Acórdão nº 0516360 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Maio de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelPAULO VALÉRIO
Data da Resolução24 de Maio de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACORDÃO ( Tribunal da Relação ) Recurso n.º 6360/05 Processo n.º .../99.3TBSJMAcordão em audiência na 1.ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto RELATÓRIO 1- No …..º Juzo do Tribunal de S.João da Madeira, no processo acima referido, foram os arguidos abaixo referidos julgados em processo comum, com tribunal colectivo, condenados da forma seguinte: - a arguida "B……., SA", pela prática de 1 crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, previsto nos arts. 30. º, n. º 2 e 79. º do CódPenal, e 105. º, n. º 5, do RGIT, na pena de 600 (seiscentos) dias de multa, à taxa diária de 5 euros.

- o arguido C…….., pela prática de 1 crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, previsto nos arts. 30. º, n. º 2 e 79. º do CódPenal, e 24. º, n. º 1 e n. º 5, do RJIFNA, na pena de 2 (dois) anos de prisão --- pena esta suspensa na sua execução pelo período de 4 anos.

2- Inconformado, interpôs recurso o arguido Cebola, concluindo a sua motivação do seguinte modo : atenta a prática da data dos factos e sendo o prazo de prescrição do crime de 5 anos ( art.117° al. c) do CPP), e atentas as causas de suspensão e de interrupcão do prazo prescricional verificadas nos autos os crimes teriam prescrito em 1999.

o arguido agiu em estado de necessidade e conflito de deveres, pois para optar em pagar o IVA tinha que haver dinheiro disponível, e este de facto não existia impõe-se pois dar como provado que os valores recebidos do IVA foram utilizadas apenas no pagamento de ordenados aos trabalhadores e de despesas indispensáveis ao funcionamento da empresa, por total carência de fundos de tesouraria ou impossibilidade imediata de os obter, a energia e os salários tornaram-se custos de pagamento prioritário, para manter a paz social e a produção da fábrica; a empresa era, além disso, devedora de compromissos de outra natureza, tais como débitos à banca e à Segurança Social, e dos valores totais das facturas, sempre depositados nas contas da B….., foram sendo retirados pela empresa os montantes necessários para suportar os custos prioritários imprescindíveis à manutenção da empresa a laborar, apenas para esses fins foram usados os valores recebidos pela B........... ; se tais quantias não fossem pagas, degradar-se-iam as condições de vida de centenas de famílias que vivem desses ordenados, e seriam lançados no desemprego centenas de trabalhadores, acabando uma empresa válida ; a sentença dá como não provado que aquando da utilização do IVA para pagar as despesas alegadas, havia projectos de realização de fundos que permitiriam a sua liquidação, mas realmente da prova produzida (documentação junta e ainda do depoimento das testemunhas D…… e E…….) resulta estar o recorrente em negociações com tal fim e efeito estando provado que o arguido nenhum beneficio pessoal retirou dos factos e aplicou o dinheiro na satisfação das necessidades da empresa não ocorre a verificação do elemento objectivo do crime de abuso de confiança; mas mesmo que se entenda que se encontram preenchidos os elementos objectivos do tipo, não seria de assacar qualquer espécie de dolo ao recorrente pois que o recorrente não agiu com dolo de apropriação, e inexiste qualquer espécie de dolo eventual: nunca o recorrente representou como provável qualquer resultado criminoso, nunca actuou conformado com tal representação 3. Nesta Relação, o Exmo PGA pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

4- Foram colhidos os vistos legais e teve lugar a audiência de discussão e julgamento.

+FUNDAMENTAÇÃO Os factos Na 1.ª instância deram-se como provados os seguintes factos: 1. A arguida B........... dedica-se ao fabrico de produtos metálicos e de tubos de aço, tendo sido dona de uma fábrica situada na Rua da ….., em São João da Madeira.

  1. O arguido C........... foi, até Julho de 1995, o seu presidente do Conselho de Administração e o seu accionista maioritário.

  2. No entanto, era ele o único membro daquele Conselho que geria e administrava, sozinho e em exclusivo, toda a sociedade arguida e a sua fábrica, tendo poderes para, por si só, vincular a B..........., chamando a si a iniciativa e a total responsabilidade pelas decisões mais importantes e de maior melindre, a que pessoalmente dava, depois, execução.

