Acórdão nº 34/10 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Janeiro de 2010

Magistrado ResponsávelCons. Presidente
Data da Resolução26 de Janeiro de 2010
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 34/2010

Processo n.º1/CCE

Apenso n.º1-A

Plenário

ACTA

Aos vinte e seis dias do mês de Janeiro de dois mil e dez, achando-se presentes o Excelentíssimo Conselheiro Presidente Rui Manuel Gens de Moura Ramos e os Exmos. Conselheiros Maria João da Silva Baila Madeira Antunes, Carlos José Belo Pamplona de Oliveira, João Eduardo Cura Mariano Esteves, Joaquim José Coelho de Sousa Ribeiro, Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Ana Maria Guerra Martins, José Manuel Cardoso Borges Soeiro, Gil Manuel Gonçalves Gomes Galvão, Maria Lúcia Amaral, Benjamim Silva Rodrigues e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, foram trazidos à conferência os presentes autos, para apreciação.

Após debate e votação, foi ditado pelo Excelentíssimo Conselheiro Presidente o seguinte:

ACÓRDÃO N.º 34/2010

  1. Relatório.

    1. No âmbito dos presentes autos, instaurados ao abrigo do disposto no n.º 2 do art.103º-A da LTC para conhecimento de factos subjectivamente supervenientes à apreciação das contas da campanha eleitoral para as eleições legislativas realizadas no dia 20 de Fevereiro de 2005, veio o Ministério Público em 9 de Dezembro de 2009, na sequência da vista que lhe foi concedida nos termos previstos no referido preceito legal, promover em suma o seguinte:

      A. Factos:

      1. Decorre dos elementos probatórios coligidos nos autos que:

      Durante o período da campanha eleitoral para as Eleições Legislativas, realizadas em 20 de Fevereiro de 2005, foram efectuadas, no Brasil e tendo em vista o Círculo de Emigração de Fora da Europa, várias acções de propaganda política no âmbito da candidatura do Partido Socialista, envolvendo meios financeiros com alguma expressão financeira e que não estão reflectidas nas contas da campanha eleitoral em causa, entregues, por este Partido, no Tribunal Constitucional.

      Estamos, pois, perante factos supervenientemente conhecidos e autónomos dos já verificados e sancionados no âmbito do processo normal de prestação das contas da campanha eleitoral para essas eleições, no que ao Partido Socialista diz respeito.

      2. Concretamente, essas acções de propaganda realizaram-se no Estado e cidade do Rio de Janeiro e traduziram-se na:

      a) - contratação de 30 programas de rádio, em diversas emissoras na cidade do Rio de Janeiro, com, pelo menos, quatro inserções do anúncio de propaganda por programa, sendo o texto do anúncio do seguinte teor (que se encontra documentado no CD-R junto aos autos):

      “Você quer um Consulado de Portugal moderno e eficiente,

      Você quer a dignificação do emigrante português,

      Se você quer ser tratado com igualdade com os portugueses residentes em Portugal,

      Se você quer ser um cidadão português no pleno uso dos seus direitos…

      Então vote em quem vai governar Portugal.

      Por Portugal e pelos portugueses vote no Partido Socialista. Vote PS.

      Vote em Aníbal Araújo e Vítor Ramos”;

      b) - divulgação diária de propaganda, paga, na Rede de Televisão Bandeirantes, conforme vídeo documentado no DVD-R junto aos autos, e cujo texto do anúncio é:

      “Você é emigrante português que vota nas eleições de 20 de Fevereiro?

      Vote no Partido Socialista para continuar a luta pelas comunidades.

      Vote Aníbal Araújo, Vítor Ramos e José Lello pedem o seu apoio.

      Por Portugal e pelos portugueses vote no PS, partido que defende o emigrante”;

      Sublinhe-se que as imagens que servem de suporte ao anúncio, se referem, a uma refeição em que participam muitas pessoas, refeição essa, porém, que contou, ainda, com a presença do Sr. Engenheiro José Manuel Lello Ribeiro de Almeida, José Lello, durante as quais surgem os símbolos que identificam o PS.

      c) - contratação e colocação de propaganda em vários autocarros, na cidade do Rio de Janeiro, de que a fotografia de fls. 150 constitui exemplo, e onde se pode constatar que, na parte posterior de um autocarro, que circula com matrícula do Rio de Janeiro, se encontra um anúncio com o seguinte texto:

      “Por Portugal e Pelos Portugueses no Brasil

      Vota Partido Socialista” (seta a indicar o símbolo do PS)

      “Continua a luta pelas Comunidades

      Aníbal Araújo com José Sócrates e José Lello”

      (com as fotografias de José Sócrates, Aníbal Araújo e José Lello);

      d) - contratação de transporte, de avião, sobrevoando as praias do Rio de Janeiro, de faixas com conteúdo de propaganda a favor da candidatura do PS;

      e) - montagem de uma central telefónica, utilizada para contactar potenciais eleitores, convidando-os a votarem no Partido Socialista, e, ainda, de uma frota para transportar os votos dos eleitores, das residências destes até aos correios, onde eram despachados por essa via.

      B. Enquadramento dos factos e enumeração de circunstâncias que relevam na apreciação dos mesmos, tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova.

