Acórdão nº 0870/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Maio de 2012
Magistrado Responsável | PEDRO DELGADO |
Data da Resolução | 23 de Maio de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A sociedade A……, Ldª., com os sinais dos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra de 19 de Maio de 2011, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA referente ao exercício de 1996 e respectivos juros compensatórios no montante global de 4.177.896$00 (20.839.26 €).
Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «1ª A deliberação da Comissão de Revisão constitui um acto tributário de fixação da matéria tributável, pelo que, ainda que esta se limite a manter um valor encontrado em acção de fiscalização, tal fixação constitui acto seu que deve ser fundamentado nos termos legais; 2ª Também nestes casos, a decisão administrativa não pode deixar de revelar expressa, formal, clara, congruente e suficientemente todo o processo de conhecimento ou de prognose dos factos que a administração entende subsumirem os pressupostos que estão descritos nos diversos preceitos para que a matéria tributável seja determinada indirectamente, referindo particularmente a “matéria-fáctica” que suporta o seu juízo, os seus critérios de aferição ou de valoração inferativa, os meios probatórios que possibilitaram o seu conhecimento fáctico, e, finalmente, também a valoração jurídica que, em coroação de todo esse acervo racional, levou a administração fiscal a decidir nos termos em que concretamente o fez 3ª Estando em causa um direito fundamental dos administrados e uma garantia jusfundamental do adequado cumprimento do direito a uma tutela jurisdicional efectiva, essa fundamentação não é susceptível de ser presumida em face do teor da conclusão/decisão do procedimento tomada pela Administração nem, tão-pouco, pode admitir-se que a mesma seja tout court uma fundamentação implícita; 4ª Admite-se que o discurso fundamentador possa ser efectuado “por remissão”, podendo consistir numa mera “declaração de concordância com os fundamentos de anteriores parecer, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária”; 5ª No entanto, essa declaração de concordância tem de ser clara e inequívoca, individualizando, em concreto, qual o discurso fundamentador ao qual se adere, como foi, de resto consagrado no Acórdão do STA de 2 de Maio de 1996 (R. 16237), onde se concluiu estar “inquinada de vício de forma por insuficiência de fundamentação que implica anulação, a referida deliberação da comissão distrital de revisão que para justificar o mencionado indeferimento se limita a louvar-se em todos os elementos existentes no processo de liquidação”.
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Seja como for, não só a exigência de uma fundamentação expressa posterga uma “apropriação implícita dos fundamentos anteriores”, como também será inapropriado aferir o cumprimento daquele dever através de uma interpretação subjectivista das declarações do autor do acto, feita exclusivamente através do conteúdo da decisão administrativa.
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Tem total acerto a jurisprudência dos nossos tribunais superiores que exigem que a acta deva ser sempre fundamentada ainda que por remissão expressa para o relatório de fiscalização.
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Ora, no presente caso concreto, relativamente aos valores respeitantes ao sector da peixaria, a acta da comissão de revisão apenas decide: “manutenção dos valores respeitantes ao sector da peixaria” 9ª Ao considerar que a manutenção, pela Comissão, de valores anteriormente fixados, implica tout court, uma fundamentação por remissão para o relatório inspectivo, o Tribunal recorrido errou tendo como válida uma fundamentação por remissão sem que tenha existido remissão expressa para qualquer argumentação anterior, constante — ou não — do relatório da inspecção.
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De facto, é bem patente, no presente caso concreto, que não houve qualquer remissão explícita para fundamentos anteriores, maxime para o relatório da inspecção.
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Porquanto: a) Não há qualquer explicação autónoma das razões de facto e de direito que justifiquem a decisão de “manutenção dos valores respeitantes ao sector da peixaria”; b) Nem há qualquer remissão formal e expressa para os fundamentos do relatório de inspecção e a sua aceitação em sede de decisão de Comissão, c) Nem tão-pouco há, sequer, em toda a acta, a mínima referência a tal relatório; d) Nem se diz, tão pouco, em lugar algum, “manutenção dos valores respeitantes ao sector da peixaria, nos termos apurados no relatório de inspecção”.
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Ora, o juízo recorrido, mais não faz do que “presumir” a existência de uma fundamentação que considera cumprida “por remissão”, a qual apenas poderá, pelas razões já motivadas, ter-se por implícita.
13 ª. Todavia, ainda que a fundamentação possa efectuar-se por remissão — a recorrente não o discute —, o facto é que essa remissão apenas existirá quando a administração expressamente assuma os fundamentos de um discurso pretérito para o qual, também expressamente, remeta, sustentando concordância com eles.
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Por esse motivo, não poderá admitir-se como válida uma fundamentação implícita, nem poderá admitir-se, a fortiori, que a fundamentação possa resultar de uma remissão também meramente implícita.
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Destarte, constituindo a deliberação da Comissão de Revisão um acto tributário de fixação da matéria tributável, ainda que esta se limite a manter um valor encontrado em acção de fiscalização, tal fixação constitui acto seu que deve ser fundamentado nos...
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