Acórdão nº 0534023 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Março de 2006 (caso NULL)

Data30 Março 2006
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B……, LDª instaurou acção declarativa com forma de processo ordinário contra C……, SPA.

Pediu que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de 27 644 726$00, acrescida de juros contados à taxa legal de 10% ao ano desde a sua citação e até efectivo e integral pagamento.

Como fundamento, alegou, em síntese, que, no exercício da actividade transitária a que ambas se dedicam, em 23.10.98, celebrou com a ré um denominado "Acordo de Celebração", nos termos do qual acordaram, além do mais, que a ré recolhia em Itália as mercadorias dos clientes da autora, guardava-as em armazém e prestava o seu apoio profissional na realização do transporte para Portugal. Chegadas a Portugal, a autora recebia as suas mercadorias, bem como as da ré, que guardava nos seus armazéns e posteriormente distribuía aos respectivos importadores, recebendo, quando fosse caso disso, o respectivo preço.

Cada uma das partes debitava à outra os respectivos custos e serviços. No final de cada mês de vigência do contrato, far-se-ia uma conta corrente e o respectivo saldo seria pago até ao dia 15 do mês subsequente.

Em 13.01.99, a autora recebeu um fax da ré a dizer que denunciava o acordo a partir do dia seguinte.

À data da denúncia do acordo, a conta corrente existente entre a autora e a ré apresentava um saldo devedor da ré no total de 5 212 481$00.

Mais alegou que, quando a ré denunciou o acordo, a autora já tinha feito deslocar para Milão dois camiões, a pedido daquela, que regressaram a Portugal vazios, o que originou uma despesa de 840 000$00.

Alegou ainda outros factos tendentes a demonstrar que a conduta da ré lhe causou prejuízos, decorrentes quer da falta de aviso prévio na denúncia do acordo, quer dos lucros que deixou de obter, quer da apropriação por parte da ré dos resultados da actividade patrocinada pela autora, que quantifica em 461 900$00, 1 130 345$00 e 20 000 000$00, respectivamente.

A ré contestou, invocando a incompetência internacional do tribunal e a nulidade da citação, impugnando os factos alegados pela autora e pedindo a condenação desta como litigante de má fé em multa e indemnização não inferior a 5 000 000$00.

Deduziu reconvenção, pedindo que a autora fosse condenada a pagar-lhe as quantias de 15 352 987$00 e ITL 13.335.234, ou o respectivo contravalor em escudos equivalente a 1 373 323$00, calculados ao câmbio indicativo de 0,103 Esc. = 1 ITL, acrescidas de juros vencidos e vincendos.

Como fundamento do pedido reconvencional, alegou que a autora se comprometeu a actuar junto da empresa D….., Ldª, com vista à cobrança do crédito de que a ré era titular sobre esta empresa, no valor de 5 352 987$00, o que não fez. Que a autora recebeu o pagamento de ITL 13.333.234 pelo transporte de mercadorias de clientes da ré, que ainda não lhe entregou. E finalmente, alegou factos tendentes a demonstrar que, com a sua conduta, a autora causou prejuízos à imagem da ré.

Na réplica, a autora respondeu às excepções e à reconvenção, pugnando pela sua improcedência.

Foi proferido despacho saneador que julgou improcedentes as excepções invocadas pela ré.

Percorrida a demais tramitação normal, foi proferida sentença que: Julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar à autora a quantia de 6 326 481$00 (€ 31.556,35), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento; Absolveu a autora do pedido reconvencional deduzido pela ré.

Inconformada, a ré interpôs recurso, formulando as seguintes Conclusões: 1ª - Ainda que a recorrida tivesse pagado 840 000$00 pelo transporte de mercadorias de Itália para Portugal, consta dos factos provados da sentença que cerca de metade da capacidade de carga dos camiões foi ocupada com mercadorias suas, razão pela qual a requerente apenas poderia ser responsável pelo pagamento de metade dos custos de transporte.

  1. - Isto significa que, caso não houvesse justa causa para a resolução do acordo celebrado com a recorrida, como houve, a recorrente apenas teria de lhe pagar 420 000$00 (ou valor ligeiramente superior se se apurasse qual o valor exacto da capacidade de carga ocupada pelas mercadorias da requerente).

  2. - Assim, e por constar da sentença recorrida (2º parágrafo de fls. 581) que os mesmos dois camiões "regressaram a Portugal vazios" e que "a autora teve de pagar à transportadora os respectivos fretes", no valor global de 840 000$00, pelo que sofreu com isso um dano, de montante correspondente", deverá a mesma ser reformada nesta matéria, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do nº 2 e do nº 3, ambos do artº 669º do CPC.

  3. - A soma dos valores indicados a fls. 581 da sentença não perfaz os indicados 1 114 000$00, mas antes apenas 977 000$00 (840 000$00 + 50 000$00 + 50 000$00 + 37 000$00).

  4. - Assim, também neste âmbito deverá a sentença recorrida ser reformada, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do nº 2 e no nº 3, ambos do artº 669º do CPC.

