Acórdão nº 06392/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 01 de Julho de 2010

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução01 de Julho de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa que julgou procedente a presente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, intimando a aqui Recorrente a aceitar a inscrição no estágio das AA., sem dependência do exame de acesso ao estágio, a efectuar dia 30.03.2010.

Em alegações são formuladas as seguintes conclusões: 1. O legislador consagrou o meio processual de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias como subsidiário dos demais, apenas podendo ser utilizado quando, mesmo no caso legalmente previsto no artigo 131.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, em que a decisão cautelar é mais célere, a adopção da providência cautelar se afigurar impossível — por implicar o esvaziamento da lide principal — ou insuficiente — por, nos termos legalmente definidos, a tramitação do processo principal tornar juridicamente inútil a realização da justiça do caso concreto.

  1. Nos termos do artigo 190.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não está na disponibilidade das partes, apenas podendo ser utilizado nos casos em que esteja em causa o desaparecimento da pretensão jurídica, desaparecimento, esse, que não tem lugar no caso concreto.

  2. No caso concreto, a posição jurídica das Recorridas teria sido salvaguardada com o decretamento de uma providência cautelar que permitisse a realização da inscrição como advogadas estagiárias independentemente do resultado que obtivessem no exame nacional de acesso ao estágio, requerida nos termos dos artigos 112.º e 131.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

  3. A providência cautelar seria, então, acessória de uma acção administrativa especial com vista à declaração de ilegalidade do artigo 9.º-A do Regulamento Nacional de Estágio, com efeitos circunscritos ao caso concreto, nos termos do artigo 73.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, cuja não decisão nos prazos previstos para a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não implicaria a inutilidade superveniente da lide promovida pelas Recorridas.

  4. Em face da tramitação legalmente definida para este processo principal, a situação jurídica das Recorridas estaria acautelada aquando da emissão de uma pronuncia judicial sobre a validade da norma em causa.

  5. O preenchimento dos pressupostos de que depende a utilização da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não se compadece com a eventual demora processual na emissão de uma sentença no caso concreto, sob pena de este meio processual deixar de ser subsidiário e excepcional.

  6. Ao demorarem dois meses a requerer a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, sem que para tanto exista qualquer fundamento de facto concreto, é às Recorridas que deve ser imputada a condição de especial urgência que constituí pressuposto deste meio processual.

  7. A subsidiariedade e excepcionalidade da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias exigem a prévia certeza de que o meio tido por principal não é utilizável.

  8. A sentença recorrida presumiu que as Recorridas seriam aprovadas no exame final da primeira fase do estágio — o que constituí um facto incerto e insusceptível de verificação — com vista a alcançar a conclusão de que o meio processual era adequado.

  9. Ao admitir a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias como meio processual próprio, a sentença recorrida violou o artigo 109.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

  10. A permissão deste meio processual teve como efeito que a Ordem dos Advogados apenas tivesse três dias para preparar a respectiva resposta, enquanto as Recorridas tiveram dois meses para preparar o seu requerimento, no que fica irremediavelmente violada a igualdade das partes em processo.

  11. A competência regulamentar da Ordem dos Advogados em matéria de estágio e de acesso ao estágio não se limita à forma como serão assegurados os estágios ou ao modelo concreto da formação, à estrutura dos serviços, às competências, aos sistemas de avaliação, ao regime de acolhimento, à organização e à realização de exames e agregação nem, tão-pouco, à mera repetição dos enunciados legais previstos no Estatuto da Ordem dos Advogados.

  12. A autonomia regulamentar da Ordem dos Advogados é reconhecida no quadro dos interesses que lhe cabe salvaguardar, os quais são constituídos pelas atribuições expressamente consagradas no artigo 3.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, entre as quais se inclui zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de advogado, promovendo a formação inicial e permanente dos advogados e o respeito pelos valores e princípios deontológicos.

  13. A instituição de um exame nacional de acesso ao estágio ao abrigo do poder regulamentar da Ordem dos Advogados não restringe o direito de escolha e acesso à profissão consagrado na Constituição, tal como restringido pelo legislador no Estatuto da Ordem dos Advogados, antes estando em causa apenas uma matéria de colisão ou conflito entre posições jurídicas, para cuja composição a Ordem dos Advogados tem competência, ao abrigo do seu poder regulamentar, por não estar em causa matéria submetida à reserva de lei.

  14. Ao considerar que o artigo 9.º-A do Regulamento Nacional de Estágio não se integra na esfera de competência regulamentar da Ordem dos Advogados, do que resultaria a sua inconstitucionalidade, à luz do n.º 7 do artigo 112.º da Constituição, por falta de norma de habilitação nos artigos 184.º, n.º 2,187.º e 188.º, do Estatuto da Ordem dos Advogados, a sentença recorrida incorreu em erro na aplicação do Direito.

  15. Por outro lado, à luz da mesma fundamentação constante da sentença recorrida, saíram violadas as normas atributivas de poder regulamentar à Ordem dos Advogados sobre a matéria em causa, designadamente o artigo 184.º, n.º 2, do Estatuto da Ordem dos Advogados.

  16. O artigo 9.º-A do Regulamento Nacional de Estágio tem vocação universal, aplicando-se a todos os licenciados em Direito, os quais obtêm esse grau após a conclusão de um período de formação de oito semestres.

  17. Não se antevê que no futuro venham a requerer a inscrição na Ordem dos Advogados como advogados estagiários licenciados em Direito com cinco anos de formação académica, inexistindo, deste modo, termo de comparação entre duas situações que permita concluir pela violação do princípio da igualdade.

  18. Ainda que se admita que existirão no futuro licenciados em Direito anteriores à instituição do processo de Bolonha que requeiram, a sua inscrição como advogados estagiários, a instituição de um exame nacional de acesso ao estágio aos candidatos que apresentem uma formação de duração inferior a cinco anos é adequada e necessária a aferir, por um lado, e garantir, por outro, que tais candidatos possuem os conhecimentos jurídicos necessários a...

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