Acórdão nº 08729/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelBENJAMIM BARBOSA
Data da Resolução05 de Julho de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: 1 - Relatório a) - As partes e o objecto do recurso A...A/S com sede em ..., Dinamarca, inconformada com a sentença do TAC de Lisboa que lhe indeferiu liminarmente a providência cautelar tendente à suspensão do acto administrativo que fixou os preços de venda ao público (PVP) dos medicamentos genéricos Escitalopram B...(5 mg), Escitalopram B...(10 mg), Escitalopram B...(15 mg) e Escitalopram B...(20 mg), que intentou contra o Ministério da Economia e do Emprego e contra a contra-interessada Laboratórios B...– Produtos Farmacêuticos, Lda.

, veio interpor recurso jurisdicional em cujas alegações concluiu como segue: A. Uma vez que o presente recurso se reporta a uma decisão de não decretamento das medidas cautelares requeridas, deverá ter efeito suspensivo, nos termos do artigo 143.° n.° 1 do CPTA.

B. Tendo em consideração que as Oposições apresentadas pelo Requerido MEE (através da DGAE) e pela Contra-Interessada não foram notificadas à Recorrente, tendo tal omissão influenciado o exame ou a decisão da causa, nomeadamente, no que diz respeito à aplicação da Lei n. 62/2011, de acordo com o n.° 1 do art. 201.° do CPC, aplicável ex vi art. 1.° do CPTA, a decisão recorrida deve ser declarada nula e revogada.

C. A sentença recorrida é igualmente nula de acordo com o disposto no art. 659.°, alínea b) e d) do n.° 1 do art. 668.° do CPC, uma vez que é omissa no que respeita à matéria de facto dada como provada.

D. Atendendo a que o Tribunal a quo foi omisso quanto aos argumentos de inconstitucionalidade da Lei n.° 62/2011, suscitados pela Recorrente aquando do requerimento inicial, nos termos da alínea d), n.° 1, do art. 668.°, a sentença deve necessariamente ser considerada nula e, portanto, revogada.

E. Não obstante a nulidade da decisão recorrida no que concerne à omissão de indicação de factos dados como provados, crê a Recorrente que tanto os factos constantes dos artigos 20.° a 25.°, 31.°, 35.°, 40.°, 42.°, 49.°, 50.° a 55.°, bem como os factos enunciados nos artigos 26.° a 29.°, 32.° a 34.°, 36.°, 43.° a 48.°, 50.°, 88.° a 90.°, 93.° e 94.° deveriam ter sido considerados como provados.

F. Sendo declarada nula a sentença, o tribunal de recurso pode decidir o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito, nos termos do disposto no n.° 1 do art. 149.° do CPTA.

G. Caso não seja este o entendimento deste Tribunal ad quem, i.e., se este Alto Tribunal não considerar como provado que o Escitalopram era ao tempo do pedido da patente PT 90 845 (14 de Junho de 1989) e da prioridade invocada nessa patente (14 de Junho de 1988), e que será necessário produzir prova adicional, então deverá ordenar a produção de prova testemunhal (em conjugação com a documental já produzida) nesta sede, nos termos do disposto no artigo 149.° n° 2 do CPTA ou, caso não se entenda ser aplicável esta disposição, mediante a anulação oficiosa da decisão e baixa do processo à 1.a Instância, para ampliação da decisão quanto aos factos, e produção de prova testemunhal (em conjugação com a documental já produzida), nos termos do disposto no artigo 712.° n.° 4 do CPC, aplicável ex vi o disposto no artigo 140.° do CPTA.

H. A norma constante do artigo 8.° da Lei n.° 62/2011 não tem, qualquer conteúdo útil no contexto da acção principal, uma vez que esta não pressupõe que as aprovações de PVP dos autos sejam “contrárias” aos direitos de propriedade industrial da Requerente, ora Recorrente, baseando-se exclusivamente na circunstância de que as mesmas viabilizam juridicamente a prática de actividade que, ela sim, é contrária a tais direitos.

I. As disposições constantes do artigo 8.°, n.° 1, 2, 3 e 4 da Lei n.° 62/2011, são insusceptíveis de obstarem ao provimento do presente recurso e procedência da acção principal, ou seja, à declaração de invalidade ou invalidação dos actos a impugnar ou à declaração da sua ineficácia, até ao termo dos direitos de propriedade industrial da Recorrente e, consequentemente também não poderão obstar à procedência do presente recurso e processo cautelar.

J. Se se entendessem as normas do artigo 8.°, n.° 1, 2, 3 e 4 da Lei n.° 62/2011, como contendo uma proibição absoluta de que o MEE/DGAE tomasse conhecimento, no quadro de procedimento de aprovação de PVP, da existência de violação de uma Patente por parte do medicamento objecto desse procedimento, ou o obrigassem a deferir requerimento de aprovação de PVP para um tal medicamento, tais disposições seriam materialmente inconstitucionais por violação, nomeadamente, dos artigos 17.°, 18.°, 62.° n.° 1 e 266.° da Constituição da República Portuguesa.

