Acórdão nº 03976/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelJOSÉ CORREIA
Data da Resolução15 de Junho de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo:I.- RELATÓRIO 1. A FAZENDA PÚBLICA, vem interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A..., ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO, SA, contra a liquidação de IRC relativo ao exercício do ano de 1996.

Em alegação, a recorrente formula conclusões que se apresentam do seguinte modo: “I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a impugnação à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, por ter considerado que foi produzida prova que demonstra terem sido efectuadas diligências para o recebimento do crédito que a Impugnante detinha sobre a B..., S.A., e sobre o qual constituiu provisão para créditos de cobrança duvidosa, bem como, que se verificou vício de violação de lei, em virtude de considerar que o conjunto da prova documental e testemunhal produzida, é susceptível de colocar em dúvida séria, fundada a fundamentação que suportou a correcção relativa à provisão do crédito no montante de 12.214.217$00, constituída sobre a sociedade C..., Lda, nos termos do artigo 100.°, n.° l do CPPT.

II - Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em determinar se efectivamente a prova testemunhal, atenta a prova documental constante dos presentes autos, é suficiente para só de "per si", comprovar a efectivação de diligências de cobrança dos créditos objecto dos presentes autos, a fim de que seja possível a constituição de provisões sobre os mesmos, nos termos do disposto na alínea c) do n.° l do art.° 34.°, conjugado com a alínea a) do n.° l do art.° 33.°, bem como do disposto no art.° 23.°, todos do CIRC, bem como para colocar a fundada dúvida sobre a correcção efectuada à provisão constituída sobre a empresa C..., Lda, a qual os Serviços de Inspecção Tributária consideraram que existia a garantia real de cobrança do crédito em mora, nos termos do disposto na alínea b) do n.° 3 do art.° 34.° do CIRC, não existindo risco efectivo de incobrabilidade.

III - No que se refere às correcções efectuadas a provisões que não foram aceites como custos, e que dizem respeito a créditos sobre a Sociedade Gestora Alto do Lumiar, S.A., no valor de 92.514.798$00, os Serviços de Inspecção Tributária entenderam que os mesmos não se podiam considerar de cobrança duvidosa nos termos do n.° l do art.° 34.° do CIRC, em virtude de a Impugnante não ter demonstrado a existência de diligências com vista ao seu recebimento, bem como pelo facto de o valor total da dívida ter vindo a diminuir sucessiva e substancialmente, sendo que em 31 de Dezembro de 1996, cerca de 50% do saldo correspondia a facturação recente (menos de 6 meses), bem como pelo facto de a manutenção de fornecimentos demonstrar a expectativa de recebimento.

IV - Com efeito, para cumprimento da alínea c) do n.° l do art.° 34.° do CIRC, os créditos deverão estar em mora há mais de 6 meses desde a data do respectivo vencimento (situação comprovada) e existam provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento (situação não comprovada documentalmente).

V -Por outro lado, também não é indiferente para efeitos fiscais, que uma sociedade devedora cumpra com as suas obrigações financeiras mais recentes, em prejuízo das mais antigas, ao contrário daquilo que é aceite pelo douto Tribunal "ad quo".

VI - Neste desiderato, a prática comercial descrita, não aponta para a improbabilidade do pagamento dos créditos por parte do devedor, não havendo em consequência qualquer associação a risco da incobrabilidade das dívidas.

VII -A utilização de provisões desenquadrada da realidade previsível, terá como consequência um falsear dos resultados finais e do rendimento a tributar desde logo por uma possível criação de reservas ocultas.

VIII - Constituindo a provisão um custo do exercício para efeitos fiscais, não pode a sua constituição fazer-se a belo prazer do contribuinte e desta forma permitir-se manipular os resultados do exercício.

IX - Nos termos do disposto no art.° 34.°, n.° l, alínea a), conjugado com o art.° 23.° ambos do CIRC, a prova testemunhal é insuficiente para comprovar a indispensabilidade do custo para "realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora", e necessitará sempre de qualquer meio complementar de prova.

X - Efectivamente, quando esteja em dúvida a indispensabilidade de um custo, e portanto a sua dedutibilidade nos termos do art. 23.° do CIRC, como no caso em apreço, ao sujeito passivo cabe um verdadeiro ónus. Tem entendido a jurisprudência que "a indispensabilidade dos custos a que se alude no art. 23° do CIRC não se presume, cabendo ao contribuinte demonstrá-la, nos termos do n°1 do art. 342° do Código Civil" - Ac. TCA, secção do Contencioso Tributário, de 15/06/1999, Proc. 1712/99.

