Acórdão nº 270/07.3TTOAZ.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução05 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE Sumário : 1. No que toca à indemnização por rescisão, com justa causa, do contrato de trabalho desportivo, o art.º 27.º, n.º 1, da Lei n.º 28/98 consagra um regime jurídico diferente daquele que a lei prevê para os trabalhadores em geral, uma vez que, ao estipular que “a parte que der causa à cessação ou que a haja promovido indevidamente incorre em responsabilidade civil pelos danos causados em virtude do incumprimento do contrato”, claramente nos remete para as disposições civilísticas, designadamente para o art.º 562.º e seguintes do Código Civil, referentes à obrigação de indemnização.

  1. Segundo este regime, o praticante desportivo que, com justa causa, tenha rescindido o contrato de trabalho, terá de alegar e provar os danos que efectivamente sofreu por causa da rescisão do contrato.

  2. Tendo o autor alegado que a ré não lhe pagou as prestações pecuniárias que teria auferido até ao termo do contrato e que, em consequência da cessação do aludido contrato, tinha direito a receber aquelas prestações, é de reconhecer, na perspectiva de um declaratário normal (art.º 236.º, n.º 1, do C.C.), que o autor pretendeu dar àquela alegação o sentido de que com a rescisão do contrato sofreu um dano de valor igual ao das retribuições que teria auferido da ré até ao termo do contrato.

  3. Estando provado que o autor deixou de receber da ré as retribuições que dela teria auferido se o contrato tivesse cessado no seu termo (final da época desportiva de 2006/2007) e que, posteriormente à rescisão do contrato com a ré, exerceu a actividade de basquetebolista profissional, sob a autoridade e direcção de outra entidade empregadora desportiva, mediante retribuição, ainda na época de 2006/2007, torna-se evidente, nos termos da teoria da diferença consagrada no art.º 566.º, n.º 2, do C.C., que ele só tem direito a receber da ré, a título de indemnização pela rescisão do contrato com justa causa, a diferença entre o montante correspondente às retribuições que deixou de auferir da ré, em virtude da rescisão do contrato, e o montante das retribuições que, até ao final da referida época desportiva, auferiu ao serviço do outro empregador.

    Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório Na presente acção, proposta no Tribunal do Trabalho de Oliveira de Azeméis por AA contra a BB, o autor pediu que a ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia global de € 66.400, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, sendo € 7.500 a título de parte dos prémios referentes à época desportiva de 2005/2006, € 44.100 a título das retribuições que teria auferido na época desportiva de 2006/2007, ou seja, até ao termo do contrato, € 9.900 a título dos direitos de imagem que teria recebido na época desportiva de 2006/2007 e € 4.900 a título de renda da casa dos meses de Abril/2006 até Maio/2007.

    Em resumo, o autor alegou o seguinte: - em 1 de Setembro de 2005, celebrou um contrato de trabalho desportivo com a ré, para exercer as funções de jogador profissional de basquetebol, com início em 25.8.2005 e termo em 25.5.2007; - nos termos do referido contrato, o autor auferiria em cada uma das épocas desportivas (2005/2006 e 2006/2007) nove prestações mensais de € 4.900, com vencimento no dia 10 dos meses de Outubro a Junho de cada época; - em 25.11.2005, o autor e a ré celebraram um aditamento ao referido contrato, nos termos do qual a ré pagaria ao autor € 5.000 pela presença da equipa nos playoffs de 2005/2006, € 5.000 pela presença da equipa na Final Eight da Taça de Portugal na época de 2005/2006 e € 5.000 pela presença da equipa na Taça da Liga na época de 2005/2006; - a ré também celebrou com o autor um contrato de direitos de imagem, comprometendo-se a ré, em contrapartida, a pagar-lhe a quantia de € 9.900 por época, em nove prestações de € 1.100 cada, com início em 10 de Outubro; - na época de 2005/2006, a equipa da ré atingiu os três objectivos supra referidos; - além disso, a ré prometeu pagar ao autor a renda mensal da casa, até ao limite de € 350 mês e até ao final do contrato de trabalho; - quando nada o fazia prever, em Setembro de 2006 a ré não inscreveu a sua equipa de basquetebol na Liga de Clubes de Basquetebol, ficando, por isso, impedida de participar em quaisquer provas oficiais, e acabou mesmo por extinguir a equipa de basquetebol; - tal facto impediu a prestação efectiva da actividade desportiva para toda a época de 2006/2007, para a qual o autor fora contratado; - a ré não pagou ao autor as prestações remuneratórias à época de 2006/2007 (€ 44.100), o mesmo acontecendo com metade (€ 7.500) dos prémios de presença acima referidos, com as prestações referentes aos direitos de imagem na época de 2006/2007 (€ 9.900) e com a renda de casa referentes aos meses de Abril/2006 até Maio/2007 (€ 4.900); - face à impossibilidade por parte do autor e por culpa exclusiva da ré de poder cumprir a sua prestação contratual, jogando e treinando, e face ao não pagamento das retribuições vencidas e não pagas, não restava ao autor outra alternativa que não fosse a rescisão do contrato com justa causa, o que fez por carta de 21 de Setembro de 2006.