K. Tendo, o Tribunal a quo entendido que as normas constantes do artigo 8.°, n.° 1, 2, 3 e 4 da Lei n.° 62/2011, contêm uma proibição absoluta de que o MEE/DGAE tome conhecimento, no quadro de procedimento de aprovação de PVP, da existência deviolação de patente por parte do medicamento objecto desse procedimento, ou os obriguem a deferir os respectivos requerimentos de aprovação de PVPS para um tal medicamento, tais disposições seriam materialmente inconstitucionais por violação, nomeadamente, dos artigos 17.0, 18.°, 62.° n.° 1 e 266.° da Constituição da República Portuguesa, devendo, consequentemente, o Tribunal ad quem recusar a sua aplicação com fundamento na sua inconstitucionalidade.

L. Se se entendesse que as referidas normas eram aplicáveis no caso vertente por via do artigo 9.0, n.° 1 da Lei n.° 62/2011, a interpretação e aplicação deste artigo introduziria uma restrição retroactiva – e, portanto, inconstitucional por violação do art. 18.°, n.° 3 da Constituição — de um direito fundamental.

M. Por último, em concreto, uma vez que o Tribunal a quo aplicou as referidas normas no caso vertente com base no artigo 9.°, n.° 1 da Lei n.° 62/2011, tal interpretação (e aplicação) é inconstitucional por introduzir uma restrição retroactiva de um direito fundamental, violando-se o art. 18.°, n.° 3 da Constituição, devendo, consequentemente, o Tribunal ad quem recusar a sua aplicação com fundamento na sua inconstitucionalidade.

N. O Tribunal a quo considerou que a requerida providência cautelar deveria ser declarada improcedente ao abrigo das alíneas b) e c) do artigo 120, n.° 2 do CPTA. No entanto, a providência cautelar foi requerida nos termos do disposto nas alíneas a) do art. 120, n.° 1 e, subsidiariamente, na alínea b) do referido artigo, visto tratar-se de uma providência cautelar conservatória, pelo que a referência à alínea c) não pode ser considerada.

O. Assim, se o Tribunal a quo tivesse correctamente identificado a questão legal em discussão, teria concluído que o requisito do fumus bonus iuris exigido no artigo 120.° n.° 1 a) do CPTA se verifica no presente caso, ao não fazê-lo incorreu em erro de julgamento.

P. Uma vez que o presente processo cautelar tem um pedido de natureza conservatória, deve considerar-se o requisito do fumus non malus iuris previsto no artigo 120.° n.° 1 b) do CPTA suficiente e que se encontra verificado no presente caso, facto que foi ignorado pelo Tribunal a quo, violando, pois a referida norma e incorrendo também em erro de julgamento.

Q. O presente processo cautelar poderia e deveria, pois, ter sido decretado, visto que se não demonstrou qualquer facto ou se alegou qualquer razão de direito que tornasse manifesta a falta de fundamento da acção principal ou que determinasse que a mesma não pudesse ser apreciada no seu mérito.

R. A questão jurídica que se coloca nos presentes autos é a de saber se um acto administrativo que concede uma autorização de comercialização de um medicamento (um PVP) que irá violar uma patente válida e em vigor — como se deve considerar provado — é inválido porque ilegal e, por isso, deve ser anulado pelo tribunal, se for concedido pelo MEE/DGAE.

S. O princípio da imparcialidade da Administração, na sua dimensão objectiva, significa que o MEE/DGAE deverá ponderar todas as circunstâncias relevantes para a decisão, nomeadamente a existência de direitos,de propriedade industrial.

T. Uma vez que o acto que concede um PVP de um medicamento é um acto administrativo cujo objecto é o de permitir a actividade de comercialização desse medicamento no território nacional, uma actividade que de outra maneira seria proibida, e, uma vez que resulta também um imposição sobre o titular do PVP de um dever de realizar precisamente essa actividade, é ilegal, na medida em que viola o princípio da legalidade, i.e., o chamado bloco de legalidade.

U. O princípio da legalidade contém um comando de obediência à Lei e ao Direito, ou seja, uma total conformidade não só com as leis e os princípios jurídicos que disciplinam especificamente uma certa conduta da Administração, mas também aqueles que constituem todo o ordenamento jurídico.

V. A ausência dessa conformidade constitui infracção ao ordenamento jurídico e tem como consequência a invalidade da actividade administrativa, ao não considerar esta questão, uma vez mais, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento.

W. Os PVPs suspendendos devem ser anulados ou declarados nulos ao abrigo dos artigos 135.° e 133.°, n.° 2 c) e d) do CPA, respectivamente, uma vez que levantam barreiras administrativas referentes à exploração pela Contra-interessada do processo protegido pelo CCP — que estende o período de protecção da Patente 90 845 — de que é titular, cuja consequência será permitir a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental (de natureza análoga a direitos, liberdades e garantias — o direito de propriedade industrial da Recorrente —, o qual beneficia do regime constante do art. 17.° da Constituição) e, em consequência, violando os arts. 18.°, 62.° e 266.° da Constituição, sendo o seu único efeito útil a viabilização de uma...

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