Acórdão nº 0734/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2010

Data19 Maio 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A..., com os sinais dos autos, não se conformando com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21 de Abril de 2009 (fls. 210 a 220), que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente o recurso interposto do despacho de 13/11/2008 do Director de Finanças de Lisboa que decidiu fixar-lhe o rendimento tributável em sede de IRS no ano de 2004 com recurso a avaliação indirecta, ao abrigo do disposto nos artigos 87.º, alínea d) e 89.º da LGT, dele vem, nos termos dos números 2 e 3 do artigo 280.º e artigo 284.º do CPPT, interpor recurso para este Supremo Tribunal, por oposição com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 4 de Março de 2008, proferido no recurso n.º 2259/08, formulando as seguintes conclusões: A. O douto acórdão recorrido não fez a interpretação conforme o espírito do legislador no que se refere à desconsideração do montante do crédito bancário, para calcular o valor base para efeitos de determinação do rendimento padrão, estribando a posição no acórdão deste douto TCA Sul, datado de 20.03.2007 – proc.° n.° 1678/07.

  1. A recorrente defende posição contrária, estribada em jurisprudência mais recente, deste mesmo douto tribunal, fazendo referência ao acórdão de 04.03.2008, proc.° n.º 02259/08, jurisprudência segundo a qual, na aquisição de imóvel pelo preço de 375.000 euros, com recurso ao crédito de 250.000 euros, em que o montante de 125.000 euros restante, cai fora do âmbito de incidência do artigo 89.°-A da LGT.

  2. O douto acórdão recorrido não faz a interpretação das diversas normas do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária em obediência ao definido nos números 1, 2 e 3 do artigo 9.º do Código Civil.

  3. Da motivação do douto acórdão recorrido não se alcança porque é que "... na letra da lei não se prevê que se subtraia ao valor da aquisição o valor justificado por outras fontes para calcular o rendimento padrão", quando a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, de acordo com o n.º 1 do artigo 9.º do CC.

  4. O pensamento legislativo, não será decerto, o de considerar a totalidade do valor da aquisição, para determinar o rendimento padrão, como se defende no douto acórdão recorrido, por resultar totalmente distorcida a aplicação da norma, como aconteceria no caso da aquisição de imóvel por 375.000 euros com recurso ao crédito de 374.999 euros, sendo a parte excedente 1 euro, em que a disponibilidade necessária do adquirente seria apenas de 1 euro, e o encargo com o pagamento do crédito é igual ao da situação em que o mútuo é de 375.000 euros.

  5. As implicações fiscais são de uma diferença chocante; no primeiro caso o rendimento padrão é de 75.000 euros e no segundo é zero.

  6. A norma ínsita no n.° 4 do artigo 89.°-A da LGT não pode ter outra interpretação distinta da que foi dada no acórdão do TCA Sul, in proc.° n.º 02259/08, de 04.03.2008 do Exmo. relator José Correia, uma vez que ao remeter para as situações previstas no n.° 1, pretende acautelar que situações, substancialmente diferentes, tenham um tratamento tributário diferente, como se demonstra pelos exemplos referidos nas alegações, onde se inclui o referido nestas conclusões, sob pena de existirem graves incongruências na aplicação da norma.

  7. Ao fazer a interpretação da norma ínsita no artigo 89.°-A, (em especial os n.°s 3 e 4 da LGT), no sentido em que o fez, o douto acórdão recorrido violou normas constitucionais, designadamente, os artigos 13.º/1 e 104.º/3 da CRP.

    I. Noutro aspecto em que o douto acórdão recorrido não fez a correcta aplicação do direito, é o que se refere à apreciação da prova documental apresentada com a p.i., facto esse, determinante para a decisão de improcedência do recurso, ao considerar que não ficou provada a origem do montante de 125.000 euros.

  8. Os vendedores são o pai e a mãe da recorrente, que não receberam até à presente data a diferença entre o preço e o mútuo, e essa situação, corresponde sem margem para dúvidas, a um empréstimo concedido, para “pagar” o preço restante do imóvel, no acto da celebração da escritura em que declararam ter recebido, não existindo duas versões contraditórias, como referido na douta decisão recorrida.

  9. Existindo dúvidas no espírito do julgador, bastaria deitar mão do disposto no artigo 13.º do CPPT, violado na douta sentença, para que fossem explicitadas as alegadas contradições, com vista ao conhecimento seguro da verdade material.

    L. Seriam pertinentes e adequadas as diligências a levar a efeito pelo M.° Juiz, a coberto do artigo 13.º do CPPT se, se entendia existirem versões contraditórias, pese o facto de se tratar de um processo urgente, e do disposto no art.º 146.°-B do CPPT, não dispensa o juiz do poder/dever de ordenar as diligências que considere indispensáveis ao apuramento da verdade material, nos termos do artigo 13.°, n.° 1 do CPPT, conforme tem sido jurisprudência comummente aceite.

