Acórdão nº 165/04.2TBPBL .C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Abril de 2010
Magistrado Responsável | MANUELA FIALHO |
Data da Resolução | 20 de Abril de 2010 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: A.....
, A. na acção, sedeada na...., interpôs recurso da sentença na parte em que a mesma absolveu os RR. de parte do pedido.
Pretende que se determinem os factos relevantes para a decisão e se revogue a sentença na parte que absolveu os RR., condenando-os a pagar-lhe a quantia reclamada e a de 38.906,49€ e juros moratórios e compulsórios ou, se assim não se entender, que se relegue a liquidação para execução de sentença.
Formulou as seguintes conclusões: 1 – A A. alegou factos e circunstâncias relevantes para a questão da decisão de direito, quanto à perda do lucro, proveito com a desistência da empreitada por parte do R., factos (retro elencados) que deveriam ser versados na base instrutória com vista a , sobre eles, se oferecer e produzir nova prova; 2 – A resposta ao quesito 25º devia ter em conta o valor global das facturas ou, pelo menos, o valor acrescido de IVA; 3 – A resposta ao quesito 26º al. B) deverá esclarecer que a piscina executada pelos RR. não foi construída em fibra, conforme convencionado, mas antes em betão, sendo o custo desta opção de valor superior; 4 – As facturas emitidas e enviadas aos Recrdºs., conforme consta da matéria assente na alínea M), ascendem ao total de 131.054,19€; 5 – Os Recrdºs. entregaram apenas a quantia de 69.831,68€, pelo que está em dívida a quantia de 61.222,45€; 6 – O Tribunal a quo, por erro de interpretação e/ou aplicação condenou os Recrdºs. apenas na quantia de 44.846,95€, aos quais deverá acrescer a quantia de 16.375,50€ para perfazer os 61.222,45€; 7 – Os Recrdºs. desistiram deliberada e convenientemente do contrato de empreitada celebrado com a Recrte.; por tal facto devem indemnizar a Recrte., não só pelos meios dispendidos, como ainda dos gastos e do proveito que obtinha com a obra; 8 – Aliás, confessada em parte, pelos mesmos, ao admitirem terem de pagar a quantia de 17.677,36€; 9 – O relatório pericial junto aos autos considera ser o lucro legítimo da obra em causa de 38.906,49€ a favor da Recrte.; 10 – Devem também os Recrdºs. indemnizar a Recrte. naquele valor de 38.906,49€, além do valor em dívida correspondente ao lucro ou proventos frustrados pela desistência do R. marido da empreitada; 11 – Ainda que assim não se entendesse, deveria relegar para liquidação em execução de sentença; 12 – Por erro de interpretação e ou aplicação, mas de molde consentâneos, observados os princípios gerais de direito civil e processual civil, mormente foram violadas as disposições legais atinentes, concretamente, o disposto nos Artº 1207º a 1229º do CC, 490º, 510º, 511º, 513º, 523º, 567º, 653º, 659º do CPC.
B...
e C...
, RR. na acção,..., contra-alegaram.
Defendem a improcedência do recurso com manutenção da sentença recorrida.
* Para cabal compreensão da matéria, façamos uma breve resenha processual.
A... intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra B.. e esposa C..., pedindo a condenação dos RR. a pagarem-lhe a quantia de 124.699,47 euros acrescida dos juros moratórios vincendos, à taxa legal para os juros comerciais, até efectivo e integral pagamento; subsidiariamente, a pagarem-lhe a quantia de 61.222,45 euros, juros vencidos no montante de 12.057,87 e vincendos sobre o capital à taxa legal de juros comerciais em vigor, até efectivo e integral pagamento; em qualquer das hipóteses, a pagarem-lhe uma indemnização acrescida dos juros compulsórios à taxa legal desde o trânsito em julgado, até efectivo e integral pagamento.
Alega, para tanto, ter celebrado com os RR. um contrato de empreitada relativo à construção de uma moradia de harmonia com o projecto elaborado e apresentado pelos RR., pelo preço de 39.000.000$00 acrescido de IVA; a A. iniciou os trabalhos e emitiu quatro facturas, no valor global de 131.054,19 euros, encontrando-se em débito o valor de 61.222,45 euros; em determinada altura, os RR., sem o conhecimento, contra a vontade e sem qualquer interpelação, prosseguiram por si os trabalhos, não permitindo a continuação e a conclusão da obra à A.; a desistência dos RR. causou danos à A..
Citados os RR., invocaram dever à A. apenas o montante de 2.999.992$00, terem despendido 21.456.000$00 para concluir a obra e que a indemnização a que a A. teria direito em caso de desistência seria de 3.543.992$00. Mais alegaram que a A. é que abandonou a obra, por ter perdido o interesse na continuação dos trabalhos. Em reconvenção, pediram a condenação da A. a reparar todos os defeitos e vícios reclamados ou, em alternativa, a pagar aos RR. o valor dos prejuízos sofridos com a falta de licença de habitabilidade e o valor que para a eliminação dos defeitos e vícios vier a ser apurado em liquidação de sentença.
A A. replicou negando ter construído com defeitos. Termina pedindo a condenação dos RR. como litigantes de má fé, em multa e indemnização.
