Acórdão nº 398/1999.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Julho de 2010

Data01 Julho 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA DOS RÉUS E NEGADA A REVISTA DA AUTORA Sumário : 1. Tendo a autora reduzido o seu pedido de indemnização por danos não patrimoniais aos decorrentes da ansiedade e grande pavor que sofreu pelo erro médico verificado, após ter sido informada que poderia ficar paralisada, não pode a Relação, motu proprio, atribuir-lhe quantia indemnizatória pelas dores que apurou terem resultado daquele dito erro.

  1. A violação do contrato de prestação de serviços médicos acarreta responsabilidade civil (contratual) desde que o devedor da prestação (in casu, o médico) tenha agido voluntariamente, com culpa, tenha havido dano e exista nexo de causalidade entre o facto culposo e este. Incumbindo ao devedor provar, depois de apurada a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso, que estes não provêm de culpa sua.

  2. A prova do nexo causal, como um dos pressupostos da obrigação de indemnizar e medida da mesma, cabe ao credor da obrigação, independentemente da sua fonte.

  3. Pelo que o doente tem de provar que um certo diagnóstico, tratamento ou intervenção foi omitido e conduziu ao dano, sendo certo que se outro acto médico tivesse sido (ou não tivesse sido) praticado, teria levado á cura, atenuado a doença, evitado o seu agravamento ou mesmo a morte, consoante o caso.

  4. Sendo necessário estabelecer uma ligação positiva entre a lesão e o dano, através da previsibilidade deste em face daquela.

  5. O juízo de causalidade, considerado que seja numa perspectiva meramente naturalística, insere-se no domínio da matéria de facto, sendo, assim, insindicável por este STJ.

  6. Estando, contudo, dentro dos poderes de cognição deste mesmo Tribunal apreciar se a condição de facto que não ficou determinada, constitui, afinal, causa adequada do evento lesivo, inserindo aquele juízo naturalístico nos princípios vertidos no art. 563.º do CC.

    Decisão Texto Integral: ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA veio intentar acção, com processo ordinário, contra C... – CLÍNICA DA OURA, LDA e BB, pedindo a condenação solidária destes a pagar-lhe a quantia de 4.087.790$00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

    Alegando, para tanto, e em suma.

    Após uma queda, no dia 1/3/97, foi assistida pelo 2.º réu, na clínica da 1ª ré, em 3/3/97, onde permaneceu até ao dia 5 seguinte, queixando-se de fortes dores, com incapacidade para a marcha e diminuição da força muscular em ambos os membros inferiores, tendo-lhe sido realizados exames de rotina e RX lombar.

    A A. continuou, no entanto, a sofrer de dores que a impediram de viajar, de imediato para a Alemanha, onde, uma vez aí chegada, consultou um ortopedista que constatou encontrarem-se quebrados os corpos das vértebras lombares nºs 1 e 5, o que lhe determinou imobilização total durante três semanas e uso de colete de protecção, com realização de ginástica correctiva e fisioterapia, tendo corrido grave risco de paralisia, com perturbação das funções vegetativas.

    Aquando do seu internamento, revelavam-se indispensáveis cuidadosos exames radiológicos de pormenor e análises, cuja omissão configura um crasso erro médico.

    Era pessoa saudável anteriormente ao acidente, sendo que, actualmente, as 1ª e 5ª vértebras ficaram reduzidas.

    Continua a sofrer dores, ficou com uma IPP de 20% e ficou a padecer de terrores, angústia e pânico, com a perspectiva de se ver paralisada.

    Despendeu € 437,96 (equivalente a 87.790$00) com o prolongamento da estadia em Portugal e em consultas médicas na Alemanha.

    Citados os réus, vieram contestar, alegando, também em síntese: Do internamento na clínica da ré não resultou para a A. qualquer situação que lhe possa ter determinado medo ou angústia.

    Não houve, por banda do 2º réu, qualquer erro médico ou omissão de diagnóstico, tendo-lhe sido efectuados os exames e observações adequados no momento, tendo ficado combinado, com o médico do ADAC , e face à melhoria do estado da doente, que os exames de pormenor seriam realizados na Alemanha.

    Foi proferido o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

    Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho de fls 834 a 836 consta.

    Foi proferida a sentença, na qual, na improcedência da acção, foram os réus absolvidos do pedido.

    Inconformada, veio a autora interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Évora, onde, por acórdão de 15/12/2009, e na sua parcial procedência, foram os réus condenados a pagar à autora, a título de indemnização, por danos não patrimoniais, a quantia de € 5 000, acrescida de juros, contados a partir da data de tal decisão.

