Acórdão nº 07S1699 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução22 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - A ré Companhia de Seguros Empresa-A, S.A.

interpôs a presente revista do acórdão da Relação do Porto que, em apelação por ela interposta e a que aderiu a co-ré Empresa-B, Lda, confirmou a sentença que havia condenado:

  1. A Ré Empresa-A no pagamento, para cada um dos Autores AA e mulher BB (residentes na Rua Fernando Ferrari, nº. ..., Vila Industrial, Dourados, Mato Grosso do Sul, Brasil), do capital de remição correspondente à pensão, anual e vitalícia de 1.028,82 €, com início em 31.10.2003; b) A Ré Empresa-B, Lda no pagamento, para cada um dos referidos AA., do capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de 689,85 €, com início em 31.10.2003.

Apresentou, na revista, as seguintes conclusões: A. - Estabelece o art. 20° n.º 1, al. d) e n.º 2 da Lei n.º 100/97 que, se do acidente resultar a morte da vítima, não havendo cônjuge ou filhos com direito a pensão, os seus ascendentes têm direito a reparação dos danos emergentes desse acidente, desde que o sinistrado contribuísse com regularidade para o seu sustento.

B. - Para além deste pressuposto, é também necessário que os ascendentes tenham necessidade dessa contribuição, ou seja, que sejam realmente portadores de um grau de dependência económica em relação ao sinistrado falecido, sendo certo que a invocação e demonstração dos factos que integram estas condições constitui ónus dos AA., nos termos do preceituado no art. 342°, n.º1 do Cód. Civil, por revestirem natureza constitutiva do direito que pretendem fazer valer.

C. Esta exigência advém do destino da contribuição (alimentos) por força do disposto no n. ° 1 do art. 2004°, do Cód. Civil, que estabelece como critério definidor da medida dos alimentos a "necessidade daquele que houver de recebê-los", bem como da al. b) do n.º 1 do art.º 2013° do mesmo diploma, que estipula a cessação da obrigação de alimentos quando "aquele que os recebe deixe de precisar deles".

D. - Tal significa que o direito dos familiares da vítima à pensão consagrada na al. d) do n.º 1 do art. 20° da Lei 100/97, é uma emanação do instituto da obrigação alimentar, e esta existe apenas a favor das pessoas que não podem prover integralmente ao seu sustento, como decorre do disposto nos arts. 2003° e 2004°, ambos do Cód. Civil.

E. - No caso dos autos, a propósito da verificação deste duplo condicionalismo, ficou apenas provado que parte do salário que o falecido remetia para os AA. se destinava à melhoria das suas condições de vida e outra, para comprar casa própria - ponto 7 dos factos assentes -, pelo que não é possível discernir e afirmar, com o rigor indispensável ao fundamento de uma decisão, que a contribuição do sinistrado se destinava a possibilitar um melhor nível de vida, mas que, ao invés, não era absolutamente indispensável à satisfação das mais elementares necessidades dos AA.

, sendo certo que, só nesta vertente, esta contribuição releva para efeitos de atribuição de pensão.

F. - Dos factos assentes, resulta que o A. é agricultor, aufere uma pensão por acidente de trabalho, no valor de Eur.42,00/mês, o que é correspondente a 50% do salário mínimo nacional brasileiro e que a A. é doméstica, fazendo alguns arranjos de costura.

G. - Acresce que, os AA. não demonstraram, desde logo, que não fossem proprietários fundiários e bem assim que não tivessem outros rendimentos, por exemplo, de trabalhos agrícolas em propriedades próprias ou alheias - dado que ficou assente que o A. é agricultor -, de serviços prestados para além do horário de trabalho ou de actividades comerciais, e por outro lado, não invocaram, nem demonstraram que, antes do sinistrado começar a trabalhar, tivessem necessidades incomportáveis para os rendimentos que, então, auferiam, ou seja, como até então viviam.

H. - Também, os Recorridos não demonstraram: qual a parte do numerário enviado que se destinava a eles (AA.) mesmos, qual a respeitante à aquisição de habitação e, fundamentalmente, se ambas eram enviadas todos os meses ou interpoladamente e ainda, na hipótese da quantia remetida ser menor, qual dos destinos tinha prioridade.

I. - Aliás, é público e notório, não carecendo por isso de alegação e demonstração, que, sendo o A. agricultor, seguramente retirará rendimentos desta situação - seja em espécie, seja em dinheiro -, susceptíveis de contribuir para o seu sustento, bem como da sua esposa, conforme até se reconhece na decisão sob censura.

J. - Ademais, não foi alegado e, por isso, também não foi demonstrado - como era ónus dos Recorrentes - que, após o falecimento do sinistrado, estes tivessem que recorrer a outros expedientes (um segundo emprego, por exemplo) para compensar a eventual falta de contribuição do sinistrado.

K. - Do circunstancialismo apurado sobre este particular aspecto, não pode concluir-se pela verificação do apontado pressuposto da necessidade da contribuição do sinistrado, no sentido de que a mesma era absolutamente indispensável à satisfação das mais elementares necessidades dos AA., pois, só nesta medida, releva para efeitos de atribuição de pensão, pelo que não se encontram apuradas nos autos as aludidas condições objectivas para que possa reconhecer-se aos AA. o direito que invocam na presente acção, em razão do que a acção tem fatalmente de improceder no que respeita às pensões peticionadas.

L. - Julgando de modo diferente, o acórdão sub judice fez errada interpretação dos factos e incorrecta aplicação da lei, designadamente da al. d), do n.º 1 do art.º 20° da Lei 100/97 de 13 de Setembro, dos artºs 2000 e segs CCiv., que violou, devendo, por isso, ser revogado e substituído por outra que, aplicando o referido preceito, absolva a Recorrente do pagamento aos M. de qualquer pensão por morte do filho.

M. - No que concerne à dinâmica do acidente, da matéria provada nos autos, resulta que o sinistro se ficou a dever, em exclusivo, a negligência grosseira do sinistrado.

N. - A verificação desta qualificação deverá traduzir-se num comportamento imprudente, inútil, um incumprimento da elementar diligência usada pela generalidade das pessoas, segundo um padrão objectivo, fornecido pelo procedimento habitual de um homem de sensatez média - neste sentido Ac. do S.T.J., de 12.05.89, in B.M.J., n.387, pág.400.

O. - O factualismo dado como apurado na sentença, designadamente sob os n.ºs 10, 12, 13, 14, 15 e 16 é, por tal forma, exuberante quanto à culpa grave e exclusiva do sinistrado que outra conclusão não admite que não seja a descaracterização do acidente.

P. - Da matéria de facto assente resulta insofismavelmente que o sinistrado cometeu uma gravíssima violação às regras estradais, ao circular, com um veículo pesado, a uma velocidade de 90 Km/hora, num local - curva...

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