Acórdão nº 428/1999.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução25 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. O interveniente acessório provocado não tem legitimidade para recorrer autonomamente da decisão condenatória da parte que, invocando o direito de regresso, requereu o chamamento, podendo, todavia, alegar no âmbito do recurso interposto pela parte principal, completando ou coadjuvando a respectiva argumentação.

  1. Configura-se como actividade perigosa, geradora da presunção de culpa prevista no art. 493º do CC, a que se consubstancia na realização de obra de construção civil de grande amplitude, visando a edificação de uma central termoeléctrica, cuja implantação é precedida de rebentamentos de rocha com explosivos.

  2. O empreiteiro, incumbido da parte de construção civil de obra de grande amplitude e envolvendo alteração radical da estrutura e configuração do prédio, mantém um dever de vigilância, controlo e supervisão, quer do imóvel que, para tal fim, passou a deter, quer da actividade construtiva que nele decorre, mesmo no caso de ter contratado com outras empresas, mediante subempreitadas, certas operações técnicas parcelares, no qual se fundamenta a respectiva culpa presumida pelos danos causados a terceiros.

  3. Não pode eximir-se à responsabilidade pelos danos causados a terceiros a sociedade empreiteira que não provou ser absolutamente estranha à opção técnica por determinado procedimento construtivo, realizado materialmente pela subempreiteira e envolvendo perigosidade agravada para os prédios situados nas imediações, persistindo-se na mesma técnica construtiva mesmo após serem conhecidas ou cognoscíveis as reclamações dos lesados, envolvendo a consumação dos receados danos.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.AA e mulher, BB, intentaram contra CC –Produtora Energética, SA e DD de Portugal-Serviços de Engenharia e Comercialização Industrial, Lda acção condenatória, na forma ordinária, visando efectivar a responsabilidade civil extracontratual pelos danos causados no prédio urbano de que são proprietários pela construção de determinada central termoeléctrica, figurando como dona da obra a 1ª R e como empreiteira a 2ª R., peticionando a quantia de €26.935,09.

    Ambas as RR. contestaram, por impugnação e por excepção, tendo ainda sido requerida e admitida a intervenção acessória provocada das várias empresas que integravam o consórcio a que havia sido cometida a realização do empreendimento, em todas as suas vertentes técnicas, - nomeadamente a Siemens, SA, encarregada do fornecimento e montagem dos equipamentos para produção de energia eléctrica, e dos subempreiteiros a quem a 2ª R. havia adjudicado obras de construção civil preparatórias da implantação da referida central: as sociedades EE-Sociedade Metropolitana de Construções, SA e a Sociedade de Empreitadas FF, SA – que, por sua vez, requereu a intervenção acessória provocada da respectiva seguradora, a Companhia de Seguros HH, SA Seguiram-se os demais articulados, em que as partes reiteraram o seu entendimento sobre a matéria litigiosa, e procedeu-se a saneamento e condensação, sendo julgadas improcedentes as excepções de ilegitimidade, caso julgado e prescrição e assentando-se na definição dos factos assentes e dos controvertidos, enumerados na base instrutória.

    Pelos AA. foi entretanto peticionada a intervenção principal provocada das sociedades FF e EE, na veste de subempreiteiras das obras de construção civil, como associadas dos RR, sendo, todavia, tal pretensão indeferida.

    Procedeu-se a julgamento, sendo proferida sentença que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido, condenando as RR a pagarem solidariamente aos AA indemnização no montante de €16.500,00, acrescidos de IVA, e dos juros moratórios devidos.

    De tal sentença condenatória foram interpostos recursos independentes por ambas as RR e ainda pela seguradora, cuja intervenção acessória havia sido admitida, agora denominada HH, GG – Companhia de Seguros, SA.

    A Relação julgou procedente o recurso interposto pela apelante CC, revogando a sua condenação, decretada pela sentença recorrida, por entender que não podia ser responsabilizada pelos danos causados no imóvel dos AA pelo simples facto de ser a dona da obra, em cuja realização não teria tido intervenção, a não ser para a fiscalizar. E, após negar provimento à impugnação deduzida quanto à matéria de facto apurada, julgou improcedentes os recursos interpostos pela 2ª R, fundando a sua responsabilidade nos poderes de direcção e controlo como empreiteira , caracterizadores de um dever de guarda e vigilância da obra, cuja realização envolve perigo específico e agravado, mesmo quando a sua realização material é confiada a subempreiteiros.

  4. Inconformados com o assim decidido, recorreram a interveniente Companhia de Seguros HH e a 2ª R. DD de Portugal, que encerram as respectivas alegações com as seguintes conclusões: I- A seguradora : 1. A resposta ao quesito 12° da Base Instrutória deve descriminar a data em que se iniciaram os rebentamentos com explosivos por parte da Sociedade de Construções FF, SA., 2. Desde logo para que não haja contradição ou obscuridade com as respostas dadas aos quesitos 61° e 63° - onde se deu como provado que tais rebentamentos ocorreram a partir de meados de Junho de 1995.

