Acórdão nº 0229/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Abril de 2010
Magistrado Responsável | ANTÓNIO CALHAU |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – A…, SA, com os sinais dos autos, não se conformando com a decisão do Mmo. Juiz do TAF do Funchal que julgou parcialmente procedente a reclamação deduzida por B…, SA, anulando, em consequência, o despacho do Chefe do Serviço de Finanças do Funchal 1 de 2/6/08 que ordenou a suspensão da execução, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões: I. O presente recurso vem interposto pela executada e aqui Agravante, da Sentença proferida pelo Tribunal a quo em 21/07/2009, que julgou parcialmente procedente a Reclamação deduzida pela Exequente Agravada – B… – e, em consequência, determinou a anulação do despacho impugnado, datado de 2/06/2008, e a prossecução da execução fiscal.
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Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo fez incorrecta interpretação e aplicação da lei de processo, o que constitui fundamento bastante do presente recurso e causa de revogação da douta Sentença recorrida; mas e adicionalmente, o Tribunal a quo ostensivamente desrespeitou uma decisão por si proferida no âmbito de outro processo, e uma outra decretada nos presentes autos, violando, assim e em ambos os casos, as regras do caso julgado formal.
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Com efeito, e por um lado, ao julgar a existência de erro na forma do processo promovido pela Agravante, a correr termos sob o n.º 275/07.4BEFUN, e ao julgar, ainda, extemporânea a petição de impugnação apresentada, o Tribunal a quo decidiu, em sentido frontalmente contrário, ao despacho transitado em julgado que proferiu naqueles autos de processo 275/07.4BEFUN, em 9/6/2009, onde determinou que: «Da p.i. resulta uma factualidade fora dos arts. 97.°-l-a) e 99.° CPPT. A forma de processo adequada é a prevista no art. 97.°-l-p-2 CPPT, pois está em causa um acto administrativo, que não um acto de liquidação tributária.
Este processo deve seguir, assim, a forma de AAE de impugnação de acto administrativo regulada no CPTA (arts. 50.° ss e 78.º e ss ex vi art. 97.° 2 CPPT, em vez da impugnação judicial tributária.
Há, pois, erro na forma do processo. Pelo que determino que se dê baixa nesta espécie e se carregue na 2.ª espécie, AAE (v. Deliberação do CSTAF n.° 825/2005, in DR-II, 16.06.2005, p. 8921» (sublinhado nosso).
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Constatando-se que o efeito jurídico pretendido com o pedido formulado e os fundamentos de facto e de direito de que a executada Agravante o faz derivar se mostram adequados, não à forma processual por ela eleita, mas a outra existente na ordem jurídica adjectiva, o Tribunal a quo ordenou, nos termos do disposto nos artigos 97.°, n.° 3 da LGT e 94.°, n.° 4 do CPPT, a convolação da petição para tal meio processual, o que mais não representa senão a aplicação dos princípios antiformalista, pro actione e pro favoratate instantiae .
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Tal decisão, tendo transitado em julgado, adquiriu força e autoridade de caso julgado formal com o conteúdo decisório que ali lhe foi atribuído pelo Tribunal e, salvo melhor entendimento, aquele despacho que fixou definitivamente a questão da forma do processo não pode ser corrigido pelo próprio Juiz do processo ou por tribunal superior, depois de transitado em julgado, por a isso obstar a força de caso julgado formal de que fica revestido.
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Em qualquer caso, e perante as evidências de que acima se deu conta, certo é que a Sentença recorrida, por violar o caso julgado e o disposto no artigo 672.°, n.º 1 CPC, aplicável ex vi artigo 2.°, alínea e) do CPPT é nula, devendo, em consequência ser revogada.
VII.
Acresce que, a operada transmutação da impugnação judicial proposta em acção administrativa especial não se assume como um acto inócuo, de mero expediente e sem qualquer consequência. Na verdade, é de presumir que o Tribunal, seguindo de perto a orientação da melhor Jurisprudência, só determinou a operada convolação, porque reconheceu, num juízo preliminar à forma do processo, a viabilidade da sua conversão.
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Ao determinar oficiosamente e sem precedência de qualquer requerimento, a convolação da impugnação judicial em acção administrativa especial, o Tribunal a quo não pode ter deixado de levar a cabo um exercício relativo à idoneidade da petição, para o efeito que se propõe atingir, e à tempestividade da mesma.
IX.
Por outro lado, e sem prescindir, o Tribunal a quo na apreciação sobre a oportunidade e fundamento do meio processual utilizado pela Agravante no processo 275/07.4BEFUN atendeu, e mal, em exclusivo e apenas (!), ao facto de se encontrar pendente uma execução, parecendo, pois, constituir entendimento do Tribunal a quo que na pendência de uma execução fiscal o único meio de reacção processualmente adequado a utilizar pela executada deverá ser a Reclamação, regulada nos artigos 276.° e seguintes do CPPT.
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Salvo melhor entendimento, a posição sufragada na douta Sentença recorrida falece, por não encontrar suporte em qualquer dispositivo legal, pois que é reconhecido ao executado num processo de execução fiscal a possibilidade de recorrer a qualquer meio processual que se adeqúe ao objectivo visado, bastando para demonstração do acabado de expor, atentar nos casos de oposição a processos de reversão fiscal e, ainda, no disposto no artigo 169.° do CPPT.
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No primeiro caso por construção jurisprudencial e no segundo por expresso reconhecimento legal, as duas apontadas situações constituem exemplos significativos de como na pendência de uma execução fiscal não é apenas à figura da Reclamação que o executado pode recorrer.
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Certo é que, o acto impugnado – o despacho que admitiu a sub-rogação – assume-se como um acto materialmente administrativo em matéria tributária, necessariamente destacável do processo de execução onde apenas formalmente se encontra inserido. Certo é, ainda, que o processo de reclamação de que, segundo a sentença em crise a executada deveria ter lançado mão, não se afigura, em concreto, um meio idóneo de salvaguarda e defesa dos interesses do executado e de tutela efectiva dos direitos que lhe assistem. Desde logo, porquanto o regime regra de subida da reclamação determinaria que a mesma fosse apreciada, apenas, afinal, uma vez efectuada a venda dos bens penhorados, assim comprometendo e inutilizando por completo, o efeito e a utilidade daquele mecanismo de reacção. Acresce ainda, a circunstância de o processo de reclamação não ter, como é uma decorrência própria do seu mecanismo de subida, uma virtualidade suspensiva da execução fiscal, o que é de injustiça gritante perante, como ocorre in casu, a existência de bens penhorados capazes de garantir a satisfação da quantia exequenda e acrescido.
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Mais do que saber se está em curso uma execução fiscal, deveria o Tribunal a quo ter atendido, o que não fez, à natureza do processo de Reclamação - mero incidente da execução e não meio processual verdadeiro e próprio.
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A acção administrativa especial é, como o Tribunal a quo em momento anterior bem havia decidido, o meio processual adequado de reacção contra o despacho que deferiu a sub-rogação.
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E, para além de própria, é ainda tempestiva a acção...
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