIFNA- D.L. n.º 20-A/90, de 15.Jan., na redacção introduzida pelos D.L. n.º 394/93 de 24.Nov. e 140/95 de 14/Junho, actual Art.107º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5.Junho, estabelece que "As entidades empregadoras que, tendo deduzido do valor das remunerações pagas aos trabalhadores o montante das contribuições por estes legalmente devidas, não o entregarem, total ou parcialmente, às instituições de Segurança Social, no período de 90 dias, do mesmo se apropriando, serão punidas com as penas previstas no artigo 24º do mesmo diploma".

    Nos presentes autos ora objecto de recurso logrou-se provar documentalmente e, também, através dos depoimentos de algumas testemunhas trabalhadores da sociedade arguida que o Arguido B........., foi o administrador da sociedade arguida no período ajuizado nestes autos.

    Por isso, no período da acusação pública, segundo o registo comercial, o legal representante da sociedade arguida e como tal responsável pela sua gestão e administração estava incumbido da obrigação do cumprimento da relação jurídica contributiva perante a Segurança Social.

    Ora, esta prova documental, emitida pela Conservatória do Registo Comercial, cuja genuinidade e autenticidade não pode ser posta em causa e desvalorada em tábua rasa pelo Tribunal a quo.

    No sistema contributivo da Segurança Social todas as operações indispensáveis à liquidação das contribuições estão a cargo das entidades empregadoras contribuintes, isto é, são equivalentes às situações que no direito tributário são qualificadas como autoliquidação, e constitui uma das obrigações acessórias do sujeito passivo (Art. 31.º n.º 2 da Lei Geral Tributária), declarações estas que se presumem verdadeiras e de boa fé (Art. 75.º n.º 1 da Lei Geral Tributária).

    Com efeito, são as entidades patronais que, em primeiro lugar aplicando as normas reguladoras da definição das remunerações que constituem base de incidência, identificam os salários a declarar na folha de remunerações relativamente a cada trabalhador ou membros de órgãos estatutários. Por outro lado, são igualmente elas que, em segundo lugar, aplicando as regras referentes às taxas estabelecidas, procedem, aliás de forma automática, ao apuramento aritmético do valor das contribuições que devem ser pagas.

    Nunca é demais salientar a importância verdadeiramente fulcral da declaração de remunerações, na medida em que o que nela é declarado pelo contribuinte não pode ter paralelo numa "presunção" da administração fiscal, mas sim constitui um documento onde é o próprio contribuinte que declara entre outros, quem são os seus membros de órgãos estatutários, o número de trabalhadores que tem ao seu serviço, o número de dias de trabalho prestado no mês e a remunerações efectivamente pagas. Ora tais "folhas de férias" espelham a realidade laboral da empresa quanto aos recursos humanos nela empregues e dão legitimidade à Segurança Social para definir a carreira contributiva dos respectivos beneficiários e os direitos e regalias dos mesmos, numa base de boa fé da actuação do contribuinte (n.º 2 do Art. 59.º da Lei Geral Tributária).

    Assim, nos ora objecto de recurso, existe prova documental através da qual se demonstra que foi a própria Sociedade Arguida, através do seu legal representante enquanto entidade empregadora/patronal e pessoa singular (B.......) quem declarou, perante a Segurança Social, ter procedido ao pagamento das remunerações devidas aos seus trabalhadores e aos seus membros dos órgãos estatutários, sobre as mesmas aplicando a taxa contributiva legal de respectivamente 11% e 10%, sem a correlativa recepção do respectivo meio de pagamento desta quantia, tendo-se verificado inelutavelmente a efectiva dedução ou retenção na fonte do montante das contribuições (ou cotizações) por aqueles legalmente devidas, para efeitos do disposto na primeira parte do art. 27.º-B do RJIFNA.

    Existem nos presentes autos declarações de testemunhas trabalhadores e colaboradores da empresa arguida que, de forma isenta e imparcial, disseram obedecer, durante o período em causa nestes autos, às ordens e instruções do arguido B....., e que este último sempre acompanhou a vida económico-financeira da empresa.