    Irresignados, vieram, A. e RR pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça.

    Formulando a A., na sua alegação as seguintes conclusões: 1ª - A razão de interposição do presente recurso decorre de a A. não concordar com o douto Acórdão proferido na Relação de Évora por considerar a A. que se provou o nexo de causalidade entre a omissão do diagnóstico e a produção dos danos e que não é adequada a indemnização atribuída a titulo de danos morais face aos danos padecidos por aquela.

    1. - O direito aos cuidados de saúde está consagrado na Constituição da República Portuguesa.

    2. - Entre a A. e a 1ª R. foi celebrado um contrato de prestação de serviços médicos, nos termos do qual aquela solicitou á R. o diagnostico do seu mal estar físico, estando implícito como é de conhecimento das ciências médicas, o tratamento da doença ou, pelo menos, o seu inicio e posterior encaminhamento para estabelecimento adequado, mediante o pagamento de um preço.

    3. - No caso dos autos existe um défice de zelo, de prudência e de cuidado que é susceptível de merecer um juízo de reprovação ou censura. O estabelecimento de saúde e o médico podiam e deviam ter procedido de modo diferente, para tanto bastava terem realizado específicos exames médicos, incluindo exames radiológicos, que a serem feitos teriam detectado as lesões que a A. apresentava nas vértebras e teriam evitado o aperto nos canais vertebrais, a tardia imobilização desta, as dores que esta até hoje sente e a incapacidade que se encontra fixada em 20 % 5ª - A actuação dos R.R. ao não terem realizado os exames adequados e indispensáveis para diagnosticar as lesões pela A. A. apresentada, consubstancia uma omissão ilícita e culposa 6ª - 0 tratamento prestado pela 1ª Ré e pelo 2.º Réu foi deficiente e insuficiente, tendo omitido certos tratamentos necessários ou os meios pelos Réus utilizados foram deficientes, e em consequência disso, o dano produziu-se, tal resultado não se verificaria se outro fosse o acto médico praticado 7ª - As lesões que a Autora sofreu foram consequência do acidente de que foi vitima e devido ao qual foi observada pelos R.R. sendo evidente que o deficiente diagnostico feito por aqueles foi o único responsável pelo agravamento de saúde da A.

    4. - Assim sendo, existe uma relação de causalidade adequada entre a omissão de diagnóstico e a produção dos referidos danos assim como as dores sofridas pela A.

    5. - No exercício de uma qualquer actividade perigosa (como sucede com a actividade médico em geral) cumpre a quem a exerce mostrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de evitar danos a outrem – art. 493.º, nº2, e 799.º, nº 1, do C. Civ. - quando assim não aconteça fica o incumpridor obrigado a reparar os danos causados ao terceiro, nos termos dos arts 493.º, nº 2, 798° e 800º, nº 1, todos do C. Civ 10ª- Tendo se provado que não foram realizados os exames médicos necessários tanto assim é que a A. continuou a sofrer de dores, o que a impediram de viajar de imediato para a Alemanha, onde consultou um ortopedista que constatou encontrarem-se quebrados os corpos das vértebras lombares nºs 1 e 5, pelas lesões ocorridas quando a A. caiu no quarto do hotel, pelo que os danos e prejuízos sofridos pela A. , foram em consequência da intervenção médica, que se deveu a conduta faltosa por parte dos R.R. , devendo estes ser responsabilizados pela reparação.

    6. - Os R.R. têm que ser responsabilizados civilmente pelos prejuízos causados à A. por se ter feito prova que existe um nexo causal entre o deficiente diagnóstico e a produção dos danos e das dores que até hoje a A. continua a sofrer de dores, o que a impediram de viajar de imediato para a Alemanha, onde consultou um ortopedista que constatou encontrarem-se quebrados os corpos das vértebras lombares n.ºs 1 e 5, lesões ocorridas quando a A. caiu no quarto do hotel, tal fracturas não foram detectadas por os R. R. por não terem sido realizados os exames médicos necessários 12ª- A fixação do quantum indemnizatório deve "ter um alcance significativo e não meramente simbólico.

    7. - Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

    8. - 0 montante da indemnização deve ser fixado atendendo aos danos patrimoniais sofridos pela A. e que se traduzem na angústia, terrores, pânico de ficar paralítica e nas dores que sofreu e ainda hoje sofre.

    9. - A indemnização por danos não patrimoniais visa compensar realmente o lesado pelo mal causado, donde resulta que o valor da indemnização deve ter um alcance significativo e não ser meramente simbólico, para assim se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT