Acórdão nº 773/08.2TBLNH.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelLUÍS ESPRÍTO SANTO
Data da Resolução05 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa ( 7ª Secção ).

I – RELATÓRIO.

A Direcção-Geral de Reinserção Social (Autoridade Central Nacional), deu conhecimento nos autos que o Tribunal de Grenoble, em França, proferiu, em 23 de Novembro de 2010, decisão de não regresso do menor F. a Portugal, na sequência de um pedido de regresso intentado pela respectiva progenitora por alegada deslocação e retenção ilícita perpetuada pelo progenitor.

Procedeu-se à notificação das partes, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 11.º, n.ºs 6 a 8 do Regulamento (CE) n.º 2201/2003, do Conselho de 27 de Novembro de 2003, tendo as partes apresentado as respectivas alegações.

Com o intuito de se apurar se o eventual regresso do menor poderia implicar o risco estatuído na alínea b) do artigo 13.º da Convenção de Haia de 1980, foi oficiada a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de ..., a fim de informar sobre se existe/existiu processo de promoção e protecção a favor daquele e, na afirmativa, qual a medida aplicada.

Através da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens da ... houve a informação que, de facto, ali correu termos a favor do menor F o respectivo processo de promoção e protecção, tendo o mesmo sido encaminhado para os Serviços do Ministério Público junto deste Tribunal.

A fls. 423/425 mostra-se junta a certidão extraída dos autos de processo administrativo com o número .../10.8TALNH que correu termos nestes Serviços do Ministério Público, no sentido de se averiguar da existência de eventual situação de perigo em que o menor F. se encontrasse, tendo o mesmo merecido despacho de arquivamento em 11 de Março de 2011.

O Ministério Público emitiu o correspondente parecer, no sentido de ser considerada ilícita a deslocação do menor para França, devendo ordenar-se o seu regresso.

Foi proferida decisão determinando o regresso imediato do menor a Portugal, onde deverá ser entregue à progenitora, devendo o requerido: a) Proceder à entrega do menor à mãe em Portugal, no prazo de 10 dias a contar da notificação pessoal que para o efeito lhe será efectuada, com a cominação de, não o fazendo, incorrer na prática de um crime de desobediência; e b) No prazo de 30 dias contados da mesma notificação, fazer chegar ao processo documento assinado pela progenitora comprovativo da entrega do menor.

( cfr. fls. 430 a 434 ).

Apresentou o requerido recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação ( cfr. fls. 464 ).

Juntas as competentes alegações, a fls. 442 a 451, formulou o requerido apelante, as seguintes conclusões : 1ª – A sentença em causa é nula, dado que a mesma não observou nem se ateve na consideração do princípio basilar de toda a sistemática normativa e processual que impõe a produção de prova ainda que mínima, tanto mais considerando as implicações de tal decisão na vida familiar e escolar e de saúde do menor.

  1. – A sentença foi proferida sem que fosse produzida qualquer prova, para se apurar em que situação e circunstâncias a mãe prestou a sua autorização para o menor se deslocar para a residência do pai em França no ano de 2008, bem como as condições em que se encontrava o menor aquando da sua deslocação para França no ano de 2010, contrapostas às condições económico-sociais de cada um dos progenitores e o eventual perigo inerente à entrega do menor à progenitora.

  2. – Ouvindo as testemunhas residentes em Portugal, o que se ditava ao Tribunal, apesar de se tratar de um processo de entrega judicial de menor que tem a natureza de jurisdição voluntária, sob pena de decidir, como decidiu, em detrimento dos verdadeiros e ponderosos interesses do menor.

  3. – Este ao deixar a escola francesa, a meio do ano lectivo, não terá aproveitamento escolar, nem em França, nem em Portugal, no eventual regresso a este país.

  4. – Certo é que o Tribunal a quo também não apontou as razões pelas quais não produziu a prova requerida pelo requerido.

  5. – Todavia, perante a vasta documentação constante dos autos, mesmo sem perda de tempo com a inquirição, outros factos e de máxima importância com interesse para a boa decisão da causa deveriam ter sido igualmente dados como provados, nomeadamente e em especial : 7ª – Em 28 de Agosto de 2008, a progenitora autorizou “ …o menor a deslocar-se com o pai…para França, saindo de Portugal a 30 de Agosto de 2008 “, por tempo indeterminado.

  6. – Em 17 de Novembro de 2008, vieram os progenitores do menor requerer a homologação de uma alteração da regulação das responsabilidades parentais, com base na referida declaração de autorização.

  7. – Por decisão datada de 7 de Setembro de 2009, já transitada em julgado, foi determinado o arquivamento dos autos, por razões exclusivamente processuais ( artigo 182º, nº 5, da OTM ).

  8. – O menor foi viver para casa do pai em França, no final de Agosto de 2008, tendo frequentado o ensino escolar no ano de 2008/2009 e sido assistido medicamente a nível dos seus graves problemas de saúde.

