Acórdão nº 06276/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelPAULO DE CARVALHO
Data da Resolução14 de Outubro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Espécie: processo pré-contratual.

Recorrente: Laboratórios A..., Lda..

Recorrido: Administração Central do Sistema de Saúde, IP.

Contra-interessados: B...– Sociedade Técnico Medicinal S. A., C...Farmacêutica, S. A..

Vem o presente recurso interposto do Acórdão que julgou improcedente o presente processo de contencioso pré-contratual.

Foram as seguintes as conclusões da recorrente:

  1. O Tribunal a quo andou mal na interpretação da realidade subjacente à presente acção e na forma como aplicou o Direito aos factos.

  2. Desde logo, porque entendeu que não foram violados requisitos técnicos mínimos para a selecção das Contra-lnteressadas para o fornecimento de medicamentos genéricos de Atorvastatina ao SNS.

  3. Pois, estando a ser discutida em tribunal a (in)validade das AIMs concedidas para os medicamentos genéricos de Atorvastatina em questão na presente acção, e determinando as peças do concurso que só poderiam ser seleccionados os medicamentos detentores de AIM válidas, nunca poderiam as Contra-lnteressadas ser seleccionadas para fornecer tais medicamentos ao SNS! d) Na verdade, sendo a existência de AIMs válidas um pressuposto fundamental para a selecção das Contra-lnteressadas, a pendência destas acções judiciais constitui uma verdadeira questão prejudicial que obrigava a ACSS a, pelo menos, ter suspendido o procedimento concursal relativamente às Contra-lnteressadas, ao abrigo do artigo 31.° do CPA, até que as respectivas acções tivessem sido julgadas.

  4. Mais ainda quando, em relação a uma das Contra-lnteressadas, a sua selecção foi efectuada com pressuposto numa AIM cuja eficácia se encontra suspensa por decisão judicial! f) O Tribunal a quo reconhece que o fornecimento de medicamentos genéricos de Atorvastatina dessa Contra-lnteressada ao SNS "não é, temporariamente, possível em virtude da suspensão das respectivas AIMs," g) Contudo, entende que "é suficiente, para o respeito da referida decisão judicial, que, enquanto se mantiver a medida cautelar decretada, se dê notícia aos serviços e instituições do Serviço Nacional e Saúde que pretenderem adquirir medicamentos de Atorvastatina de que o fornecimento de Atorvastatina C...não é, temporariamente, possível - desconsiderando injustificadamente os efeitos jurídicos resultantes do decretamento de uma providência cautelar de suspensão da eficácia de actos administrativos e comprometendo seriamente o efeito útil daquela decisão judicial.

  5. E, como se não bastasse, parte do pressuposto de que a impossibilidade de fornecimento de Atorvastatina C...será apenas temporária, dando desta forma por assente que a pretensão da Recorrente na acção administrativa especial de impugnação da validade das AIMs para esses medicamentos será julgada improcedente - o que é Inadmissível! i) Por outro lado, o Tribunal a quo efectuou uma incorrecta interpretação do artigo 6.° das Cláusulas Técnicas Especiais do Caderno de Encargos, relativo aos preços dos medicamentos em concurso, que estabelece a regra segundo a qual não serão seleccionados medicamentos cujo preço unitário proposto seja superior ao PVA (que, nos termos da lei, corresponde ao PVP deduzido do IVA e das margens de comercialização).

  6. E permitindo excepcionalmente que, ainda que não haja PVP aprovado para uma dosagem de um medicamento, esta possa beneficiar do PVP aprovado para outra dosagem do mesmo medicamento e assim ser seleccionada.

  7. Conclui a este respeito o Tribunal a quo que "da leitura conjugada dessas normas resulta que podem ser seleccionados medicamentos que não tenham preço de venda ao público (PVP) aprovado" - o que não é correcto! l) A inclusão deste requisito nas peças do concurso pela ACSS só poderá ser interpretada como tendo o intuito de incentivar a justa e equitativa concorrência entre os diferentes fornecedores de medicamentos ao SNS, bem como o de visar uma diminuição dos custos incorridos pelos cofres do Estado com a aquisição de medicamentos - aplicando-se, assim, a todos os medicamentos em concurso.

  8. Para além do mais - e atento o enquadramento legal aplicável à autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos e o respectivo regime de formação dos preços - não é claro como é que, em relação a alguns dos medicamentos genéricos em causa, as Contra-lnteressadas apresentaram propostas de preço superiores às apresentadas pela Recorrente para o respectivo medicamento de referência! n) E, considerando que nenhuma das Contra-lnteressadas indicou o respectivo PVA, não se compreende como se verificou o cumprimento do requisito do caderno de encargos segundo o qual não podem ser seleccionados medicamentos cujo preço unitário proposto seja superior ao PVA.

  9. Tendo as Contra-lnteressadas sido seleccionadas em violação dos requisitos constantes do Caderno de Encargos, o acto de selecção ora impugnado violou igualmente os princípios fundamentais da contratação pública inquinando todo o procedimento adjudicatório.