  10. A douta sentença valora como facto relevante para a decisão, a indicação constante da escritura sobre o recebimento do preço, pese embora tratar-se de uma declaração formal, que vincula somente as partes intervenientes, o que implica que essa situação corresponda a um empréstimo dos vendedores, não havendo necessidade de alterar essa declaração formal, quase sempre pré elaborada pelo notário, como foi o caso, atendendo ao grau de parentesco entre compradores e vendedores, e quando já estava acordado que o restante preço seria pago a posteriori.

  11. Conforme é jurisprudência comummente aceite, a prova exigida ao contribuinte é apenas quanto à fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, de forma a determinar se as mesmas foram omitidas à declaração para efeitos de IRS.

  12. A declaração assinada por todos os intervenientes na escritura e detentores do capital e da gerência da sociedade B..., Lda., demonstra a veracidade dos factos invocados pela recorrente, contudo não foi considerada na douta decisão recorrida, ainda que não tenha sido posta em causa a veracidade dessa mesma prova documental nem arguida a sua falsidade.

    2 - Contra-alegando, vem o Director de Finanças de Lisboa dizer que:

    1. O objecto do presente recurso é o acórdão de 21/04/2009 no qual o Tribunal Central Administrativo do Sul considerou improcedente o recurso apresentado pela requerente e, em consequência, manteve a decisão que procedeu à correcção do rendimento colectável, por aquela declarado, em sede de IRS no ano de 2004, com recurso ao método indirecto consagrado no artigo 89.º-A da LGT; b) Decorre dos autos que no ano de 2004 a recorrente efectuou a aquisição de um imóvel pelo valor de € 375.000,00 tendo, nesse mesmo ano, o seu agregado familiar declarado como rendimentos em sede de IRS o montante de € 15.860,60; c) Verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta da matéria colectável e tendo-se, por via legal, invertido o ónus da prova, não logrou a recorrente justificar a proveniência de parte significativa do valor que desembolsou na aquisição; d) Resultando da norma a aplicar que o valor do rendimento padrão corresponde, no caso de aquisição de imóveis, a vinte por cento do valor de aquisição e que em nenhuma situação, a lei manda subtrair ao valor de aquisição os montantes parcialmente justificados, constata-se que o acórdão recorrido expressa uma correcta interpretação da norma contida no n.º 4 do artigo 89.º-A da LGT.

    3 - O Exmo. Magistrado do MP junto deste STA emite parecer no sentido de que o recurso deve considerar-se findo, nos termos do n.º 5 do artigo 284.º do CPPT, por inexistência de identidade de situação factual.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    - Fundamentação - 4 – Questões a decidir Importa averiguar previamente se, no caso dos autos, estão reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, cuja não verificação impede o conhecimento do presente recurso.

    Concluindo-se no sentido da verificação daqueles requisitos, haverá então que conhecer do seu mérito, sendo a questão que constitui o objecto do presente recurso a da interpretação do disposto no artigo 89.º-A da LGT nas situações em que o contribuinte apenas demonstra a origem de parte dos rendimentos que lhe permitiram o acréscimo patrimonial em que se consubstanciou a manifestação de fortuna.

    5 – Matéria de facto Mostra-se assente a seguinte factualidade: A. A... (doravante identificada como recorrente) declarou rendimentos no ano de 2004, em sede de IRS e em conjunto com o seu marido C..., no montante de € 15.860,60 (quinze mil, oitocentos e sessenta euros e sessenta cêntimos) – processo administrativo apenso.

  13. Através de escritura celebrada em 14 de Julho de 2004, a recorrente adquiriu a seus pais, D... e E..., com a concordância do seu irmão F... e mulher G..., o prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de Carcavelos, concelho de Cascais, sob o artigo 2087.º, pelo valor de € 375.000,00 (trezentos e setenta e cinco mil euros) - doc. de fls. 13/16.

  14. Da escritura referenciada na alínea que antecede consta que os alienantes já receberam o preço acordado - doc. de fls. 13/16.

  15. Para esta aquisição, a recorrente utilizou crédito concedido pelo H..., actual Banco I..., no montante de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), através de contrato de mútuo celebrado em 14 de Julho de 2004 - doc. de fls. 17/27.

  16. Atentos os valores de aquisição do imóvel e do rendimento declarado no ano de 2004, a Direcção de Finanças de Lisboa (DFL) desencadeou acção de inspecção para consulta e recolha de elementos tendentes à...

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