  9. – Em 31 de Julho de 2009, o requerido autorizou o menor a passar férias com a mãe, todavia esta não deixou o filho regressar a França com o pai, depois das férias não por sua vontade, mas por imposição dos avós do menor, segundo a progenitora declara publicamente.

  10. – O requerido diligenciou junto da CPCJ da ... e do Tribunal a quo em Setembro de 2010, para que o menor pudesse regressar a França.

  11. – E, na falta de decisão das referidas entidades e apercebendo-se que a progenitora, no mínimo, negligenciava os cuidados básicos do menor e dado que a declaração desta se mantinha em vigor, regressou com o seu filho a França.

  12. – A situação de perigo em que o menor se encontrava, aquando da sua deslocação para França em Setembro de 2010, originou o processo administrativo com o nº .../10.8TALNH, o qual veio a merecer despacho de arquivamento em 11 de Março de 2011, devido ao menor já não se encontrar à data em Portugal.

  13. – O menor em França reúne um conjunto de condições a nível familiar, habitacional, escolar e de saúde, que lhe proporcionam um crescimento harmonioso e integral, contrapostas às da progenitora em Portugal.

  14. – O menor, ouvido no processo que ditou o não regresso do mesmo a Portugal, manifestou claramente vontade de continuar com o pai, uma vez que já se encontra totalmente integrado no ambiente familiar, social e escolar da sua residência em França.

  15. – O requerido está convicto do perigo grave na deslocação do menor para Portugal ao nível da sua saúde física e psicológica, na medida em que regressará aos cuidados dos avós, uma vez que a progenitora não quer, nem tem condições para tanto, segundo declara publicamente.

  16. – O progenitor nunca recusou qualquer contacto do menor com a mãe, bem pelo contrário sempre diligenciou a sua efectivação por todos os meios desejando que tal situação ainda mais se reforce e fortaleça.

  17. – Assim, nos termos dos artsº 13º, alíneas a) e b) e 20º da Convenção, resultam comprovados os factos necessários à determinação da rejeição do pedido de entrega imediata do menor à progenitora, por inexistência de qualquer fundamento e muito menos facto que o legitime.

  18. – Sendo que a sentença ora recorrida viola o intuito normativo da OTM, da Convenção de Haia, de 25 de Outubro de 1980, em especial o seu artigo 13º e o Regulamento 2201/2003, do Conselho de 27 de Novembro de 2003, bem como os mais elementares princípios constitucionais.

Contra-alegou o Ministério Público, pugnando pela improcedência do recurso.

II – FACTOS PROVADOS.

Foi consignado como provado em 1ª instância : 1. O menor F. nasceu em 26 de Junho de 2004 e é filho de A. e de P..

  1. O menor é natural da freguesia de …, concelho de … e tem nacionalidade portuguesa.

  2. Os progenitores foram casados entre si, tendo sido decretado o divórcio por mútuo consentimento no dia 10 de Novembro de 2005, na Conservatória do Registo Civil de ….

  3. Pelos progenitores foi acordado, entre o mais, que o menor ficaria entregue à guarda e cuidados da mãe.

  4. Em 17 de Novembro de 2008, vieram os progenitores do menor requerer a homologação de uma alteração da regulação das responsabilidades parentais.

  5. Por decisão datada de 7 de Setembro de 2009, já transitada em julgado, foi determinado o arquivamento dos autos, por manifesta falta de fundamento legal, nos termos do disposto no artigo 182.º, n.º 5 da O.T.M.

  6. O menor reside em França, com o pai, desde finais de Agosto de 2008.

  7. Em 23 de Novembro de 2010, pelo Tribunal de …, França, foi proferida decisão de não regresso do menor, F., a Portugal, na sequência de um pedido de regresso intentado pela respectiva progenitora por alegada deslocação e retenção ilícita perpetuada pelo progenitor.

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS.

São as seguintes as questões jurídicas que importa dilucidar : 1 – Alegada nulidade da sentença.

2 – Correcção e esclarecimento quanto aos factos provados nestes autos.

3 – Enquadramento geral. Âmbito da previsão do artº 11º, nº 8, do Regulamento ( CE ) nº 2201/2003, de 27 de Novembro de 2003.

4 - Do ordenado regresso do menor a Portugal.

Passemos à sua análise : 1 – Alegada nulidade da sentença.

Referiu o progenitor apelante : A sentença em causa é nula, dado que a mesma não observou nem se ateve na consideração do princípio basilar de toda a sistemática normativa e processual que impõe a produção de prova ainda que mínima, tanto mais considerando as implicações de tal decisão na vida familiar e escolar e de saúde do menor.

A sentença foi proferida sem que fosse produzida qualquer prova, para se apurar em que situação e circunstâncias a mãe prestou a sua autorização para o...

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