Acórdão nº 08S1425 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório Na presente acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho, proposta por AA contra S... C... - I... M... e V... de T..., S. A.

, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, o autor pediu que a ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia global de € 29.320,93, acrescida de juros de mora, contados desde a citação, sendo € 2.926,33 a título de diferenças nas comissões de vendas, € 24.141,06 a título de trabalho prestado aos Sábados e Domingos, nos anos de 1994 e seguintes até Maio de 2003, e € 2.253,54 a título de trabalho suplementar prestado de 2.ª a 6.ª-feira, sendo € 1.037,11 referentes às primeiras horas e € 1.216,43 às restantes horas.

Em resumo, o autor alegou o seguinte: - a ré é uma empresa que se dedica à indústria e comércio de veículos automóveis; - o autor foi admitido ao serviço da ré em 23 de Agosto de 1994, com a categoria profissional de vendedor e tinha ultimamente como local de trabalho as instalações da ré sitas em Prior Velho; - à relação laboral existente entre as partes era aplicável o CCT celebrado entre a ACAP e a FETES, publicado no BTE n.º 39/82, com alterações nos BTE's n.os 8/96 e 12/97; - por aviso afixado na empresa, com invocação do art.º 37.º, n.º 3, da LCT, foi comunicado ao A. que, em Maio de 2003, as instalações onde ele vinha desempenhando a sua actividade iam ser transmitidas para a sociedade S... C... - C... de A..., S. A., como efectivamente sucedeu; - na sequência do referido aviso, o autor escreveu à sociedade adquirente do estabelecimento reclamando os créditos no valor de e 39.883,18, mas a adquirente recusou o seu pagamento, alegando que os mesmos não eram devidos; - a verdade é que os aludidos créditos existem e reportam-se a trabalho suplementar prestado de segunda a sexta-feira, 2.ª a 6.ª-feiras, a trabalho prestado aos sábados e domingos e à redução unilateral por parte da ré dos valores das comissões de vendas; - na verdade, a partir de 2001, a média das comissões auferidas pelo autor desceu e tal ficou a dever-se a uma alteração, imposta pela ré, dos critérios de atribuição das comissões; - com efeito, até 2001, o valor da comissão mantinha-se igual na venda dos dois primeiros veículos, subindo na venda do terceiro e, a partir de 2001, passou a ser igual na venda dos três primeiros veículos, aumentando só na venda do quarto, sendo que o autor dificilmente conseguia vender quatro veículos no período de referência das comissões; - a alteração imposta pela ré traduziu-se numa diminuição da retribuição e, violação do disposto no art.º 21.º, n.º 1, al. c), da LCT, assistindo-lhe, por isso, o direito a receber o diferencial entre a média mensal das comissões auferidas nos anos de 1999 e 2000 (€ 692,36) e a média das comissões recebidas nos anos de 2001, 2002 e 2003 (até Maio) no montante de € 2.926,33; - nos termos do art.º 82.º da LCT e da cláusula 79.ª, n.º 3, do CCT aplicável, a retribuição mensal do autor integra, para todos os efeitos, a retribuição de base e a média das comissões, devendo considerar-se que o valor média das comissões nos anos de 2001, 2002 e 2003 era de € 692,36; - enquanto esteve ao serviço da ré, o autor teve como dia de descanso semanal o domingo e como dia de descanso complementar o sábado; - nos termos da cláusula 74.ª do CCT aplicável, o trabalho prestado no dia de descanso complementar é pago com um acréscimo de 300%; - e, nos termos da cláusula 73.ª do mesmo CCT, o trabalho suplementar é pago com um acréscimo de 50% na 1.ª hora e com um acréscimo de 75% nas restantes horas; - desde a sua admissão, o autor prestou trabalho aos sábados 27 vezes por ano, uma vez que alternava meses em que trabalhava dois sábados com meses em que trabalhava três sábados; - além disso, cada vendedor e, por isso, também o autor, prestava trabalho em dois domingos por ano ou na FIL, por ocasião dos Salões Automóveis, ou nos Centros Comerciais, para exposição dos veículos; - e, em cada ano, o autor também prestava um número mínimo de 30 horas de trabalho suplementar, para assegurar o funcionamento dos stands de vendas, de acordo com as escalas de serviço organizadas pela ré; - a ré nunca pagou ao autor o trabalho prestado aos sábados e domingos nem o trabalho suplementar prestado nos outros dias.

