Acórdão nº 0536911 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Fevereiro de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I. RELATÓRIO: No ..º Juízo do Tribunal Judicial da Póvoa de Varzim, B......, Lda.

intentou declarativa de condenação sob a forma ordinária contra, C........

e D.......

Pede: A condenação dos RR. a absterem-se da prática dos actos de concorrência desleal que têm vindo a praticar contra a A. e a condenação dos mesmos a pagarem-lhe a quantia de 13.000.000$00 a título de danos que já sofreu em consequência de tais actos de concorrência desleal e ainda no que se vier a liquidar em execução de sentença por utilização abusiva de equipamentos certificados - caixas de desratização - da A.

Os RR. contestaram, impugnado que alguma vez se tenham associado para fazer concorrência á A., que apenas o 1º R. exerce por conta própria a actividade de desinfestação, trabalhando o 2º R. sob as suas ordens e direcção; actividade em que nunca praticou qualquer acto de concorrência desleal para com a A.

Concluem pela improcedência da acção.

Na resposta a A. concluiu na p.i.

Teve lugar o julgamento da causa pela forma prevista na lei, após o qual o tribunal respondeu à matéria de facto da base instrutória pela forma que consta de fls. 334 a 336.

Finalmente, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, com a absolvição dos RR do pedido.

Inconformada com o sentenciado, veio a autora interpor recurso, apresentando alegações que remata com as seguintes "CONCLUSÕES: 1 - Após terem cessado a actividade profissional que exerciam ao serviço da A, enquanto trabalhadores desta, os RR estabeleceram-se por conta própria e levaram a efeito um projecto empresarial cujo segmento de actividade é o mesmo da apelante - desinfecção/desratização de estabelecimentos comerciais.

II - Ao iniciarem a sua actividade empresarial os RR decidiram afastar a A do mercado, passando a ocupar eles próprios o espaço até então ocupado por aquela.

III - Para atingirem esse fim, os RR serviram-se do conhecimento que tinham da lista de clientes da A, dos equipamentos, produtos e técnicas utilizadas por esta, sendo certo que adquiriram esses conhecimentos enquanto empregados da A..

IV - Os RR adquiriram equipamentos e produtos iguais aos utilizados pela A, mandaram confeccionar autocolantes idênticos aos desta e munidos da tabela de preços visitaram todos os clientes da a, oferecendo-lhe os mesmos serviços por preço mais baixo e anunciando falsamente, pelo menos a um cliente, que a A tinha fechado as suas instalações.

V - Ao estabelecerem os preços para os serviços que se propunham prestar, os RR não tiveram em conta os custos que iriam suportar, a margem de lucro que iriam retirar e os preços correntes de mercado para iguais serviços, tendo apenas e tão só como ponto de referência os preços praticados pela A..

VI - A actuação dos RR foi organizada e sistemática, tendo como objectivo a eliminação da A do mercado, substituindo-se eles próprios à A..

VII - Em consequência do "ataque" perpretado pelos RR, a A sofreu uma redução de cerca de 50% no seu volume de negócios.

VIII - Os RR não se limitaram a criar uma empresa destinada a concorrer com a A no mesmo mercado.

IX - Os RR porque conheciam todos os segredos, técnicas, produtos, clientes e preços da A, criaram uma empresa que, aos olhos dos clientes da A, era uma cópia desta, com uma vantagem acrescida, praticava preços mais baixos.

X - O comportamento dos RR não se insere no normal funcionamento do mercado livre e concorrencial, pelo contrário, é claramente violador das normas e usos honestos de qualquer actividade económica, configurando situação típica de concorrência desleal.

XI - Ao agirem da forma dada como provada, os RR constituíram-se na obrigação de indemnizar a A pelos prejuízos sofridos em consequência desse comportamento desleal nos termos do disposto no artº 483º do C. Civil.

XII - A sentença recorrida violou, entre outros, os artºs 317º do C.P.I. e os artºs 483 e 487º do C.Civil.

