Acórdão nº 03333/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelEUGÉNIO SEQUEIRA
Data da Resolução16 de Março de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.

  1. O Exmo Subdirector-Geral dos Impostos (SDGI), dizendo-se inconformado com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa - 2.ª Unidade Orgânica - que julgou procedente a acção administrativa especial deduzida por A...e & Kg, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: A) A, aliás, douta sentença recorrida incorreu em excesso de pronúncia, o que a inquina no vício de nulidade, nos termos da al. d) do n° 1 do art. 668° do CPC, bem como, fez uma incorrecta interpretação e aplicação da lei aos factos, não se podendo, pois, manter.

    1. Na verdade, considerou o tribunal "a quo" que se verificava o vício de falta de audição prévia, pelo que, ao se ter pronunciado no sentido da anulação do acto pela verificação daquele vício, estava-lhe vedada a apreciação do vício de fundo atribuído ao mesmo acto.

    2. Na verdade, sendo a falta de audição um vício formal que afecta a formação da vontade administrativa deve ser apreciado antes dos vícios que influem na formulação da própria vontade, desde que se esteja perante uma situação em que o interessado pode contrapor, perante a decisão a adoptar pela autoridade administrativa, novos elementos susceptíveis de contraditar a posição tomada e influenciar a decisão final.

    3. Acresce que, também a jurisprudência tem admitido que a tutela mais eficaz dos interesses do recorrente contencioso pode passar pelo conhecimento prioritário do vício de forma, concretamente do vício de falta de audição do contribuinte, dado que este vício leva à renovação do acto e à realização de tal audição que pode fornecer ao juiz novos elementos, quanto aos pressupostos de facto e de direito da decisão, na apreciação dos vícios de fundo do acto.

    4. E daí que, no caso em concreto, se impusesse ao Tribunal "a quo" o conhecimento prévio do vício de forma imputado ao acto impugnado e procedendo o mesmo, como também foi decidido, devesse o Tribunal "a quo" abster-se de conhecer do vício de violação de lei, uma vez que, determinando a procedência do vício de forma a possibilidade de a AT renovar o acto, há que concluir que o Mmo Juiz "a quo" ainda não está de posse de todos os elementos que lhe permitam avaliar da correcção, ou não, dos pressupostos de facto e de direito do acto impugnado.

    5. Pelo que, a sentença recorrida ao ter conhecido e ter decidido pela procedência do vício de forma, falta de audição dos então A.A. e ora recorridos imputado ao acto e ao ter, igualmente, conhecido e decidido, prioritariamente, o vício de violação de lei, quando não o podia fazer, por ser prioritário conhecer do vício de forma, cuja procedência esgotava o seu poder jurisdicional, incorreu em excesso de pronúncia, sendo nula nos termos da al. d) do n° 1 do art. 668° do CPC.

    6. Por outro lado e, ainda que assim não se entenda, relativamente à declarada procedência do vício de falta de audição prévia, há insuficiência da matéria de facto dada como provada pela sentença recorrida, porquanto, embora não esteja assente na matéria de facto dada como provada, resulta, até por confissão das próprias A.A., que estas, à data dos pedidos, não tinham designado um representante com domicílio fiscal em Portugal.

    7. Tal facto, conjuntamente com o de as A.A serem sociedades não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal, é fundamental e deveria ter sido tomado em consideração pela sentença recorrida, obstando, na subsunção dos mesmos factos ao direito, à consideração da procedência do vício de forma, por preterição de audição prévia.

    8. É que, da designação de um representante legal, depende o exercício dos direitos perante a administração fiscal portuguesa, incluindo os de reclamação, recurso ou impugnação, cfr. se estabelece nos n° 4 e 5 do art. 19° da LGT.

    9. Assim, sendo inquestionável que as então A.A. e ora recorridas não possuíam sede ou direcção efectiva em Portugal, não tinham aqui qualquer estabelecimento estável e nem sequer tinham, à data dos pedidos de reembolso, indicado um representante com residência em território nacional, devia a, aliás, douta sentença recorrida, ter considerado que faltava um pressuposto processual para que as A.A. pudessem ser notificadas para o exercício do direito de audição, uma vez que este é exercido em Portugal, através de sujeito passivo residente em Portugal, ou não o sendo, por via do seu representante legal.

    10. Ao não o ter feito, a sentença recorrida fez uma incorrecta interpretação e aplicação do art.

      60° da LGT.

    11. Mesmo que assim também não se entenda, sem conceder, quanto à declarada procedência do vício de violação de lei, embora tenha sido invocado pelo ora recorrente e até conste dos documentos juntos pela A. não consta, como devia, da matéria de facto dada como provada pela, aliás, douta sentença recorrida, que as A.A. nos próprios impressos Mod. 15-RFI, juntos à p.i., indicam como data da colocação do rendimento à disposição as datas de 28/04/97 (doc. 14), 26/02/98, (doc.15), 24/04/98 (doc. 19) e 01/07/99 (doc.20) e como datas do apuramento do respectivo quantitativo, no caso de royalties, as de 16/09/97 (doc. 16), 24/09/98 (doc.17) e 27/09/99 (doc. 18).