A ré contestou, alegando, fundamentalmente, o seguinte: - os pedidos formulados pelo autor são praticamente ininteligíveis; - o autor afirma ter auferido, desde 1994 a 2003, uma média anual a título de comissões, mas tais valores não se encontram minimamente demonstrados, fundamentados ou concretizados; - de qualquer modo, sempre se dirá que as comissões são, por natureza, variáveis; - é falso que a média das comissões tenha descido, a partir de 2001; - os números indicados pelo autor referentes aos anos de 2001 a 2003 são, no mínimo, em larga medida, superiores aos auferidos nos anos de 1994 a 1998, inclusive; - se alguma diminuição houve relativamente às comissões pagas nos anos de 2001 a 2003 em comparação com o ano de 2000, tal ficou e dever-se à diminuição do número de unidades automóveis vendidas pelo autor, ou pela sua natureza diversa; - em 2000, o autor vendeu 8 viaturas novas e 110 usadas; em 2001, vendeu 25 viaturas novas e 23 usadas; em 2002, vendeu 46 viaturas novas e em 2003, em cinco meses, vendeu 17 viaturas; - como é evidente, o esquema comissional entre viaturas novas e viaturas usadas é totalmente diferente, e, por isso, só se poderia verificar se tinha havido diminuição relativa da comissão se os critérios de aferição fossem únicos; - é lícito à ré proceder à alteração dos critérios que estabelecem os valores comissionais conquanto não resulte diminuição da retribuição e da mera alteração dos critérios em causa não decorre que o autor tenha sofrido efectivamente qualquer quebra de retribuição; - é do conhecimento comum que o mercado automóvel é, por excelência, dinâmico e o comércio automóvel é o primeiro dos mercados a sofrer as consequências do contexto económico envolvente; - tal facto determina que, à semelhança do que aconteceu com a ré, os critérios de atribuição de comissões não sejam estabelecidos consensualmente entre a empresa e os vendedores, mas antes determinados unilateralmente pela ré, em função do contexto económico e comercial e apenas para um período temporal específico, findo o qual poderão ser revistos ou substituídos por outros; - desde logo, porquanto não é possível tornar imutáveis ao longo dos anos todas as condições que determinam o estabelecimento de uma dada grelha comissional, seja porque os próprios modelos automóveis têm de ser alterados, renovados ou substituídos por outros, seja porque a própria ré está dependente dos critérios económicos e comerciais impostos pelo respectivo fornecedor; - por outro lado, como também é do conhecimento comum, o período em causa, 2001 a 2003, constituiu um dos períodos mais negativos para a indústria e o comércio automóvel em Portugal, envolvido num contexto económico recessivo e com redução drástica de investimento público e privado que, necessariamente, resultou numa diminuição avassaladora do número de unidades comercializadas; - o autor não ignora que a diminuição dos valores auferidos a título de comissões deverá ser imputada ao próprio mercado e não á alteração dos critérios de remuneração; - por via do autor conhecer tal situação se justifica o facto de se ter limitado, vagamente, a invocar a diminuição da média de comissões sem identificar especificamente em que situações terá ficado prejudicado; - a parte variável da retribuição do autor estava dependente do número de vendas em que intervinha e os autos não contêm qualquer indicação do número de unidades vendidas pelo autor, em cada mês especificamente, respectivos modelos e, em cada caso, o valor que o autor considera ser devido, sendo certo que são tais dados que permitem a verificação, ou não, de a eventual diminuição da retribuição por tal via e com referência a cada mês em concreto; - o autor alega que, entre 1994 e 2003, trabalhou em 27 sábados por ano, mas os documentos que juntou para provar tal alegação não têm essa virtualidade; - o autor teria de alegar quais os sábados em que efectivamente trabalhou e, sobretudo, quais as horas prestadas em cada um deles; - a presença do autor aos sábados insere-se na prestação normal de um vendedor, transferindo-se o dia de descanso complementar para outro dia da semana seguinte; - por outro lado, o autor bem sabe que, nos termos da cláusula 52.ª, n.º 3, alíneas a), b), e) e f), do CCT aplicável ao sector, tinha direito, pelo trabalho prestado ao sábado de manhã, a um acréscimo de 2%, calculado sobre o salário base, ou a um acréscimo de 5% se o trabalho fosse prestado ao longo de todo o dia, para além do pagamento do próprio dia, ou parte do dia, em causa; - acresce que no próprio contrato de trabalho, que o autor juntou como doc. 1 da p. i., consta da cláusula 7.ª que o autor dá o seu acordo à alteração do horário de trabalho estabelecido, o que significa que ele concordou e beneficiou com o facto de ter trabalhado alguns sábados, mas em regime de trabalho ao abrigo do citado preceito convencionado no CCT; - aliás, o autor, sempre que trabalhou ao sábado, descansou na segunda-feira seguinte; - o autor bem sabe que tais quantias, quando efectivamente devidas, lhe foram pagas, e bem sabe também que sempre teve direito ao descanso compensatório nos termos do CCT; - o referido obsta a que o autor tenha direito ao pagamento do trabalho prestado ao Sábado com um acréscimo de 300%; - quanto ao alegado trabalho suplementar prestado em 30 horas/ano, o autor não indicou qual o horário normal de trabalho que prestava; - acresce que a prova do trabalho suplementar prestado há mais de cinco anos só é possível mediante documento idóneo, documento que é omitido pelo autor; - por outro lado, a prestação de trabalho suplementar tem de ser prévia e expressamente determinada pela entidade empregadora, sob...

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