Nestes termos e pelo que doutamente será suprido, Deve ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a sentença recorrida e julgando-se a acção procedente e provada".

Os recorridos contra-alegaram, sustentando a manutenção da sentença.

Foram colhidos os vistos legais.

  1. FUNDAMENTAÇÃO II. 1. AS QUESTÕES: Tendo presente que: - O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil); - Nos recursos se apreciam questões e não razões; - Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, A questão - ou questões, se quisermos-- a resolver consiste em saber se os réus, ao actuarem do modo que os factos provados patenteiam, violaram as normas e usos honestos da respectiva actividade económica - actuando em concorrência desleal para com a Autora - e, em caso afirmativo, quais as consequências.

  2. 2. FACTOS PROVADOS: Na 1ª instância deram-se como provados os seguintes factos: 1. A A. dedica-se, para além da venda e montagem de equipamentos de hotelaria e escritório, a desinfecções em estabelecimentos comerciais e casas particulares.

    1. Os RR. foram empregados da A., o R. C........ até 10.2.1997 e o D...... até ao dia 1.2.1997.

    2. A área de trabalho efectivo dos RR. compreendia o segmento de desinfecção.

    3. Os RR. pelo exercício das suas funções enquanto funcionários da A. tinham acesso à lista de clientes, aos equipamentos e aos produtos por esta utilizados na sua actividade de desinfecção.

    4. Após ter deixado de trabalhar para a A., o R. C......a passou a visitar a generalidade dos clientes daquela.

    5. O R. C....... nas circunstancias referidas na resposta ao art. 2º anunciou a pelo menos a um cliente da A. que esta tinha fechado as suas instalações.

    6. Os preços praticados pelo R. C......, porque conhecia os da A. e teve acesso aos contratos celebrados por sta, eram mais baixos que os praticados pela A..

    7. Na sequência das visitas efectuadas pelo R. C...... referidas na resposta ao art. 2º, rescindiram os contratos com a A. cerca de 80 clientes desta.

    8. Sendo o valor anual desses contratos de cerca de 4.000.000$00.

    9. A A. com intuitos publicitários, afixa nas janelas ou portas dos estabelecimentos por si assistidos, um autocolante especial.

    10. Como consequência da rescisão de contratos referida na resposta ao art. 8º a A. deixou de auferir uma quantia não inferior a 30.000,00€.

  3. O DIREITO: Não vem impugnada a matéria de facto. O que significa que, não se vislumbrando alteração da mesma por via da aplicação do artº 712º do CPC, é com a factualidade dada como assente no tribunal a quo que teremos de apreciar a questão suscitada nas conclusões da apelação (cfr. nº 6 do citado artº 712º).

    A questão central a decidir consiste, como vimos, em saber se os factos provados consubstanciam concorrência desleal por banda dos réus em relação à Autora - isto é, se com a sua actuação violaram as normas e usos honestos da respectiva actividade económica.

    Entende a apelante que a actuação dos réus foi desleal e/ou desonesta, que "não se insere no normal funcionamento do mercado livre e concorrencial", ao passo que os recorridos sustentam que "sempre actuaram de acordo com as normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade".

    Isto é, fundamenta a autora a sua pretensão na concorrência desleal por banda dos réus, após terem deixado de trabalhar para si e passado a trabalhar por conta própria e no mesmo ramo de actividade da autora.

    Qui juris? Impõe-se, assim, desde logo, definir e desenvolver o conceito de concorrência desleal.

    Antes de mais, como se extrai da própria expressão, para haver "concorrência desleal" obviamente que tem de haver duas formas de acto: o acto de concorrência -- que é necessariamente permitido, lícito - e o acto de "concorrência desleal" - que sem aquele primeiro não pode verificar-se e que é proibido, ilícito.

    Por outro lado, para que se possa falar em concorrência é essencial que as actividades económicas prosseguidas pelos dois - ou mais - empresários sejam afins [Era o que ensinava Carnelitti, que afirmava que concorrer vem do étimo latino cumcurrere, que significa correr em conjunto...

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