Acórdão nº 01247/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2010
Magistrado Responsável | DULCE NETO |
Data da Resolução | 19 de Maio de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A…, com os demais sinais dos autos, recorre da sentença, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação de taxa efectuada pela Câmara Municipal de Sintra com referência ao licenciamento de ocupação de subsolo com tubagens de gás.
Terminou a sua alegação enunciando as seguintes conclusões: I Inexistiu qualquer acto de legítimo licenciamento da ocupação da via público e/ou do subsolo e do devido procedimento administrativo correspondente, no caso dos autos; II A C.M. Sintra não tem competência nem legitimidade quer para atribuir a licença em apreço quer para aplicar a taxa correspondente, à recorrente.
III Na sequência da nacionalização da C.R.G.E. e da assunção pelo Estado Português, do dever, da competência e da responsabilidade dos actos conducentes à manutenção e expansão do “Gás de Cidade”, e nos termos da lei que aprovou as bases gerais da concessão e do título contratual desta, a C.M. Sintra ficou privada dos poderes de administração da porção do subsolo que viesse a ser necessária para a instalação das infra-estruturas adequadas ao estabelecimento da concessão - art°. 15° alínea c) do D-L n°374/89 de 25/10; IV Por se tratar de um serviço público, no qual o próprio Estado é o concedente, foi até dispensado o licenciamento municipal para a realização de quaisquer obras inerentes à rede de distribuição - n°3 alínea b) do art. 13° do DL 374/89; Bases XXXIV e XXXV anexas ao DL 33/91 de 16/1; e cláusula 25ª, nº 2 alínea a) do contrato de concessão, datado de 16/12/1993; V A consequente impossibilidade de direito de a C.M.Lisboa negar a atribuição de qualquer licença de ocupação do subsolo para os fins em vista é bem demonstrativa de que não se trata de uma taxa; VI É intempestiva e contra-natura a concessão de qualquer licença de ocupação do subsolo no ano de 2002, relativamente à utilização de uma rede subterrânea já implantada e sob exploração em data anterior.
VII Tal como se considerou nos Acórdãos seguintes e pelos fundamentos neles expendidos, deverão os tributos impugnados ser anulados, porque inconstitucionais e ilegais: Acórdão proferido em 23.10.2001, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 5448/01; Acórdão proferido em 12.03.2002, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 5575/01; Acórdão proferido em 28.05.2002, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 6018/01; Acórdão proferido em 20.04.2004, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de Recurso que ali correm termos sob o n.º 01256/03; VIII A questão em apreço nos autos respeita à apreciação da legalidade ou ilegalidade de um tributo designado como “taxa” cobrado anualmente à ora Recorrente por parte do Município de Sintra pela ocupação do subsolo concelhio com as condutas, depósitos e tubagens que aquela utiliza para prestar o serviço público de distribuição de gás natural, ao abrigo do Contrato de Concessão celebrado com o Estado Português em 16.12.1993; IX A douta Sentença recorrida considerou erroneamente que os tributos em causa têm a natureza de taxas, sendo as mesmas legais e indeferindo o pedido da sua anulação.
X Para fundamentar a sua decisão, o Mmº. Tribunal a quo considerou que o tributo liquidado estava conexionado com a utilização de terrenos no domínio público, considerando ainda que a colocação de condutas e tubos no subsolo consubstanciava uma utilização individualizada deste, nos termos do n.º 2 do art. 4º da L.G.T., e como tal, seria de concluir que os tributos liquidados tinham a natureza de taxas, tendo cobertura legal na alínea c) do n.º 1 do art. 19º da Lei das Finanças Locais.
XI Com o devido respeito, que é muito, tais considerações assentam numa errada caracterização e qualificação dos factos, o que resultou na incorrecta e insuficiente interpretação dos conceitos e normas jurídicas aplicáveis.
XII Em primeiro lugar, a caracterização dos limites do direito de propriedade do Município face ao subsolo não se resume ao previsto no art. 1344° n.º 1 do Código Civil.
XIII As situações jurídicas dominiais locais resultam das atribuições municipais concretas e onde não há atribuições ou competências da autarquia, não se justifica o domínio público local.
XIV Por via do Contrato de Concessão celebrado entre a ora Recorrente e o Estado Português, não foi atribuída qualquer competência ao Município de Sintra no que respeita à instalação e manutenção dos depósitos, tubagens e condutas de distribuição do gás natural.
XV A responsabilidade pelas despesas relativas a instalação, manutenção, reparações e eventuais alterações à rede do gás foi contratualmente atribuída à A….
XVI Constituindo obrigação da concessionária perante o concedente o dotar-se de todas as infra estruturas e outros meios necessários, em cada momento, à exploração da concessão e promover a respectiva implantação, a cedência e utilização dos bens públicos municipais não poderiam ficar dependentes da vontade discricionária da respectiva autarquia, sob pena de ficar em risco o cumprimento das obrigações contratuais em causa.
XVII Como tem considerado o Venerando Tribunal Constitucional, nomeadamente no seu Acórdão 558/98, de 29 de Setembro (D.R. II, 11.11.98, 16044) “a diferença específica entre imposto e taxa se situa na existência ou não de um vínculo sinalagmático que é apontado à segunda. Assim, o encargo característico das taxas representa como que (...) o preço do serviço ou da prestação de um serviço ou actividade públicas ou de uma utilidade de que o tributado beneficiará”, ou no Acórdão 357/99, de 15 de Junho (D.R., II, 02.03.2000, 4255) onde se pode ler como traço fundamental definidor do conceito de imposto e na sua diferenciação com o de taxa, o de unilateralidade (...) em contraste com a bilateralidade caracterizadora de taxa”.
XVIII Ora, a bilateralidade e o vínculo sinalagmático inexistem, de todo em todo, no caso concreto dos autos em apreço.
XIX Todavia, por outro lado, o carácter bilateral e sinalagmático do conceito de “taxa” poderá ser insuficiente para permitir uma solução que leve em conta todos os factos e circunstâncias...
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