Acórdão nº 0344/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelJORGE LINO
Data da Resolução19 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1.1 “A…, SA” vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, em que, nos presentes autos de reclamação de actos do órgão da execução fiscal, «nega-se provimento à reclamação reafirmando-se o despacho reclamado».

1.2 Em alegação, a recorrente formula as seguintes conclusões.

  1. A ora recorrente reclamara contra a penhora dos seus créditos sobre clientes, porquanto havia oferecido garantia e nunca a Administração Fiscal se pronunciou sobre a mesma, nem a notificou sobre a sua decisão.

  2. Alegou ter havido violação do direito de contraditório.

  3. E alegou que a decisão do órgão fiscal era nulo, por ser ilegal, por não ter sido dada oportunidade à recorrente para se pronunciar.

  4. A douta decisão veio fundamentar que o facto de a ora recorrente ter apresentado garantia e de sobre a mesma o Serviço de Fianças não se ter pronunciado que não coarcta os direitos daquela.

  5. O que está errado, com o devido respeito, pois os direitos da recorrente foram coarctados, tendo-lhe sido efectuadas penhoras quando a mesma ofereceu garantia e sem que nada lhe tenha sido comunicado.

  6. Violou a douta sentença o disposto nos artigos 266° e 268° da CRP, em especial o disposto no n° 3 deste último artigo.

  7. Havendo lugar à garantia, não há lugar a penhora.

  8. Pelo que também errou a douta sentença ao confundir o disposto no art° 215º com o art° 169° CPPT.

  9. Não houve fundamentação que tivesse sido notificada à recorrente.

  10. Assim, a douta sentença, ao alegar que houve fundamentação, errou, violando o disposto no art° 125° CPA.

    Termos em que, revogando ou anulando a douta decisão, se fará justiça.

    1.3 Não houve contra-alegação.

    1.4 O Ministério Público neste Tribunal emitiu o parecer de que o recurso merece provimento – apresentando a seguinte fundamentação.

    As conclusões das alegações delimitam o âmbito do recurso. A Recorrente alega em síntese que: – A decisão recorrida ao “fundamentar que o facto da ora recorrente ter apresentado garantia e de sobre a mesma o Serviço de Finanças não se ter pronunciado que não coarcta os direitos daquela”, viola os artigos 266° e 268° da CRP.

    – “Havendo lugar a garantia não há lugar a penhora” como resulta do disposto no artigo 169° do CPPT.

    – A sentença recorrida ter entendido, erradamente, estar devidamente fundamentado o acto da Administração Fiscal que considerou não terem idoneidade os bens indicados para reforço da garantia.

    O artigo 169° do CPPT prevê a suspensão de execução até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195º ou prestada nos termos do artigo 199º, ambos do CPPT, ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido.

    Foi dado como provado que a ora Recorrente demonstrando ter deduzido oposição e impugnação, “requereu, em 19-11-2007, a suspensão da execução oferecendo à penhora cinco bens imóveis.” (ponto C do probatório). A Recorrente constituiu hipoteca voluntária sobre aqueles bens, requerendo que “após averiguação da idoneidade da garantia prestada” se suspendesse a execução (ponto E do probatório).

    O Órgão de Execução Fiscal suspendeu a execução enquanto aguardava informação sobre o valor de um dos imóveis, esclarecendo logo a Recorrente que caso o valor total a garantir não fosse coberto pelo valor dos imóveis, seria “notificada para proceder ao reforço de tal garantia sob pena de, não o fazendo, os autos prosseguirem os termos normais até à garantia de tal valor” (ponto F do probatório).

    O OEF, por despacho de 27/09/2007, entendeu mandar reforçar a garantia em € 546 821,46, determinando a notificação da Recorrente para, no prazo de 30 dias, proceder àquele reforço, sob pena de “tal não acontecendo, interrompe-se a suspensão da execução e a mesma prosseguirá os seus termos” (ponto G do probatório).

    A Recorrente, respeitando aquele prazo, veio oferecer, para reforço da garantia prestada, oitenta e cinco contentores reforçados, no valor estimado de € 637 500,00 (ponto K do probatório).

    Este requerimento só veio a ser apreciado por despacho de 24/11/2009, já depois de ter sido ordenada a remoção da suspensão da execução e o desenvolvimento de todas as diligências necessárias conducentes à obtenção de bens e ou direitos que se mostrassem suficientes para garantir o montante em falta (pontos H e L do probatório).

    Podemos assim concluir da matéria de facto dada como provada que, por um lado a Recorrente satisfez, atempadamente, a determinação recebida no sentido de reforçar a garantia e, por outro, a Administração Fiscal, entidade com competência para apreciar a idoneidade das garantias, nos termos do n° 8 do artigo 199º do CPPT, só procedeu a tal apreciação cerca de 2 anos depois e após ter ordenado a remoção da suspensão da execução e ordenado a penhora de créditos.

    A apreciação da idoneidade do reforço da garantia constitui um acto em matéria tributária, que pode afectar os direitos e interesses legítimos do contribuinte, pelo que só produz efeito em relação a este quando lhe seja validamente notificado. É o que resulta do artigo 36°, n° 1 do CPPT e emerge do n° 3 do artigo 268° da CRP ao estabelecer que “os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos.” Se Administração Fiscal tivesse apreciado a idoneidade do reforço de garantia em devido tempo e sempre antes de ordenar a penhora de créditos, a Recorrente poderia reagir contra esse despacho através de reclamação ou, muito simplesmente, oferecer outros bens ou direitos em substituição dos apresentados.

    Ao contrário da decisão recorrida, entendemos que a omissão da apreciação da idoneidade do reforço da garantia e a sua notificação à Recorrente, constitui formalidade prescrita na lei que pode influir no exame da causa, sendo por isso mesmo geradora de nulidade.

    1.5 Tudo visto, cumpre decidir, em conferência.

    Em face do teor das conclusões da alegação, bem como da posição do Ministério...

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