Acórdão nº 0630729 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Março de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelAMARAL FERREIRA
Data da Resolução23 de Março de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO.

  1. B….., instaurou, nas Varas Cíveis do Porto, contra "C…., S.A.", a presente acção declarativa, com forma de processo ordinário, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe (restituir-lhe) a quantia global de 18.804,68 Euros (Esc. 3.770.000$00), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.

    Alega para tanto, em síntese, que, como promitente compradora, celebrou com a R., esta como promitente vendedora, no dia 30 de Abril de 1999, os dois contratos-promessa de compra e venda que junta, relativos e duas fracções autónomas de um empreendimento, na sequência dos quais lhe entregou, a título de sinal e princípio de pagamento, os montantes de Esc. 2.100.000$00 e de Esc. 1.670.000$00, contratos esses que foram assinados pelas partes sem que as respectivas assinaturas tivessem sido reconhecidas notarialmente, mas renunciando expressamente à invocação da nulidade daí decorrente, renúncia essa que não é admissível quanto à certificação, pelo notário, da existência de licença de construção ou de habitabilidade, omissão esta que é da responsabilidade da R. e que torna nulos os contratos, nulidade que acarreta a restituição do que tiver sido prestado.

  2. Regularmente citada, contestou a R. e, excepcionando a incompetência territorial do Tribunal do Porto, pugnando pela competência do Tribunal da Comarca de Matosinhos, aceita ter outorgado os contratos-promessa, aduzindo, todavia, que a A. os celebrou a título de mero investimento, jamais os pretendendo habitar ou celebrar os contratos prometidos, mas, ainda assim, convocou-a por duas vezes para a outorga da escritura definitiva, solicitando-lhe os elementos necessários para esse efeito, que ela não entregou, pelo que procedeu à rescisão dos contratos nos termos acordados, com a consequente perda dos sinais, para além de que a A. tinha conhecimento de que a obra não era clandestina e que a entidade competente já havia aprovado os respectivos projectos de arquitectura e especialidades, vindo a licença de construção a ser emitida em Janeiro de 2000, e que, quando foi notificada para a outorga das escrituras, já existia licença de habitabilidade, pelo que age com abuso do direito.

    Termina pela procedência da excepção e pela improcedência da acção, peticionando ainda a condenação da A. como litigante de má fé, no pagamento de multa e indemnização, esta não inferior a 500 Euros.

  3. Respondeu a A. no sentido da improcedência da excepção e concluindo como na petição.

  4. Tendo os autos sido remetidos ao Tribunal da Comarca de Matosinhos, que foi declarado territorialmente competente, em sede de audiência preliminar foi proferido despacho saneador com declaração da matéria assente e elaboração de base instrutória, que se fixaram sem reclamações.

  5. Após realização da audiência de discussão e julgamento, e sem que as respostas dadas à matéria de facto controvertida tivessem sido objecto de censura, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente com a consequente absolvição da R. do pedido.

  6. Inconformada, apelou a A. que, nas pertinentes alegações, apresenta as seguintes conclusões: 1ª: Vem o presente recurso interposto da sentença que absolveu a ré do petitório.

    1. : É um único o fundamento do presente recurso: a não existência, nem a respectiva certificação pelo notário, da licença de construção ou utilização ao tempo em que os contratos-promessa foram celebrados - o que, aliás, é confessado pela própria ré; 3ª: A autora celebrou com a ré dois contratos-promessa referentes a duas fracções autónomas do empreendimento pertencente à ré, sito no lugar de ….., Valongo.

    2. : A autora intenta a presente acção com um único fundamento - a falta de reconhecimento pelo notário da licença de construção ou utilização.

    3. : Os dois contratos foram assinados pelos promitentes vendedor e compradora, tendo os mesmos renunciado expressamente à invocação da nulidade dos contratos pelo facto de as assinaturas não estarem reconhecidas notarialmente.

    4. : Contudo, se as partes podem renunciar ao reconhecimento notarial das assinaturas, tem-se entendido que não podem prescindir da certificação, pelo notário, da existência de licença de construção ou de habitabilidade.

    5. : Portanto, não se pode renunciar a que o notário certifique, no contrato-promessa, a existência de licença de construção ou de habitabilidade, que tem que constar do contrato-promessa, expressamente, com referência ao número da licença, à validade e à entidade que emite tal licença.

    6. : E tal não consta expressamente do contrato - basta simplesmente ler o contrato e não consta lá qualquer referência, mas também se deve ter em conta a confissão da ré de que a licença só foi obtida posteriormente à data de celebração dos contratos - artigos 33º e 36º da contestação.

    7. : Ora, a não certificação pelo notário da existência de licença de construção ou utilização, corresponde à preterição de uma formalidade essencial do contrato, o que acarreta a nulidade da declaração negocial, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado - cfr. artº 289º do Código Civil.; 10ª: E é este pedido da autora - que se declarem nulos os contratos-promessa celebrados, por violação de formalidades essenciais, com a consequente devolução de tudo o que tiver sido prestado, em consequência do que foi prestado - as quantias entregues pela autora como sinal e princípio de pagamento.

    8. : Não se pode pretender dizer que a declaração de nulidade dos contratos-promessa não pode proceder porque está ao interesse gratuito da autora.

    9. : A declaração de nulidade afecta os contratos-promessa e todas as pessoas que directa ou indirectamente tenham alguma coisa a ver com tal contrato - não apenas a autora ou a ré.

    10. : Não serve a declaração de nulidade do contrato-promessa como forma de a autora se eximir ao que quer que seja, mas antes a um interesse público que não existam contratos que nunca poderiam vigorar, nunca poderiam produzir os seus efeitos - basta atentar-se que a nulidade dos contratos é invocável a todo o tempo, ao contrário na anulabilidade, que se não for arguida dentro...

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