Acórdão nº 4031/07.1TVPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução06 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I- Gozando o Réu arrendatário de uma presunção legal do lugar do cumprimento, que o nº 1 do artº 1039º do Código Civil lhe faculta, ainda que a sua contestação tenha sido desentranhada e devolvida, ficando sem efeito a sua defesa, o incumprimento invocado pelo senhorio não afecta a arrendatária demandada, uma vez que esta não carece de alegar e provar que o pagamento deveria ser efectuado no seu domicílio, pois a própria lei estipula que tal pagamento deve ser feito nesse lugar, se as partes ou os usos não fixarem outro regime.

II- Por outro lado, a lei é claríssima, no nº 2 do transcrito artº 1039º do C.Civil, ao estabelecer também a presunção, em caso de não pagamento da renda nas condições previstas no nº 1, de que o locador «não veio nem mandou receber a prestação no dia do seu vencimento».

III- Nada tinha, pois, a Ré que provar, nem sequer alegar, pois que beneficia das presunções legais acabadas de citar e, nos termos do artº 350º do CC, quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz.

IV- Dito isto, é de meridiana clareza que o Tribunal da Relação, para aquilatar do bem ou mal fundado da decisão do Tribunal da 1ª Instância que decretou o despejo com base na resolução contratual, não podia deixar de ter em atenção o disposto no citado nº 2 do artº 1039º do C.Civil, já que aí se encontra a chave hermenêutica para a decisão do pleito.

No ensinamento do saudoso e preclaro Civilista que foi o Prof. Antunes Varela, «a presunção estabelecida no nº 2 tem importância, dado que, não praticando o credor ( locador) os actos necessários ao cumprimento da obrigação, constitui-se em mora ( artº 813º) e deixam de ser aplicáveis ao locatário, consequentemente, as sanções do artº 1041º, assim como deixa o locador de poder resolver o contrato com fundamento na falta de pagamento da renda» ( P. Lima e A. Varela, Código Civil, anotado, II, 4ª edição, pg. 374, com sublinhado e bold nosso).

V- Por isso, no Acórdão de 27 de Janeiro de 2010, deste Supremo Tribunal, de que foi Relator, o Exmº Juiz Conselheiro Paulo Sá «a falta de pagamento da renda não determina, sem mais, a resolução do arrendamento e subsequente despejo; é preciso, paralelamente, que o inquilino esteja em mora, isto é, que lhe seja imputável o retardamento da prestação – cf. artº 804º, nº 2 do C.Civil.

Não resultando demonstrado, através de contrato escrito ou por outro meio, o local em que a renda deve ser paga, deve aplicar-se a regra supletiva da 2ª parte do nº 1 do artº 1039º do CCivil; nesta situação ( lugar de pagamento no domicílio do locatário), não tendo sido feito o pagamento, presume-se ( presunção não ilidida) que o locador não veio nem mandou receber ( nº 2 do mesmo normativo), o que reconduz à mora do credor ( artº 813º do CC) com a consequente impossibilidade de este resolver o contrato com base na falta de pagamento» ( Pº 1389/04.8TBVIS.C1.S1, disponível in www.dgsi.pt).

VI- Trata-se, portanto, de uma questão de direito de que o Tribunal tinha obrigação de conhecer oficiosamente, por inteiramente pertinente para a decisão, uma vez que vinha pedida a resolução do vínculo locatício por falta de pagamento atempado de rendas, com o consequente despejo da inquilina, ora Ré/Recorrida.

VII- Ainda que tal questão não tenha sido conhecida oficiosamente na 1ª Instância, como podia e devia ser, não poderia o Tribunal superior deixar de a conhecer oficiosamente, isto é, mesmo que não tivesse sido suscitada pela parte interessada, posto que para confirmar o decidido (a resolução do contrato e o despejo decretado) ou alterar tal decisão, importava saber se ocorreu in casu a mora do inquilino ( mora debitoris), dado que, nos termos do nº 2 do artº 804º do CCivil, «o devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido» ( sublinhado nosso).

Decisão Texto Integral: Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA propôs contra BB, ambas com os sinais dos autos, a presente acção com processo comum na forma ordinária para resolução do contrato de arrendamento, pedindo a condenação da R. a entregar-lhe o arrendado, devoluto de pessoas e bens e a pagar-lhe a quantia de € 2.775,00, acrescida de juros de mora à taxa legal vencidos no montante de € 266,58 e dos vincendos até integral pagamento, referente a rendas vencidas e não pagas, e ainda as rendas vincendas até efectiva entrega do arrendado.

Alega, no essencial, ser co-proprietária de imóvel que identifica, juntamente com o seu ex-marido, já falecido, que o deu de arrendamento à R. mediante a renda mensal de € 75,00; à data do óbito do seu ex-marido, em 17/05/2007, a Autora transmitiu à R. que a partir daí a renda deveria ser paga à A. no locado até ao dia 8 de cada mês; desde Novembro de 2004 que a R. não paga quaisquer rendas. Alegou ainda viver actualmente com sua filha em casa por esta arrendada, pretendendo habitar o imóvel arrendado.

Citada a R., deduziu contestação que foi julgada extemporânea, tendo sido ordenado o respectivo desentranhamento.

Da decisão que o ordenou interpôs a R. recurso de agravo, que foi, por sua vez, julgado deserto por falta de alegações.

Tendo o Mmo. Juiz considerado confessados os factos articulados pela A., apenas por esta foram...

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