  10. Os actos ora impugnados violam ainda o dever de fundamentação dos actos administrativos, porquanto ao não ter indicado, sequer sucintamente, quais as razões de facto e de direito que se ponderaram para tomar a decisão não pode ser considerado um acto fundamentado ou, no mínimo, suficientemente fundamentado.

  11. Efectivamente, no presente caso, não é possível perceber-se, de forma clara e inequívoca como foram verificados o cumprimento dos requisitos dos Cadernos de Encargos (cfr. exigido pelo n.° 2 do artigo 123.° do CPA).

  12. Está em causa também a preterição de formalidades essenciais, tendo o próprio Tribunal a quo considerado que não foi adoptada a melhor metodologia pelo Júri do Concurso ao não ter feito qualquer referência no RFAP à selecção das Contra- lnteressadas para o fornecimento de medicamentos genéricos de Atorvastatina ao SNS.

  13. Finalmente, os actos cuja eficácia se requereu são ainda manifestamente ilegais em virtude de violarem direitos de propriedade industrial da Recorrente que correspondem a direitos fundamentais de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias.

  14. O próprio Tribunal a quo reconhece que a validade das AIMs apresentadas pelas Contra-lnteressadas constituiu pressuposto fundamental da sua selecção para o fornecimento de medicamentos genéricos de Atorvastatina às instituições e serviços do SNS - pelo que, na presente acção, não podia ter deixado de considerar o impacto que a questão da (ín)validade de tais AIMs tem necessariamente na validade dos actos em apreço - e daí retirar as devidas consequências; u) A concessão dessas AIMs ofende gravemente os direitos de propriedade industrial da Recorrente, consubstanciados na patente relativa à substância activa Atorvastatina de que esta é titular; v) E, no entanto, a ACSS não teve em consideração que esses direitos seriam violados pela selecção das Contra-lnteressadas para o fornecimento de medicamentos genéricos de Atorvastatina ao SNS, o que, por força da vinculação ao "bloco de legalidade" consignado no artigo 3.° do CPA a que as entidades públicas estão sujeitas, deveria ter obstado à selecção das Contra-lnteressadas relativamente aos medicamentos genéricos de Atorvastatina.

  15. Com efeito, quando as autoridades administrativas são confrontadas com a existência de direitos de particulares que colidem com os direitos que conferir a outros particulares, não devem actuar sem antes dirimir esse conflito ou esperar que o mesmo seja resolvido pela autoridade competente - e, se entenderem não ter competência para decidir a questão que tem de ser previamente resolvida, devem suspender o procedimento, até que a mesma seja decidida pelas autoridades competentes para o efeito.

  16. A selecção das Contra-Interessadas como fornecedoras dos medicamentos em causa constitui, assim, um atropelo grosseiro dos direitos da Recorrente, nomeadamente dos seus direitos de propriedade industrial.

  17. Pois, tendo sido esta a única entidade a preencher integralmente os requisitos técnicos e legais para a selecção como fornecedora de medicamentos com esta substância activa, irá contudo encontrar-se perante a concorrência ilegítima das Contra-lnteressadas no fornecimento desses medicamentos ao SNS, quando deveria encontrar-se numa situação de exclusividade.

  18. No exercício dos seus poderes, a ACSS demitiu-se do seu dever de respeito pelos direitos da Recorrente, determinando, assim, a invalidade dos actos ora impugnados, facto que o Tribunal a quo, pura e simplesmente, desconsiderou! aa) Pelo exposto, verifica-se que os actos ora impugnados padecem dos mais diversos vícios, os quais justificam a procedência da presente acção.

    Foram as seguintes as conclusões do recorrido: 1.ª No caso sub judice, o douto Tribunal a quo decidiu, e bem, pela improcedência de todos os vícios alegados pelo A., tendo considerado o acto impugnado válido e eficaz.

    1. A ACSS, atenta a presunção de legalidade dos actos administrativos, teria que considerar as AIMs atribuídas às Contra-Interessadas pelo INFARMED como actos válidos e eficazes.

    2. Não se presume a invalidade de um acto administrativo pelo mesmo estar ser impugnado judicialmente.

    3. A validade da AIM da C...não foi objecto de qualquer declaração de nulidade ou anulação do acto, foi suspensa provisoriamente por via judicial, na sequência de um pedido cautelar.

    4. É manifesto que a suspensão da eficácia da AIM da C...não acarreta qualquer impossibilidade de selecção dos concorrentes e celebração dos CPA ou violação de qualquer regra ou princípio da contratação pública, nem dos instrumentos do concurso.

    5. O mesmo se aplica mutatis mutandis à questão da alegada (in) validade das AIMs atribuídas pelo INFARMED às Contra-Interessadas, apenas e caso as mesmas sejam consideradas nulas ou anuladas judicialmente é que aquelas não poderão fornecer os respectivos medicamentos genéricos.

    6. O n.º 2 do art. 6º das Clausulas Técnicas Especiais – dispõe: “não serão seleccionados os medicamentos cujo preço unitário proposto seja superior ao preço de venda ao armazenista (PVA).

      ” 8.ª O n.º 4...

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