Acórdão nº 0554796 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Fevereiro de 2006 (caso NULL)
Magistrado Responsável | MARQUES PEREIRA |
Data da Resolução | 20 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: No Tribunal Cível do Porto, B.......... intentou acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra C.........., Lda., pedindo que, julgada a acção procedente, seja: a)Declarado resolvido o contrato promessa de compra e venda celebrado entre o A e a R, por motivos exclusivamente imputáveis à promitente vendedora, ids. na petição; b)A Ré condenada á restituição do sinal em dobro, no montante global de € 33.818,50 ao A, acrescida de juros legais desde a citação até efectivo e integral pagamento; e c)A Ré condenada ao pagamento de indemnização, no valor de € 7.481,97, referente ao valor do empréstimo que se encontra a pagar sem usufruir do objecto que motivou tal, assim como pelos danos morais causados ao Autor.
Citada, a Ré não ofereceu contestação.
O Autor apresentou alegações de direito.
Seguidamente, foi proferida decisão, que, considerando provados os factos constantes da petição inicial, julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré do pedido.
Custas pelo Autor, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
Inconformado, o Autor apelou para esta Relação, finalizando a sua alegação com as seguintes conclusões: 1- A sentença recorrida fez indevida interpretação dos factos atendendo às normas que lhe são aplicáveis.
2- Foram dados como provados factos que impunham decisão diversa.
3 - O incumprimento do contrato promessa é regido pelos preceitos de carácter geral, artigos 790.° e seguintes do Código Civil, em virtude da equiparação estabelecida pelo n. 1 do artigo 410.°, relativamente ao contrato prometido.
4 - No que aos contratos em geral concerne, existem três formas de não cumprimento: a falta de cumprimento ou incumprimento definitivo, a mora ou atraso no cumprimento e o cumprimento defeituoso (Professor Antunes Varela, "Das Obrigações em Geral", 9.a Ed., 11, págs. 62 e segs.).
5 - A partir de meados de Maio de 2002 a Apelada entrou em mora no cumprimento das obrigações que assumiu.
6 - A mora consiste no atraso do cumprimento imputável ao devedor.
7 - Para a transformação da mora em incumprimento definitivo necessário se torna, nos termos do artigo 808.°, verificar-se a perda, objectiva, do interesse do credor, pela comunicação de um dos contraentes da intenção de não cumprir, ou na sequência da inobservância do prazo suplementar e peremptório (que o Professor Baptista Machado chamou de interpelação admonitória, termo hoje por todos adoptado) que o credor fixe razoavelmente.
8 - O Apelante, de boa fé, lançou mão a um expediente que lhe permitisse transformar a mora em incumprimento definitivo, fazendo uma interpelação admonitória à Apelada, na qual lhe concedeu um prazo de 15 dias para que aquela se dignasse a proceder à escritura definitiva de compra e venda sem o que consideraria o contrato incumprido por única e exclusiva culpa da Apelada.
9 - A Apelada nunca respondeu.
10 - Atendendo a que o contrato em questão foi celebrado em 20 de Dezembro de 1999, que o edifício, onde a fracção, objecto do contrato promessa celebrado, se localizava, devia estar terminado no prazo de 24 meses após o início de construção, que ocorreu em meados de Janeiro de 1999, que toda a documentação necessária à obtenção da licença de utilização, devia ter sido tratada pela Apelada por forma a esta ser emitida pelas entidades competentes, no prazo máximo de 1 (um) ano após a conclusão da obra, que cabia à Apelada a marcação da escritura definitiva de compra e venda e avisar o Apelante com a antecedência mínima de 15 dias, da hora, dia e local da realização da mesma, que esta última deveria realizar-se no período de 03 meses seguintes ao da obtenção da licença de utilização, que passados mais de 02 anos, as obras não estão, sequer, acabadas, que passados mais de 02 anos, a Apelada nunca se dignou a dar qualquer explicação ao Apelante, que o Apelante escreveu à Apelada, num "sentido admonitório" e a Apelada nunca respondeu, nem nunca propôs uma qualquer solução, que tudo isto se passou, dentro dos vários meses depois do prazo em que, também tudo, segundo o contrato, poderia estar "pontualmente cumprido", o prazo suplementar fixado pelo autor de 15 dias é razoável.
11 - Além de demonstrar a boa fé do Apelante, um dos princípios estruturantes do direito dos contratos e que constitui uma trave mestra, certa e segura da nossa ordem jurídica, vivificando-a, por forma a dar solução a toda a gama de problemas de cooperação social que ela visa resolver no campo obrigacional.
12 - Quanto a este ponto a sentença sub recurso fez indevida interpretação dos factos, tendo em conta o convencionado pelas partes quanto aos prazos para a prática dos actos! 13 - Não deveriam ser nos 15 dias, prazo suplementar, que a Apelada deveria terminar a obra, obter licença de utilização e marcar a escritura definitiva. Para tal teve um prazo, até meados de Maio de 2002.
14 - E nada fez.
15 - O Apelante cumpriu o requisito estabelecido na segunda parte do n.º 1 do artigo 808.° do Código Civil.
16 - Quanto ao segundo requisito do artigo 808 n. 1, e n. 2, o Apelante perdeu, objectivamente, o interesse na prestação da Apelada.
17- Não basta uma simples vontade de não querer, só porque outra se demorou no cumprimento. É preciso que "o não querer" se justifique por uma causa objectiva, razoavelmente compreensível e aceitável, ao juízo comum.
18 - A invocada perda interesse, capaz de legitimar a resolução do contrato, foi sustentada num critério da razoabilidade própria do comum das pessoas, de boa fé, de lisura e honestidade no trato contratual, onde qualquer homem...
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