  5. Tendo sido requerido no recurso de apelação que, nos termos do disposto no art. 712° - 1 do CPC, fosse alterada a resposta ao quesito 12° da Base Instrutória e não tendo sido alterada tal resposta, compete a este Colendo Tribunal ordenar que a contradição seja suprida pelo Tribunal recorrido, atento o disposto no n° 3 do art. 729° do CPC.

  6. É o que se requer nos termos da citada disposição processual, ou seja, que seja ordenado ao Tribunal recorrido que altere a resposta ao quesito 12° para o seguinte teor: «Provado que tais rebentamentos ocorreram de Março a Setembro de 1995, mas que os rebentamentos efectuados por parte da FF, SA apenas começaram em meados de Junho de 1995».

  7. É que a data de início da utilização dos explosivos pela Ré Sociedade de Construções FF, SA é fundamental para se determinar se a mesma é ou não responsável pelos danos sofridos pelos Autores na sua casa de habitação 6. É que tais danos correram antes de 8 de Maio de 1995.

  8. Impõe-se que este Colendo Tribunal, atento o disposto no art- 722° - 2 do CPC, altere as respostas aos quesitos 18° a 21° inclusive, por forma a que das mesmas conste a data em que os danos aí referidos e descriminados ocorreram.

  9. Resulta, da carta subscrita pelo Autor marido, datado de 6 de Maio de 1995 e cuja fotocópia está junta aos autos, que os danos sofridos pelos Autores na sua casa de habitação, nos anexos e na adega ocorreram antes de 6 de Maio de 1995.

  10. Por isso, porque se trata de um documento que faz prova plena do que nele se contém, ou seja, de que é o Autor marido a declarar que os danos na casa de habitação dos Autores já existiam em 6 de Maio de 1995, data da carta junta aos autos.

  11. Um documento, que faz prova plena, tem como consequência a prova do facto- e o Supremo Tribunal de Justiça tem de conhecer em sede matéria de facto, face à existência do documento (n° 2 do art. 7122° do CPC - «.. .ou que fixe a força de determinado meio de prova».

  12. A não se decidir nos termos acabados de referir, estar-se-ia a violar o disposto nos arte. 368°, 374° e 376° do Cod. Civil.

  13. Assim, deve dar-se como provado nas respostas aos quesitos 18° a 21° que os danos descriminados em tais quesitos ocorreram antes de 6 de Maio de 1995 e, em consequência e atento o disposto no art. 342° do Cod. Civil, deve a Ré FF ser absolvida do pedido.

    II- A DD de Portugal: A. Em abstracto a aqui Recorrente DD de Portugal só poderia ser condenada a título de responsabilidade pelo risco (artigo 500.° do CC) ou por factos ilícitos (em especial, no âmbito do artigo 493.°), mas a verdade é que da factualidade provada nos autos não resulta a atribuição da mesma seja a que título for.

    1. A Recorrente só poderia ser responsabilizada pelo risco, nos termos do artigo 500.°, se exercesse perante as chamadas EE e FF um efectivo poder de direcção, traduzido na emanação de ordens e instruções da primeira a estas últimas, que permitisse concluir pela existência de uma relação de comissão.

    2. Encontrando-se provado, designadamente, que "Nos termos daqueles contratos, a EE e a FF tinham autonomia, designadamente técnica, para realizar todas as operações necessárias à execução dos trabalhos adjudicados"; e que "As empresas contratadas eram ainda totalmente responsáveis pela realização de todos os trabalhos preliminares e auxiliares necessários à execução da empreitada, incluindo as operações de detonação realizadas na Central da Tapada do Outeiro"; conclui-se que a Recorrente não tinha qualquer relação de autoridade e de correspectiva subordinação com as chamadas.

    3. Não tendo sido a ora Recorrente quem executou materialmente os trabalhos de construção civil, não tendo sido ela quem procedeu às operações de rebentamento com explosivos e não existindo qualquer vínculo de autoridade e subordinação entre a ora Recorrente e as chamadas, essa relação de comissão não existe.

    4. O empreiteiro não é responsável por danos causados a terceiros pelo subempreiteiro ou por empregados deste último, mormente quando estes agem com total autonomia técnica.

    5. Quanto ao dever de vigilância, em que o Acórdão do Venerando Tribunal a quo se parece fundar para responsabilizar a aqui Recorrente, importa frisar que o caso presente se enquadra no n.° 2 do artigo 493.°, e não no n.° 1 - não foi o imóvel em si, nem os explosivos em si que causaram os danos (seria aplicável o n.° 1 se, por exemplo, os explosivos guardados detonassem acidentalmente), mas sim a actividade levada a cabo, que consistia em detonações para desmonte de rocha.

    6. O n.° 2 do artigo 493.° não impõe qualquer dever de vigilância, pois alguém que desempenha uma actividade não se pode vigiar a si próprio no desempenho dessa actividade; pode, sim, tomar as...

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