  3. O arguido C........... assim procedeu sempre, consciente e voluntariamente, por sua própria iniciativa, em nome da sociedade arguida e a favor dos interesses comerciais desta.

  4. No desenvolvimento das suas actividades industriais e comerciais, a arguida B........... fabricou e vendeu os seus produtos a clientes seus, facturando-os, dos quais apurou e recebeu efectivamente, a título de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), os seguintes montantes, nos respectivos meses: esc. 26.798.467$00, em Dezembro de 1993; esc. 21.943.588$00, em Fevereiro de 1994; esc. 20.751.830$00, em Março de 1994; esc. 19.562.232$00, em Abril de 1994; esc. 8.912.294$00, em Maio de 1994; e esc. 10.740.902$00, em Dezembro de 1994; num total de esc. 108.709.313$00.

  5. Porém, e apesar de ter preenchido e enviado as respectivas declarações aos Serviços de Administração do IVA, nos meses correspondentes de apresentação, em vez de entregar tais importâncias, o arguido C..........., no âmbito dos seus já descritos poderes e em benefício dos também já referidos interesses, nunca as entregou a esses Serviços, antes as utilizou na sociedade arguida, nos períodos em que as recebeu e contabilizou.

  6. Tais quantias, integradas no conjunto de dinheiros recebidos das vendas pela empresa, foram assim totalmente utilizadas pelo arguido C........... nas diversas despesas correntes da arguida B..........., nomeadamente optando pelo pagamento de salários dos trabalhadores, de matérias-primas, de energia eléctrica, entre outras.

  7. Em todos os apontados períodos, o arguido C........... agiu voluntária e conscientemente, ciente que aqueles dinheiros que utilizou e gastou na empresa pertenciam ao Estado e a este os devia fazer chegar, juntamente com as declarações que havia preenchido e entregue, sabendo também que não podia nem devia agir desse modo.

  8. Em fins de Março de 1995, a arguida B........... apresentou ao Ministério das Finanças uma proposta de liquidação daquela quantia de esc. 108.709.313$00, indicando alguns imóveis da B........... a título de dação, proposta que não obteve resposta positiva, apesar da insistência em 12 de Julho de 1995.

  9. Com efeito, a Direcção de Serviços de Justiça Tributária da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos solicitou parecer sobre a validade da proposta e avaliação dos imóveis em 12 de Julho de 1995.

  10. A própria arguida B........... indicou para tais imóveis o valor de cerca de um milhão de contos, tendo a mesma arguida avaliado, nesse momento, a sua dívida ao sector público em 790.451.384$00.

  11. O arguido C........... não tem antecedentes criminais registados.

  12. Na arguida B........... trabalhavam, à data dos factos, cerca de 800 trabalhadores.

  13. A B........... foi adquirida em princípios de 1985 pelo arguido C........... e outros quadros (através de management buy-out) à multinacional ITT, pela quantia de 1 dólar, quando o arguido era director-geral da mesma arguida.

  14. A partir de 1991, houve uma crise económica mundial que se reflectiu em Portugal, tendo a B........... sentido também essa recessão, passando a ter dificuldades económicas e tentando negociar com os seus diversos credores.

  15. Os valores dos totais das facturas de todos os referidos meses sempre foram pagos à B..........., integrando as mesmas o valor correspondente do IVA, desenvolvendo-se o giro normal do caixa da empresa através de depósitos e pagamentos.

  16. A arguida B........... apresentou-se ao processo de recuperação de empresas em 25 de Julho de 1995, no Tribunal de São João da Madeira, o qual corre os seus termos no ….º Juízo desse Tribunal, com o nº …./95.

  17. Em 25 de Julho de 1995, a arguida B..........., no âmbito daquele processo de recuperação de empresas, requereu a regularização das suas dívidas fiscais ao abrigo do Dec.-Lei 124/96, de 10 de Agosto, tendo-lhe sido concedida autorização para o fazer em 150 prestações mensais e iguais, que não cumpriu.

  18. Foi então proferido o despacho de folhas 1199, ordenando-se a suspensão do processo.

  19. Ao abrigo e sempre no âmbito daquele processo especial de recuperação de empresas, a arguida B........... propôs sucessivamente, para pagamento das suas dívidas fiscais, duas dações em pagamento de bens imóveis a si pertencentes.

  20. Por despacho proferido a folhas 1273, foi declarada cessada a suspensão da instância acima referida.

  21. Das referidas dações, ambas no âmbito do processo de...

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