Acórdão nº 355/2002.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Abril de 2010

Data15 Abril 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA Sumário : 1. Tendo o autor alegado que o veículo causador do acidente não tinha, à data, seguro válido e eficaz, cabe ao FGA impugnar especificadamente tal facto, não se podendo limitar a dizer que não sabe se o mesmo é ou não real.

  1. Pois, o FGA, integrando o Instituto de Seguros de Portugal, pode/deve saber, melhor do que ninguém, tendo para isso todos os meios ao seu alcance, se o veículo tinha ou não seguro.

  2. Não tendo impugnado especificadamente tal facto pelo autor alegado, tem-se o mesmo como confessado.

  3. E, mesmo que o Juiz de 1ª instância, erradamente, não o tenha tido como assente, sempre poderá/deverá o julgador, ao abrigo do disposto no art. 659.º, nº 3 do CPC, o considerar na fundamentação da sentença.

  4. O art. 29.º, nº 6 do DL 522/85, de 31 de Dezembro, impõe o litisconsórcio necessário passivo do FGA e do responsável civil (não se falando na lei em proprietário do veículo ou sujeito da obrigação de segurar).

  5. Se bem que, em regra, no domínio dos acidentes de viação, o responsável civil seja o dono do veículo (para alem do condutor culposo se for outra pessoa diferente do dono), visto ser ele a pessoa que aproveita as especiais vantagens do meio de transporte em questão e quem correlativamente deve arcar com os riscos próprios da sua utilização, se o mesmo o tiver alugado, por exemplo, já a sua responsabilidade, à luz dos princípios gerais, se não justifica, dependendo a responsabilidade pelo risco, no caso de veículo de circulação terrestre, de duas circunstâncias: (i) ter a pessoa a direcção efectiva do veículo causador do dano; (ii) estar o veículo a ser utilizado no seu próprio interesse.

  6. Significando a expressão direcção efectiva do veículo o ter um poder de facto ou exercer controlo sobre o mesmo, tem a mesma o seu detentor legítimo, ou seja, o proprietário, o usufrutuário, o locatário e o comodatário, conforma as circunstâncias.

  7. Presente na acção o locatário do veículo, o condutor culposo e o FGA, assegurada também está a legitimidade passiva deste.

  8. Pedindo o autor o ressarcimento de um dano não patrimonial bem pode o julgador indemnizar o mesmo a outro título, por exemplo como dano patrimonial indirecto, assim o qualificando de forma diferente, desde que se mantenha dentro do pedido formulado.

  9. Não se devem confundir danos não patrimoniais com danos patrimoniais indirectos, que são aqueles que derivam da ofensa de bens não patrimoniais: a vida, a saúde, a liberdade, a honra, etc. Sendo os danos patrimoniais directos aqueles que derivam da ofensa de bens patrimoniais.

  10. Constitui entendimento corrente deste Tribunal que o lesado que fica a padecer de determinada incapacidade parcial permanente - sendo a força de trabalho um bem patrimonial que propicia rendimentos, a incapacidade parcial permanente é, consequentemente, um dano patrimonial – tem direito a indemnização por danos futuros, danos estes a que a lei manda expressamente atender, desde que sejam previsíveis. Sendo a incapacidade permanente, de per si, um dano patrimonial, quer acarrete para o lesado uma diminuição efectiva do seu ganho laboral (presente ou previsivelmente futuro), quer lhe implique apenas um esforço acrescido para manter os mesmos níveis dos seus proventos profissionais (actuais ou previsivelmente futuros).

  11. Não tendo ficado apurada qualquer incapacidade permanente – e incumbe ao autor o respectivo ónus da prova – nenhuma indemnização haverá a arbitrar a título de dano patrimonial futuro.

    Decisão Texto Integral: ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA e BB, em representação de seu filho menor CC, vieram intentar acção, com processo ordinário, contra FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL (doravante FGA), TRANSPORTES DD, LDA e EE, pedindo a condenação destes a pagar-lhe a quantia de € 300, a título de danos patrimoniais e a quantia de € 74 819,68, a título de danos não patrimoniais, com acréscimos de juros vincendos.

    Alegando, para tanto, e em suma: No dia 16 de Agosto de 1999, cerca das 13H30, e nas condições de lugar e modo melhor referidas na p. i., ocorreu um acidente de viação, do qual resultou o atropelamento do menor pelo veículo de matrícula …-…-JD, que então era conduzido pelo R. EE, sendo propriedade da Ré TRANSPORTES DD, LDA.

    O acidente ocorreu por culpa exclusiva do condutor do veículo e dele resultaram danos para ao autor, que melhor são descritos na p. i.

    A proprietária do veículo não havia transferido a responsabilidade pelos danos resultantes da sua circulação para nenhuma seguradora.

    Citada a ré FGA, veio a mesma contestar, impugnando a factualidade alegada, por não serem factos pessoais, nem deles dever ter conhecimento.

    Também os RR TRANSPORTES DD e ANTÓNIO EE, vieram contestar, pugnando pela ilegitimidade deste e pela improcedência da acção.

    Veio, entretanto, a Ré TRANSPORTES DD informar ser uma sociedade irregular, estando devidamente representada pelo seu sócio FF.