    Essas declarações, acompanhadas e apoiadas nas declarações de remunerações preenchidas e entregues na Segurança Social pela sociedade arguida, na qual consta o nome do arguido B....... como seu administrador e ainda na Certidão do Registo Comercial correspondente à matricula da sociedade arguida na qual consta como seu administrador o predito arguido B......, são, a nosso ver, suficientes para estarem verificados os indícios suficientes para a imputação àquele arguido, assim como à sociedade arguida, dos factos descritos na acusação.

    Em abundância o arguido era à data dos factos ajuizados advogado o que faz impender sobre ele um dever de conhecimento dos factos especialmente qualificado, afastando assim o seu invocado comportamento negligente.

  2. - O Ministério Público contra alegou, dizendo que, não obstante a posição assumida no debate instrutório e depois de uma melhor ponderar dos elementos probatórios recolhidos, a decisão de não pronúncia não merece qualquer censura, pugnando, por isso, pela improcedência do recurso.

  3. - O arguido alegou igualmente, sustentando a improcedência do recurso, com base nas seguintes conclusões, que se reproduzem: O Tribunal "a quo", considerou que "apreciando e ponderando toda a prova indiciária verifica-se que na instrução foi produzida prova tendente a corroborar a versão dos factos apresentada pelo arguido", e que "Os depoimentos das testemunhas inquiridas em sede de instrução vieram corroborar no essencial os factos alegados pelo arguido, de forma adequada a infirmar os indícios dos factos alegados na acusação, justificando uma dúvida mais do que razoável sobre a verificação dos factos que devem ser fundamento da responsabilidade penal do arguido".

    O Recorrente, não alegou qualquer vício emergente do despacho colocado em crise, qualquer fundamento relativo a insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada, qualquer contradição insanável da fundamentação ou algum erro notório na apreciação da prova, logo, a matéria de facto dada como assente e provada pelo Meritíssimo Juiz "a quo", na qual sustenta a decisão recorrida transitou em julgado, não podendo ser objecto de reapreciação cfr. art. 403, 410 n.º 2 e 411 todos do C. P. P..

    O Recorrente não refere no Recurso de fls., quais as normas jurídicas violadas pelo Meritíssimo Juiz "a quo", qual o sentido em que o tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ele devia ser interpretada ou com que devia ser aplicada, e em caso de erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que no entendimento do Recorrente deve ser aplicada.

    A sobredita omissão deverá promover a rejeição do Recurso por falta de motivação, sendo que a mesma deficiência não é possível de corrigir através de nova interposição de recurso, pois o direito de recorrer extinguiu-se com o seu exercício.

    Dos autos, cuja matéria de facto não é objecto de reapreciação no presente, resulta provado que o Contra-Alegante "assinava folhas de remuneração (p)ara a Segurança Social e documentos fiscais carentes de assinatura do legal representante da sociedade, sempre convicto do integral e escrupuloso cumprimento de todas as obrigações fiscais e contributivas, tanto mais que na pendência do seu Mandato, o arguido sempre apôs a assinatura nas folhas de remuneração para a segurança social, bem como assinou, mensalmente os cheques que se destinavam ao pagamento das contribuições devidas, nas gerais se incluíam as retenções em crise na acusação" bem como provou que "as cartas com os cheques eram entregues ao D....... que sempre se responsabilizou pelo seu envio através do correio, criando a convicção junto dos funcionários administrativos e do arguido, de que as contribuições para a segurança Social se encontravam efectivamente pagas." Pelo que, não se verificando tal conduta, não há crime, cfr, art. 13.º do C.P., daí a adequabilidade e justeza do Despacho de não pronuncia de fls..

    7 Assim, as alegações do Recorrente, segundo as quais nos autos não se verificam causas de justificação ou exclusão da culpa, nomeadamente o estado de necessidade ou conflito de deveres desculpante, bem como uma suposta invocação de negligência por parte do Contra-Alegante, apenas se podem compreender por manifesta distracção, pois o contra -Alegante não invocou qualquer uma delas.

    O Contra-Alegante...

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