    12. Assim, tendo em conta aquelas datas, que fundamentam os pedidos e que as A.A. admitem como tendo sido as datas da colocação do rendimento à sua disposição e, atendendo a que as retenções na fonte efectuadas pela Degussa-Hulls e B...entraram nos cofres do Estado nos anos de 97, 98 e 99, a, aliás, douta sentença recorrida só poderia ter concluído pela extemporaneidade do pedido de reembolso apresentado pelas então A.A.

    13. E, se as então A.A. pretendiam pedir o reembolso na sequência de um procedimento de liquidação adicional do imposto por parte da AT, por os substitutos tributários não terem cumprido com os requisitos para a aplicação da Directiva n° 90/435/CEE, podiam ter efectuado uma reclamação graciosa nos termos e prazos estabelecidos no art. 132° do CPPT, ou, podiam efectuar um pedido de reembolso, atendendo ao prazo constante do n° 6 do art. 90° do CIRC, na redacção introduzida pela Lei 32-B/2002, que estabelece um prazo de dois anos, contado da verificação do facto gerador do imposto.

    14. Contudo, a aplicação do novo prazo constante do n° 6 do art. 90° do CIRC, na redacção introduzida pela Lei 32-B/2002, só se pode efectivar perante situações não consolidadas na ordem jurídica.

    15. Por outro lado, uma coisa é a liquidação adicional de imposto que levou à aplicação da taxa normal em detrimento da taxa reduzida e que podia ter sido atacada por via de impugnação judicial, outra coisa é um pedido de reembolso feito em virtude dessa liquidação adicional, que não foi, em tempo, posta em causa.

    16. Assim, tendo essa liquidação adicional por causa o não cumprimento de determinados pressupostos formais, as então A.A. só podiam solicitar o reembolso do imposto se viessem, posteriormente e, tendo em conta que não atacaram por via de impugnação judicial a legalidade de aplicação de tais pressupostos, efectuar a prova de que preenchiam tais pressupostos, sendo também nesta base que poderia ter lugar a aplicação do n° 6 do 90° do CIRC, em conjugação com o n° 3 desse mesmo artigo, ambos introduzidos pela Lei 30-B/2002.

    17. Deste modo, ao ter determinado o direito ao reembolso, sem ter remetido para a AT a apreciação dos pressupostos dos quais depende o direito ao reembolso do imposto, por parte das A.A., a aliás, douta sentença recorrida fez uma incorrecta apreciação dos artigos 95° n° 3 do CPTA e 90° nos 3 e 6 do CIRC, na redacção que foi introduzida pela Lei 32-B/2002.

      Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exa., deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, devendo ser declarada nula a sentença, por excesso de pronúncia, ou, caso assim não se entenda, ser a mesma revogada, por ter feito uma insuficiente consideração da matéria de facto dada como provada e uma incorrecta apreciação e aplicação dos factos ao direito.

      Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito suspensivo.

      Também as recorridas vieram a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem:

    18. O Tribunal a quo considerou que as decisões de indeferimento dos pedidos de reembolso de retenções na fonte de IRC formulados pelas Recorridas eram passíveis de ser anuladas, uma vez que as mesmas (i) padeciam de vício formal consubstanciado na preterição do direito de audição prévia previsto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária ("LGT”) e (ii) vício de lei, porquanto os pedidos de reembolso foram tempestivos face ao disposto no artigo 90º, n.º 6 do CIRC, sendo, pois, inoponível a Circular n.º 18/99 face ao disposto nos artigos 10º e 12º do ADT celebrado entre Portugal e a Alemanha; B) As questões que cumpre analisar no presente recurso consistem na apreciação (i) do alegado excesso de pronúncia por parte do douto Tribunal a quo, (ii) da violação do direito de audição prévia antes da prolação da decisão de indeferimento dos pedidos de reembolso formulados pelas Recorridas e, bem assim, (iii) da tempestividade dos referidos pedidos de reembolso; C) Quanto ao excesso de pronúncia, uma tal asserção viola de forma frontal o disposto no artigo 95°, n.º 2 do CPTA, estando em evidente contradição com as demais alegações da Recorrente, desde logo porquanto esta entende que (i) não há lugar ao direito de audição prévia que agora pretende promover e (ii) de um ponto de vista material, os pedidos de reembolso são intempestivos, pelo que a pretensão das Recorridas é insusceptível de ser obtida pela via procedimental e administrativa; D) Tendo sido invocados pelas ora Recorridas vício de forma e vício de lei, cabia ao Tribunal a quo pronunciar-se sobre ambas as questões, sob pena de incorrer em omissão de pronúncia, nos termos do...

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