    A fls 105 e ss veio o autor requerer que a 2ª Ré seja declarada parte ilegítima e que seja chamado a intervir o seu único sócio, FF.

    A fls 184 e ss foi julgada procedente a excepção dilatória da falta de personalidade judiciária da 2ª ré, que foi, por isso, absolvida da instância. Tendo, ainda, sido decidido o incidente de intervenção de terceiros, na modalidade de intervenção principal provocada passiva de FF, ordenando-se a sua citação.

    Citado o mesmo, nenhum articulado ofereceu.

    Foi proferido o despacho saneador, no qual, e alem do mais, foi relegado para momento ulterior o conhecimento da excepção arguida quanto à ilegitimidade do réu EE. Tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

    A fls 1103 e ss, foi pelo autor requerida a ampliação do pedido para € 100 000, a título de danos não patrimoniais. Tendo tal sido deferido.

    Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que dos despachos de fls 1188 e 1240 consta.

    Foi proferida a sentença e, na parcial procedência da acção, foram os réus FGA, FF e EE condenados a pagar ao autor a quantia de € 100 000, acrescida de juros. Tendo, ainda, o réu DD sido condenado como litigante de má fé.

    Inconformado, veio o réu FGA interpor, sem êxito, recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Évora.

    De novo irresignado, veio o mesmo réu pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - Vem o presente recurso de Revista interposto do douto Acórdão que confirma a sentença proferida em primeira instância e que condenou solidariamente o FGA, FF e EE no pagamento ao Autor do montante global de 100.000,00 euros, com a qual não se conforma o FGA.

    1. - A douta sentença confirmada pelo douto Acórdão do TRE condena o FGA sem, no entanto, fundamentar tal decisão.

    2. - O art. 21.º, n.º 2 do D.L. 522/85 de 31/12 estabelece que "O Fundo de Garantia Automóvel garante, por acidente originado pelos veículos referidos no número anterior, a satisfação das indemnizações por: a) morte ou lesões corporais, quando o responsável seja desconhecido ou não beneficie de seguro válido ou eficaz; b) Lesões materiais, quando o responsável, sendo conhecido, não beneficie de seguro válido ou eficaz." 4ª - Ora, no caso dos autos, tratando-se de responsável conhecido, o FGA responde sempre que este não beneficie de seguro válido ou eficaz.

    3. - Analisada a matéria de facto julgada provada, não se alcança, em nenhum dos pontos da matéria de facto que o veículo JD não beneficiava de seguro válido e eficaz.

    4. - Não existe matéria de facto que baste para condenar o FGA, pois em parte alguma da sentença se julga provado o facto " Inexistência de seguro válido", não existindo assim fundamento fáctico para a condenação do FGA.

    5. - Também não existe fundamentação de Direito, pois a douta sentença não tem qualquer justificação para a condenação do FGA.

    6. - A douta sentença confirmada pelo douto Acórdão do TRE refere "No entanto, não havia sido transferida para qualquer seguradora a responsabilidade civil decorrente de acidentes de viação causado pelo veículo referido, pelo que responde, igualmente, o Fundo de Garantia Automóvel, nos termos do art. 21.°, n.º 2 do D.L.522/85 de 31/12." 9ª - O Tribunal não dispunha de nenhum facto que lhe permitisse retirar tal conclusão. A questão da existência ou não de seguro, tendo sido alegada pelo A., não integrava, sequer a base instrutória, pelo que, era matéria da qual o Tribunal não podia conhecer. Aliás, o Autor não reclamou da fixação da base instrutória.

    7. - A douta sentença confirmada pelo douto Acórdão do TRE, viola o disposto no art. 659.°, n.º 2 do C.P.C., encontrando-se, assim, ferida da nulidade prevista no art. 668.°, n.º 1, aIs b) e d) do C.P.C, pois não especifica os factos que justificam a decisão e conhece de questões de que não podia conhecer.

    8. -Não fazendo parte, sequer, da base instrutória, qualquer facto atinente à questão do seguro de responsabilidade civil, encontra-se violado o pressuposto essencial para a condenação do FGA previsto no art. 21.°, n.º 2 do D.L. 522/85 de 31/12.

    9. - Não tendo sido tal facto objecto de prova, é tal facto inexistente e não há fundamento para a condenação do FGA, razão pela qual deve o mesmo ser absolvido.

    10. - Não tendo o FGA levantado a questão da ilegitimidade em articulado, a verdade é que tal configura uma excepção de conhecimento oficioso, excepção de que o Tribunal sempre teria que conhecer.

    11. - Vem o douto Tribunal a quo, conhecendo da excepção de ilegitimidade do FGA, julgar a mesma improcedente, com o que não se conforma o FGA.

      Vejamos, 15ª- Estabelece o art. 29.°, n.º 6 do D. L. 522/85 de 31/12 que "As acções destinadas à efectivação da responsabilidade civil decorrente de acidente de viação, quando o responsável seja conhecido e não beneficie de seguro válido ou eficaz, devem obrigatoriamente ser interpostas contra o Fundo de Garantia Automóvel e o responsável civil, sob pena de ilegitimidade." E, por...

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