XI - Pelo que, deveria a Impugnante ter demonstrado através de prova documental, as diligências efectuadas para cobrança destes créditos, o que efectivamente não foi feito, pois, certamente que o legislador fiscal, quando tornou dependente como consideração de créditos de cobrança duvidosa, a existência de provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento, certamente não tinha no seu espírito que tais provas se pudessem limitar a meras declarações verbais, as quais certamente não permitiriam o controle por parte da Administração Fiscal, se tais diligências teriam sido levadas a efeito ou não.

XII - Pelo que, no caso concreto, a prova testemunhal nunca permitiria, por si só, isto é, desacompanhada de outros elementos, designadamente documentais, que se desse como provado a efectivação de diligências de cobrança desses créditos.

XIII - Pelo que não se afigura, tendo em conta a imperiosa necessidade imposta por lei da demonstração da necessidade da provisão por impossibilidade de cobrança do crédito, atento que a relevância de tal provisão não se repercute só, nem essencialmente, ao nível das relações entre a Impugnante e a sua devedora, mas entre a Impugnante e terceiros, no caso a Administração Fiscal, a quem tem de esclarecer fundadamente e sem margem para dúvidas, ter diligenciado a cobrança do crédito em causa, que tal prova possa ser efectuada, através de mera prova testemunhal.

XIV - Tal é também o entendimento a este propósito plasmado no "Código de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas de 1990, Comentado e Anotado", em anotação ao artigo 34. °, a fls. 181, ponto 3 -in fine, bem como do douto Acórdão do TCA Sul, no âmbito do Proc. 7160/2002, de 01-04-2003.

XV - Por outro lado, do depoimento das testemunhas arroladas, também não resulta prova cabal que permita aferir que tais diligências foram efectivamente levadas a efeito, já que por estas foi dito que os contactos para recebimento destes créditos eram feitos pelo Administrador que estava na B..., e nenhuma destas testemunhas ouvidas, era esse Administrador, portanto nenhuma delas tinha conhecimento directo dos factos.

XVI - No que contende à correcção efectuada, à provisão do crédito no montante de 12.214.217$00, sobre a Sociedade "C..., Lda", somos da opinião que o douto Tribunal "ad quo", estribou a sua fundamentação na errónea apreciação e valoração da prova produzida nos autos e na interpretação dos preceitos legais aplicáveis, em clara e manifesta violação do disposto no art.° 34.°, n.° 3, alínea b) do CIRC.

XVII - Com efeito, resulta do relatório de inspecção que, na situação em apreço, existe a garantia real de cobrança do crédito em mora nos termos da alínea b) do n.° 3 do art.° 34.° do CIRC, não havendo em consequência qualquer risco de incobrabilidade, não podendo por este motivo, o reforço da provisão com base na dívida a receber da empresa C... ser aceite para efeitos fiscais.

XVIII - Acresce ainda, que a Impugnante, sempre teria direito de retenção sobre as quantias de que era devedora à empresa C..., Lda, no caso de esta não lhe pagar os créditos que detinha sobre aquela, pelo que, a prova testemunhal produzida, não é susceptível de colocar a dúvida séria sobre a natureza dos créditos da Sociedade C..., Lda sobre a Impugnante e da Impugnante sobre esta, os quais constavam da contabilidade da Impugnante e foram analisados pelos Serviços de Inspecção Tributária.

XIX - Pelo exposto, somo de opinião que o douto Tribunal "ad quo" esteou a sua fundamentação na errónea apreciação e valoração da prova produzida nos autos e na errónea apreciação das razões de facto e de direito que se encontram subjacentes às correcções efectuadas à ora Impugnante, com referência ao exercício de 1996, e em clara e manifesta violação dos requisitos legalmente consignados no âmbito do disposto na alínea c), do n.° l do art.° 34.°, conjugado com a alínea a) do n.° l do art.° 33.°, bem como do disposto no art.° 23.°, e em clara e manifesta violação do disposto no art.° 34.°, n.° 3, alínea b), todos do CIRC.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a Impugnação improcedente, com as devidas consequências legais.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.” Houve contra -alegações com as seguintes conclusões: “A. Ora, não obstante o esforço argumentativo no plano teórico revelado pela ora Recorrente, numa tentativa de subsunção dos factos ao direito concretamente aplicável ao caso em apreço, o certo é que a ora Recorrente faz uma interpretação errada da factualidade subjacente.

  1. Com efeito, decidiu bem a sentença ora recorrida.

  2. Em primeiro lugar, relativamente à provisão efectuada sobre os créditos da B...foi dada como matéria assente nas alíneas J) e L) do probatório da decisão ora recorrida, que a ora Recorrida procedeu a diversas diligências para a cobrança dos seus créditos.

  3. Aliás, a própria Administração Fiscal no seu relatório de inspecção tributária reconhece a existência destas diligências de...

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