  5. - Face ao disposto nos artºs 3º-A, 623º e 176º, nº 1, todos do CPC, que violou, deveria o Tribunal a quo ter considerado os depoimentos prestados por carta rogatória e, face ao teor dos mesmos, dado respostas positivas aos quesitos 70º, 72º a 78º, 81º a 87º, 94º a 97º, 100º a 106º e 126º, todos da base instrutória, e respostas negativas aos quesitos 107º, 108º, 110º, 115º, 116º e 121º.

  6. - Na verdade, não correspondente à verdade que as testemunhas da recorrente, ouvidas por carta rogatória, tenham prestado depoimento de forma menos isenta, com respostas muito peremptórias ("sim" ou "não"), mas pouco explicativas do que queriam "dizer" e que se verificava que tinham interesse directo ou indirecto na resolução da causa.

  7. - Também é destituída de fundamento legal a afirmação de que o facto de se ter dado maior credibilidade às testemunhas da recorrida, é decorrente dos princípios da imediação e do contraditório que vigoram em processo civil e que não são garantidos da mesma maneira nas cartas rogatórias.

  8. - Relativamente à prova documental, também a sua análise foi insuficiente, não tendo o Tribunal a quo considerado muitos dos documentos juntos aos autos, os quais, aliás, confirmavam o depoimento prestado pelas referidas testemunhas da recorrente.

  9. - Aliás, a genuinidade, autenticidade e a força probatória dos documentos citados não foram nunca impugnados pela recorrida, sendo certo que um dos documentos em questão até foi junto pela recorrida como documento nº 3 da petição inicial.

  10. - Os referidos documentos confirmavam a existência do crédito da recorrente sobre a recorrida, as insistências daquela com vista a obter o seu pagamento, para além dos danos de imagem e materiais que a recorrente sofreu por falta de devolução de COD relativos à entrega de mercadorias pela recorrida.

  11. - Ainda a propósito dos danos de imagem, deveria também o Tribunal a quo ter considerado o teor dos documentos juntos à réplica da recorrida com os nºs 9 a 15, sendo os mesmos cartas/faxes de clientes da recorrente a conferir poderes ao Dr. E….. para receber, em seu nome, os cheques que a recorrida ilicitamente detinha.

  12. - A consideração necessária do teor daqueles documentos (corroborado pelo depoimento das testemunhas ouvidas) deveria ter levado o Tribunal a quo a dar resposta positiva aos quesitos 70º, 72º, 92º, 94º, 95º, 96º, 97º e 126º e, em resultado, resposta negativa aos quesitos 107º, 108º, 110º, 115º, 116º e 121º (este até por evidente contradição com o teor da al. T da matéria assente).

  13. - Daqui resulta que os quesitos 29º, 30º, 33º, 35º, 36º, 37º, 38º, 42º, 44º e 45º, correspondentes, respectivamente aos factos provados 48º a 59º da sentença, deveriam ter sido considerados não provados, por ser manifesto que tais clientes terão passado a ser clientes da referida F….., sociedade que em nada se confunde com a recorrente, tal como a recorrida também em nada se confundia com a recorrente.

  14. - Os quesitos 74º a 78º e 81º a 87º deveriam ter sido dados como provados, não só porque as suas testemunhas confirmaram os mesmos, como, e sobretudo, porque também foram confirmados pelas testemunhas da própria autora.

  15. - A resposta ao quesito 7º, correspondente ao facto provado 26º da sentença, deveria ter obtido resposta diferente da dada, por resultar do depoimento de uma das testemunhas ouvidas, G….., que o custo do transporte correspondeu a 764 490$00 (386 835$00 + 377 655$00), e não aos 840 000$00 e que apenas correspondeu a cerca de metade desse valor o alegado prejuízo da recorrida, ou seja, a cerca de 382 245$00.

  16. - É manifesta a existência de justa causa de resolução do Acordo de Celebração celebrado entre a recorrente e a recorrida, por falta de cobrança do crédito de que a recorrente era titular sobre a D….., Ldª, e pelo facto de a recorrida não dispor de uma estrutura que lhe permitisse fazer face às necessidades da recorrente de transporte de mercadorias para Portugal.

  17. - A resolução do acordo não acarretou quaisquer prejuízos para a recorrida, que, de imediato, deixaram de pagar quaisquer quantias em resultado do arrendamento de espaços para armazenamento de mercadorias e do pagamento de salários a funcionários.

  18. - A recorrida não entregou à recorrente a quantias relativas às mercadorias transportadas em regime COD, violando instruções expressas desta, pelo que a deverá indemnizar em montante correspondente ao que deveria ter entregue.

  19. - Face ao exposto na alínea antecedente, a recorrida causou graves danos de imagem à recorrente, em montante que deveria ter sido fixado pelo Tribunal.

  20. - Não tendo condenado a recorrida no pagamento de indemnização à recorrente, pelos danos que a sua conduta lhe causou, a decisão recorrida violou o disposto nos artºs 798º e 804º do CC.

A autora contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da sentença recorrida.

A Mª Juiz a quo pronunciou-se no sentido do indeferimento da reforma.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*II.

A matéria de facto dada como provada...

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