Foi proferido despacho saneador e foi elaborada a base instrutória, que sofreu reclamação atendida a fls. 177.
Procedeu-se a julgamento e veio a proferir-se sentença que julgou a acção parcialmente procedente, tendo condenado os R. B.. e esposa C... a pagar à A. A... a quantia de 44.846,95 euros (quarenta e quatro mil, oitocentos e quarenta e seis euros e noventa e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, o R. marido desde 27/5/2002 à taxa de 7% ao ano e desde 1/5/2003 à taxa de 4% ao ano, e a R. mulher desde 2/3/2004 à taxa de 4% ao ano, até integral pagamento, absolvendo-os do mais. Mais julgou totalmente improcedente a reconvenção, pelo que absolveu a A. A...dos pedidos reconvencionais contra ela formulados pelos RR..
* Das conclusões supra exaradas extraem-se as seguintes questões a decidir neste recurso:
-
De facto: 1. Ampliação da matéria de facto 2. Erro de julgamento no que concerne aos quesitos 25º e 26º; B) De direito: 1. Os RR. devem a quantia de 61.222,45€? 2. A A. deve ser indemnizada pela desistência do R.? * Comecemos pela primeira questão supra enunciada que se prende com a necessidade ou não de ampliação da matéria de facto.
Muito embora a mesma não seja completamente perceptível do enunciado de conclusões, compaginado este com a matéria alegada, entende-se que se pretende a ampliação de forma a trazer á acção a matéria constante dos Artº 1º, 33º, 34º, 41, 43º, 45º, 46º, 51º, 52º e 62º da PI.
Defende-se aqui que tais factos interessam á decisão da causa, designadamente sobre o ganho ou lucro a obter com o contrato de empreitada em questão, pelo que deveriam ter sido levados à base instrutória para, sobre os mesmos, ser oferecida e produzida prova.
Os Recrdºs. pronunciam-se no sentido de a matéria ali alegada não constituir alegação de factos integradores da indemnização pretendida.
Relembra-se que a A. peticionou a condenação dos RR. no pagamento da quantia de 124.699,47€ e juros decorrentes do alegado incumprimento dos RR. (que contabiliza com recurso á seguinte fórmula: 39.000.000$00 – 14.000.000$00 = 25.000.000$00) -falta de pagamento integral do preço convencionado- e, subsidiariamente, da quantia de 61.222.45 e juros decorrente dos trabalhos executados, materiais aplicados e utensílios utilizados.
A sentença condenou os RR. a pagar á A. a quantia de 44.846,95€ e juros decorrente da mora, não tendo reconhecido prejuízos derivados da desistência da empreitada porquanto “a A. não alegou quaisquer factos integradores da indemnização devida em caso de desistência e não pode exigir, sem mais, o pagamento do preço global acordado pela execução da moradia menos o valor já pago... pois os factos provados não revelam que a A. tenha feito gastos nesse montante e/ou que tal corresponda ao benefício económico que retiraria da conclusão do negócio”.
Vejamos, então.
O Artº 712º/4 do CPC permite à Relação a ampliação da matéria de facto se não constarem do processo todos os elementos probatórios que permitam a reapreciação da matéria de facto.
A ampliação da matéria de facto pressupõe, para ser concretizada, “a possibilidade de desenvolvimento da matéria de facto na 1ª instância, nos termos do Artº 264º, designadamente por haver suporte para o efeito nos factos alegados” (Manual dos Recursos em Processo Civil, Fernando Amâncio Ferreira, pg. 219).
O Artº 264º do CPC consagra o princípio do dispositivo, do qual resulta, entre outras, que cabe ás partes a alegação dos factos que integram a causa de pedir, e que o juiz só pode fundar a sua decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo dos que não carecem de alegação e prova, e dos instrumentais que lhe advenham ao conhecimento por via da instrução e prova.
Importa, assim, antes de mais, percebermos o pedido formulado e compaginá-lo com a causa de pedir invocada para, a partir de ambos, concluirmos pela necessidade ou não de ampliação da matéria de facto em discussão.
A A. estruturou a acção formulando, como supra se mencionou, um pedido principal e um pedido subsidiário.
Assentou tais pedidos na circunstância de ter celebrado com o R. um contrato de empreitada, com o que emitiu facturas no valor global de 131.034,19€, dos quais o mesmo só pagou 69.831,75€, pelo que considera em dívida a quantia de 61.222,45€ (1ª causa de pedir que origina, segundo entendemos o pedido subsidiário); alega também que o R. desistiu da empreitada, o que constitui ambos os demandados na obrigação de a indemnizar pelo valor de 124.699,47€ obtido com recurso à fórmula já exarada (valor acordado para a obra – valor pago pelo R.) (2ª causa de pedir que fundamenta, ao que se entende, o pedido principal).
A sentença vem a considerar este pedido infundado.
Compulsada a petição inicial constata-se que ali se alegava, nos pontos concretamente mencionados no recurso: Artº 1º - A A. é uma sociedade comercial cujo capital social se encontra titulado por acções, sendo o seu objecto social a indústria da construção civil, compra e venda de propriedades; Artº 33º - O R, marido passou, por si e directamente, a contratar pessoal e a prosseguir os...
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