Acórdão nº 0126/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Abril de 2010
Magistrado Responsável | JORGE LINO |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
1.1 A Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A… e mulher, B… contra as liquidações de imposto de selo n°s 418243 e 418257, no valor de 6.791,98 €, cada uma, praticadas na sequência de escritura de justificação judicial.
1.2 Em alegação, a recorrente Fazenda Pública formula as seguintes conclusões.
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Por força do disposto no art. 7º do Decreto-Lei nº 287/2003, de 12.11, foi alterado substancialmente o Código do Imposto de Selo (de aqui em diante designado CIS), tendo, no âmbito da incidência do imposto, sido integradas – a título de transmissões gratuitas – as aquisições por usucapião do direito de propriedade ou de qualquer outro direito real de gozo sobre bens imóveis.
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As aquisições por usucapião são ficcionadas pelo legislador do CIS como se tratando de transmissões a título gratuito, pois que o art. 1º, nº 3, alínea a) do CIS dispõe que “são consideradas transmissões gratuitas, designadamente as que tenham por objecto direito de propriedade ou figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis, incluindo a aquisição por usucapião”.
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Constituindo o tributo encargo do adquirente dos bens, no caso o usucapiente/impugnante, nos termos do preceituado no art. 3º, nºs 1 e 3, alínea a) do CIS.
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No que toca ao nascimento da obrigação tributária determina a alínea r) do art. 5º do CIS que “A obrigação tributária considera-se constituída nas aquisições por usucapião, na data em que (...) for celebrada a escritura de justificação notarial”.
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Por seu lado, o art. 13º, nº 1 do CIS dispõe que o valor dos imóveis a atender nas transmissões a título gratuito é o valor patrimonial tributário constante da matriz nos termos do CIMI ou o determinado por avaliação, quanto aos prédios omissos ou inscritos sem valor patrimonial.
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Por último, a verba 1.2 da Tabela Geral do CIS estabelece que a “aquisição gratuita de bens, incluindo por usucapião” é tributada à taxa de 10% sobre o valor dos mesmos.
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Para além dos normativos legais ínsitos no CIS acabados de referir importa, ainda, atentar que da concatenação dos arts. 92º do Código do Notariado (CN) e 117º-A do Código do Registo Predial (CRP) resulta que a aquisição por usucapião formalizada por escritura de justificação realizada na vigência do CIS só pode reportar-se aos direitos reais inscritos na matriz à data da celebração da escritura pública de justificação notarial ou cuja inscrição se encontre pedida na mesma data.
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Acrescendo, ainda, que nos termos do disposto no art. 30º, nº 1 do CRP nos “títulos respeitantes a factos sujeitos a registo, a identificação dos prédios não pode ser feita em contradição com a inscrição na matriz”.
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Voltando ao caso sub judicio, é patente que o objecto da dita aquisição é a realidade imobiliária existente à data da celebração da escritura e não qualquer outra.
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Na verdade, os ora impugnantes, como se deu como provado na douta sentença ora recorrida, construíram um prédio em terreno de terceiro, facto este que não lhes confere a propriedade do mesmo, pois tal construção se revela uma mera benfeitoria útil, cfr. nº 3 do art. 216º do Código Civil (CC).
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Nem sendo, igualmente, legalmente admissível que o valor das benfeitorias seja deduzido ao valor tributável para efeitos de tributação da aquisição por usucapião.
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Tendo na douta sentença ora recorrida se decidido de forma diversa é inevitável que se conclua que foram violados os arts. 1º, nº 3, alínea a), 5º, alínea r), 13º, nº 1 todos do CIS e, bem assim, a verba 1.2 da Tabela Geral do CIS.
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Destarte é entendimento da AT que a factualidade dos presentes autos preenche os pressupostos de incidência previstos no CIS, sendo, por isso passível de tributação nos exactos moldes que o foram e que constam dos actos tributários ora em crise.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta decisão recorrida e substituindo-se por outra que julgue totalmente improcedente a impugnação judicial.
1.3 Não houve contra-alegação.
1.4 O Ministério Público neste Tribunal emitiu o parecer de que o presente recurso deve ser julgado improcedente, confirmando-se o julgado recorrido – apresentando a seguinte fundamentação.
A questão objecto do presente recurso prende-se com a legalidade da liquidação de Imposto de Selo, nomeadamente saber se o Imposto de Selo deveria ter sido liquidado reportando-se ao valor do prédio rústico originariamente adquirido pelos recorrentes, ou ao valor que se encontrava inscrito na matriz à data da escritura de justificação notarial nos termos dos arts. 1°, nºs 1 e 3, 2°, n° 2, al. b), 3°, nºs 1 e 3 al. b), 5º, al. r), e 13°, n° 1 do CIS.
Alega a entidade recorrente que para efeitos de determinação da matéria colectável e subsequente tributação será relevante a realidade inscrita na matriz à data da justificação.
A nosso ver carece de razão.
Como bem se sublinha na decisão recorrida previamente à questão do valor do imóvel (ou da determinação da matéria colectável) coloca-se logicamente a questão da determinação do bem imóvel que foi objecto da transmissão gratuita...
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