    A ré contestou, alegando, também em resumo, o seguinte: - no final de época de 2005/2006, a direcção da ré demitiu-se, tendo esta passado por uma crise directiva que se prolongou por mais de dois meses; - só em princípios de Agosto de 2006 é que a ré conseguiu eleger nova direcção; - um dos primeiros objectivos da nova direcção foi o de conseguir apoios financeiros que lhe permitissem inscrever-se na Liga de Clubes de Basquetebol, para disputar o campeonato nacional de basquetebol na época de 2006/2007; - os esforços desenvolvidos nesse sentido prolongaram-se até à data limite de inscrição na referida Liga, mas sem êxito; - logo que concluiu pela impossibilidade de disputar o campeonato profissional na época de 2006/2007, a ré transmitiu tal situação ao autor para que este pudesse encontrar novo clube, o que por este foi aceite; - mais ficou acordado entre o autor e a ré que após este encontrar novo clube, ou não, se acertaria um valor a pagar pelos eventuais danos resultantes da rescisão do contrato a efectuar por mútuo acordo; - a ré ficou a aguardar que o autor a contactasse, mas, surpreendentemente, em 22.9.2006, recebeu a comunicação de rescisão do contrato por parte do autor, invocando este a violação do dever de ocupação efectiva; - o autor só se viu impedido de exercer a actividade desportiva na época de 2006/2007 ao serviço da ré, porque esta se viu impedida de aceitar tal prestação, pelas razões objectivas acima referidas; - se a ré tivesse podido aceitar a prestação desportiva do autor, durante a época de 2006/2007, obviamente que o teria feito, pois esse era o seu desejo e tudo fez para que tal fosse possível, não se verificando, por isso, uma oposição injustificada por parte da ré à prestação efectiva desportiva por parte do autor; - posteriormente à comunicação de rescisão do contrato, a ré tomou conhecimento, através dos jornais, que o autor tinha celebrado contrato de trabalho desportivo com o “Queluz Sintra Património Mundial”, actividade que efectivamente acabou por exercer durante a época de 2006/2007; - em Setembro de 2006, ao rescindir o contrato de trabalho desportivo, também deixou de vigorar o contrato de direitos de imagem, não lhe sendo, por isso, devidos quaisquer valores a título de direitos de imagem referentes à época de 2006/2007; - a ré apenas deve ao autor € 7.500, a título de prémios.

    Na 1.ª instância, a acção foi julgada improcedente no que diz respeito à quantia reclamada a título de renda de casa e procedente quanto aos demais pedidos, tendo a ré sido condenada a pagar ao autor: i) as retribuições acordadas para a época de 2006/2007, no montante de € 44.100, deduzidas as retribuições que o autor auferiu do Clube Queluz Sintra Património Mundial, na época de 2006/2007, em montante a liquidar posteriormente; ii) a quantia de € 7.500, acrescida de juros de mora desde a citação, a título de parte do valor dos prémios devidos pela presença da equipa nos playoffs, na final da Taça Eight, da Taça de Portugal e na Taça da Liga, na época de 2005/2006; iii) a quantia de € 9.900, acrescida de juros de mora desde a citação, referente ao contrato de direitos de imagem.

    E, para decidir daquela forma no que toca às retribuições referentes à época de 2006/2007 – que, como adiante veremos, é a única questão trazida ao recurso de revista –, o M.mo Juiz começou por afirmar que o vínculo jurídico-laboral estabelecido constituía um contrato de trabalho desportivo regulado pela Lei n.º 28/98, de 26 de Junho, e, depois de tecer algumas considerações genéricas sobre o conceito de justa causa, fundamentou a sua decisão nos seguintes termos: «Nos termos do preceituado no art.º 12º, al. a) da Lei n.º 28/98, são deveres da entidade empregadora desportiva, em especial, proporcionar aos praticantes desportivos as condições necessárias à participação desportiva bem como a participação efectiva nos treinos e outras actividades preparatórias ou instrumentais da competição desportiva.

    Conforme resulta dos factos apurados, em Setembro de 2006, a R. não inscreveu a sua equipa de basquetebol na Liga de Clubes de Basquetebol, ficando a mesma, em consequência, impedida de participar em quaisquer provas oficiais. Tal situação impedia também o A. da prestação efectiva da sua actividade desportiva que se traduzia na realização de treinos e jogos da competição oficial de basquetebol na equipa da R. na época de 2006/2007 para a qual fora contratado.

    E embora tenha resultado provado que no final da época de 2005/2006, a Direcção da R. demitiu--se, seguindo-se uma crise directiva, que só foi resolvida em Agosto, com a eleição de uma nova Direcção. E que a nova Direcção desenvolveu contactos para conseguir apoios financeiros que lhe permitissem inscrever a equipa de...

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