Acórdão nº 0201/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução30 de Junho de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A…, com os demais sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (a fls. 87/92), que julgou improcedente a reclamação que deduziu, ao abrigo do disposto nos artigos 276º e seguintes do CPPT, contra o despacho que ordenou a penhora dos seus bens no processo de execução fiscal nº … e apensos, contra si revertido.

Terminou a sua alegação enunciando as seguintes conclusões: A O recorrente insurge-se contra a decisão de primeira instância que, assentando numa errada interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, julgou, por um lado, não se encontrarem prescritas as dívidas exequendas revertidas (IRC de 2000 e 2001, IVA 2000, 2001 e 2002) e, por outro, irrelevar a falta de notificação do despacho de reversão aos mandatários judiciais constituídos no processo.

B Desde logo, errou a sentença recorrida na interpretação e aplicação dos artigos 48.° e 49.° da Lei Geral Tributária (doravante L.G.T.) e na subsunção aos mesmos à factualidade provada nos autos.

C Na verdade, e não obstante ter considerado assente que, em 14/09/2001, foi emitido o aviso-citação da sociedade devedora (facto 3), a decisão a quo não deu como provado qualquer facto relativo à sociedade devedora originária susceptível de determinar a interrupção do prazo prescricional.

D O facto interruptivo, atenta a ratio do artigo 49.° n.° 1 da L.G.T. e do próprio instituto da prescrição, é tão só, mas não menos, a efectiva e regular citação pessoal da executada originária - que não ficou provada nem por qualquer modo demonstrada - donde se pudesse presumir ou ter por certa a susceptibilidade do seu conhecimento.

E Ora, apenas a citação, enquanto acto pessoal e receptício, cuja função é dar conhecimento ao destinatário (neste caso, a devedora originária) que contra ele corre termos um processo de execução fiscal, chamando-o à execução e fazendo iniciar o prazo para deduzir oposição e exercer os demais direitos que lhe são facultados, explica e justifica a interrupção do prazo prescricional.

F A emissão ou mesmo a expedição da carta - aviso para citação (que, aliás, se deve considerar como meramente provisória) não tem qualquer relevância interruptiva do prazo prescricional em curso, até porque não permite presumir, garantir ou ter por assente que o destinatário teve ou pôde ter conhecimento que contra ele foi instaurada a execução.

G Não decorre, além do mais, do probatório que a citação tenha sido pessoal, em cumprimento do artigo 191.° do C.P.P.T. (que fixa em 250 UC o limite para além do qual a citação tem de ser pessoal).

H Sendo certo que, apesar de este admitir a citação por simples postal no caso de dívidas exequendas de valor relativamente baixo - que, de qualquer modo, não é o caso, por estarem em causa centenas de milhares de euros - deverá considerar-se, na esteira da melhor doutrina, que não se trata aqui de uma verdadeira citação, até porque o artigo 193.° n.º 2 do C.P.P.T. impõe a citação pessoal do executado, aquando da penhora.

I Não poderia, pois, a sentença recorrida ter considerado interrompido o prazo prescricional, por não ter base factual dada como provada para assim o concluir.

J Acresce, por outro lado, que a decisão a quo interpretou e aplicou erroneamente a lei, quando considerou que este pretenso efeito interruptivo seria oponível ao revertido, não obstante a reversão ter ocorrido em meados de 2009, pois “considerando os prazos de pagamento voluntário constantes das certidões de dívidas revertidas (2004 e 2006), verifica-se que a citação do responsável subsidiário não ocorreu após o 5° ano posterior”.

K Erra, assim, ao convocar, para a aplicação do artigo 48.° n.° 3 da L.G.T., os prazos de pagamento voluntário de dívidas relativas aos exercícios de 2004 e 2006, não constando do probatório qualquer elemento relativo ao concreto ano da liquidação, sendo que o termo do pagamento voluntário tanto se poderá referir ao prazo subsequente à notificação das liquidações (artigos 84.° e ss do C.P.P.T.) como se poderá referir, num sentido mais lato, ao prazo de 30 dias após a citação.

L Erra também, porquanto as dívidas a que a sentença a quo se reporta, nesta sede, não foram objecto de reversão contra o recorrente (apenas foram revertidas as dívidas correspondentes aos anos de 2000 a 2002).

M E erra ainda no cômputo do prazo dos cinco anos referido no artigo 48.° n.° 3 da L.G.T., quando é certo que a melhor interpretação deste impõe que a contagem deste prazo se faça a partir do ano a que se reporta efectivamente a liquidação e assim, a partir de 2000, 2001 e 2002, respectivamente, posto serem estes (e não outros) os anos das liquidações subjacentes às dívidas exequendas revertidas.

N Assim, a pretensa citação do recorrente, ocorrida em 2009 (a existir e considerar-se perfeita e eficaz) é muito posterior aos indicados 5 anos, não produzindo, pois, efeitos interruptivos da prescrição quanto a este.

O Pelo que, se acaso tivesse ocorrido algum efeito interruptivo anterior relativo à sociedade originária (e não existe, como já se demonstrou), sempre seria forçoso concluir pela inoponibilidade de tal efeito ao aqui recorrente, por força do artigo 48.° n.° 3 da L.G.T.

P Finalmente, errou ainda a sentença ao considerar desnecessária, com base numa equiparação sem fundamento legal, a notificação do despacho final de reversão aos mandatários constituídos no respectivo procedimento administrativo.

Q O ora recorrente, aquando da apresentação da defesa em sede de audição prévia no procedimento de reversão, constituiu mandatários judiciais, outorgando procuração forense que oportunamente foi junta aos autos.

R Por força do disposto no artigo 40.° do C.P.P.T., o despacho de reversão - acto administrativo inserido num procedimento - deveria ter sido notificado aos mandatários judiciais, na pessoa destes e no seu escritório, sob pena de ineficácia do próprio acto.

S No entanto, o despacho de reversão não foi notificado a qualquer dos mandatários que, assim, não puderam ter conhecimento da decisão final do respectivo procedimento, que fundamentou a citação.

T A falta de notificação ao mandatário do recorrente do despacho final de reversão - ao arrepio do expressamente consagrado no artigo 40.° do C.P.P.T. - configura uma nulidade, conforme decorre do artigo 201.° do C.P.C., inquinando os actos subsequentes do mesmo, incluindo a penhora e a própria citação, por influir decisivamente no exame e na decisão da causa.

U Aliás, preterida que foi uma formalidade legal, sempre o acto se teria por anulável, determinando a nulidade dos actos consequentes (e assim, da própria citação).

V Por outro lado, viola também o direito à tutela jurisdicional efectiva e de acesso ao direito consagrado no artigo 20.° da C.R.P., que abarca o direito de defesa, de constituir e ser representado por mandatário judicial, no âmbito de um qualquer procedimento ou processo, e de se fazer acompanhar por um advogado perante qualquer autoridade (cfr. também artigo 62.° do Estatuto da Ordem dos Advogados e artigo 6.° do C.P.P.T.) - tendo o recorrente e o seu mandatário confiado que todos os actos do procedimento, maxime o final, seriam notificados a este último, permitindo, assim, o exercício atempado dos direitos que aquele assistiam.

W Pelo que, não poderá o acto de reversão produzir quaisquer efeitos e, se não nulo ou anulável, mostra-se pelo menos ineficaz, não podendo servir de base ou título executivo contra o ora recorrente, nem de fundamento a própria citação, que deverá considerar-se, por isso, nula e também ela insusceptível de produzir efeitos jurídicos.

X Não pode, pois, aceitar-se, como o fez a...

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