      3. Importa, aqui, esclarecer que Aníbal Araújo (Aníbal de Oliveira Araújo), a que se referem os suportes publicitários a que se acabou de fazer referência, foi cabeça de lista do Partido Socialista nessas eleições, para o Círculo de Fora da Europa, a convite de do Sr. Engenheiro José Manuel Lello Ribeiro de Almeida, coordenador da campanha eleitoral do PS para as legislativas de 2005 e mandatário do Partido Socialista no Círculo Eleitoral da Europa e no Círculo Eleitoral de Fora da Europa.

      Por sua vez, Vítor Ramos (Fernando Vítor Ramos da Silva Serra), era o segundo candidato da lista do PS para esse mesmo Círculo Eleitoral.

      4. De salientar, também, o ofício/carta, datado de 28 de Janeiro de 2005, assinado por Oliveira Nunes, coordenador desta mesma campanha eleitoral, do Partido Socialista no Rio de Janeiro, dirigido aos “Radialistas” Luso-Brasileiros, autorizando a inserção na rádio dos anúncios de propaganda do PS, de quarenta e cinco segundos cada, quatro vezes por programa, nos fins de semana de 29/30 de Janeiro, de 5/6 de Fevereiro e de 12/13 de Fevereiro, de 2005.

      Como se pode ler no referido ofício/carta, do coordenador do PS, no Rio de Janeiro, para estas eleições (cfr. fls. 149 dos autos), por cada programa seria paga a quantia de quatrocentos reais, pagamento esse que deveria ser agendado com a “Srª. Linda”, pelo telefone nº 2495-9163.

      5. Ora, após diligências efectuadas pela Polícia Judiciária (PJ), através de pesquisas livres na Internet, (cfr. fls 101), apurou-se que esse número de telefone pertence, de facto, ao Partido Socialista no Rio de Janeiro, Brasil, com morada na R. Gildásio Amado, 55 Salas 1501 a 1504, Edifício Centro da Barra, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro.

      Esta é, pois, a morada da sede do PS no Rio de Janeiro (fls.103), sendo que o edifício, em que a mesma se situa, pertence a Licínio Soares Bastos, filho de Desidério Bastos, Presidente de Honra da Secção PS do Brasil (ver fls. 105), entretanto falecido.

      6. Sublinha-se, ainda, que Licínio Soares Bastos veio, mais tarde, a ser nomeado, por despacho de 16 de Maio de 2006, do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, António Fernandes da Silva Braga, para o cargo de cônsul honorário de Portugal em Cabo Frio, Brasil, consulado este criado uns dias antes, por despacho de 3 de Maio de 2006, do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

      No entanto, por despacho de 3 de Setembro de 2007, proferido pelo Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, foi revogada a sua nomeação para tal cargo, após conhecimento público de notícias do envolvimento de Licínio Bastos na chamada “Operação Furacão”.

      A investigação realizada no âmbito deste processo, que, no Brasil, desmantelou uma rede de jogo ilícito, de branqueamento de capitais e de corrupção, veio a colocar Licínio Bastos como um dos principais suspeitos pelo que este, depois de ter andado foragido à justiça, acabou por vir a ser detido no âmbito da mesma investigação.

      7. Destaca-se, também, que o subscritor da mencionada carta aos “Radialistas”, Oliveira Nunes, de seu nome completo, Francisco José de Oliveira Nunes, foi membro do Secretariado do Partido Socialista no Rio de Janeiro, desempenhando, à data dos factos, o cargo de Presidente da Comissão Política da Secção do PS no Rio de Janeiro.

      Ora, na altura dos factos em apreciação, o Sr. Oliveira Nunes apresentava-se como coordenador da campanha do PS no Rio de Janeiro e era publicamente reconhecido como tal.

      8. Não pode, por isso, deixar de se manifestar alguma estranheza, senão mesmo completa estupefacção, com o depoimento do Sr. Eng. José Lello, bem como do esclarecimento prestado a fls. 276 pelo PS, sobre os factos atrás apontados.

      Com efeito, de ambos os esclarecimentos prestados pretende-se – embora se não veja, concretamente, como, perante indícios tão concludentes – que resulte que o Sr. Eng. José Lello se terá deslocado, apenas em viagem privada ao Brasil, circunscrita a amigos, concretamente, ao Rio de Janeiro, no fim de semana de 22 e 23 de Janeiro de 2005.

      No entanto, nessa mesma altura – e de forma pouco ou nada consentânea com o carácter privado de tal visita –, esteve presente num jantar de aniversário em Niteroi, numa visita a uma associação, foi entrevistado por uma rádio da comunidade local e por um programa de televisão local.

      9. Por outro lado, o Sr. Aníbal Araújo, cabeça de lista do PS para o Círculo Eleitoral de Fora da Europa, no depoimento que prestou, refere expressamente que, durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 2005, se deslocou ao Brasil, Canadá e Estados Unidos da América para acções de campanha, entrevistas, encontros com militantes, dirigentes associativos e comunidade emigrante em geral, tendo sido acompanhado pelo Sr. Eng. José Lello. Será, então, possível que o Sr. Aníbal Araújo estivesse em viagem oficial da campanha, mas o Sr. Eng. José Lello em mera viagem particular?

      Possível, será, mas tal argumentação afigura-se como pouco credível.

      Acresce, que, relativamente às acções de propaganda aqui em análise, menciona o Sr. Aníbal Araújo, ter constatado, “in loco”, a sua existência/ocorrência, pelo que não põe, sequer, em causa, a sua realização.

      10. Também o Sr. Carlos António Páscoa...

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